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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2014

(6514) - SUBSÍDIOS PARA A REGIONALIZAÇÃO - 6B


2. O Modelo de Governador Provincial ou do Municipalismo versus o Modelo de Regiões Autónomas:

A   Regionalização e o fim da tutela sobre as colectividades locais eleitas

In : A Regionalização: O Adiamento de uma exigência e de uma urgência

Apesar do Debate sobre a Regionalização ter-se imposto por si só, existe uma grande tentativa da suabanalização e do esvaziamento do seu conteúdo, desvalorizando-se o problema do Centralismo e do Regionalismo em Cabo Verde, o último muitas vezes denegrido, por associado a bairrismo ou outros ‘ismos’ (usados como arma de arremesso para abafar qualquer tentativa de debate ou de denúncia de problemas. De resto debates de ideias em Cabo Verde resumem-se a acusações). A pobreza desta argumentação está na mesma proporção da sua fraqueza.

Na realidade, o poder e os partidos têm lançado intencionalmente um caos conceitual sobre a problemática da Regionalização. O objctivo é apresentar a Regionalização como um processo puramente administrativo, despido da sua componente política, uma Regionalização organizada a partir do centro do poder, para manter a periferia sob controlo político e económico, uma Regionalização meio carne meio peixe, muito do interesse daqueles que querem manter o sistema centralista intacto e afugentar qualquer ameaça à situação de concentração dos poderes. Na realidade a Descentralização necessária do aparelho de estado tem sido intencionalmente confundida com a Desconcentração, mas são dois conceitos distintos. Enquanto que a Descentralização é uma reforma que consiste em transferir competências e recursos do Estado central às colectividades locais, correspondendo a um processo de reforço da democracia local, com os seus próprios órgãos e o seu leque de atribuições e competências, a Desconcentração consiste simplesmente em melhorar a eficácia da máquina do Estado delegando poderes a representantes do estado junto do poder local, através, por exemplo, da figura do governador ou de delegados do governo ou das estruturas governamentais, sem tocar no essencial do conceito do centralismo do poder. Com o repúdio da ideia da nomeação de um Governador dependente do governo, introduz-se o Municipalismo, ou seja, do reforço do actual sistema autárquico ou na criação de autarquias regionais. Na realidade, uma ‘reforma’ que consiste na atribuição de mais poderes (?) aos presidentes das câmaras, não corresponde à Regionalização pelo que é um abuso de linguagem. De resto, na maior parte dos países regionalizados (França, Espanha, Suíça, etc), existe Municipalismo e Regionalização, duas realidades coexistindo independentemente uma da outra. Com efeito, enquanto as Regiões são espaços territoriais e políticos contendo inclusivamente várias câmaras, as esferas de influência e de competências do Municipalismo referem-se unicamente ao estrito espaço delimitado e reduzido de uma cidade, em geral sem funções políticas específicas. Para mais, nos países regionalizados existem políticas regionais e políticas municipais bem distintas. Pergunta-se o que é que ganhará uma câmara ou uma ilha, atribuindo mais algum poder ao seu presidente de câmara? Mais especificamente é o que uma ilha como S. Vicente ganharia economicamente e socialmente com a mera atribuição de mais poderes ao actual Presidente da Câmara, numa situação de disputa e guerra permanente entre o poder municipal e central, se a Ilha continua refém das decisões do poder Central ou dos partidos e limitada politicamente e economicamente? Uma ‘reforma’ deste tipo seria pura cosmética não resultando em nenhum ganho, na medida em que os poderes de decisão permaneceriam nos centros de decisão e o centralismo não seria tocado. O reforço do Muncipalismo pode, a meu ver, ser inclusivamente muito perigoso em Cabo Verde. Se no caso de S. Vicente a sua aplicação poderia ser absurdamente pacífica, pois a autarquia por enquanto confunde-se com a Ilha, aplicada a Santo Antão, Santiago ou Fogo, ilhas constituídas por vários municípios, poderia engendrar uma miríade de poderes paralelos, de caciques locais dispersos numa mesma ilha, ou seja o caos político, ao gosto dos centralistas que tirariam dividendos das querelas intestinas e das guerras fratricidas. O reforço do Municipalismo saldar-se-ia assim no reforço das tensões políticas internas nas ilhas, no dividir para imperar e na alienação da democracia. É precisamente o oposto que se pretende com a Regionalização, propõe-se caminhar rumo a políticas de maior integração e sinergia nas ilhas e entre as diferentes autarquias, o todo integrado numa perspectiva de desenvolvimento insular ou regional. De resto sabendo que Regionalização deve ser um conceito dinâmico, o seu próprio desenvolvimento poderá tender no futuro para a criação de Macro-Regiões agrupando regiões afins tal como pode ser o caso da Região Norte de Cabo Verde. De resto existe uma corrente regionalista que defendem a tese que a verdadeira Regionalização de Cabo Verde corresponderia à criação de Macro-Regiões e não da Ilha-Região. Considero que as duas ideias não são incompatíveis e ambas têm o seu valor e mérito, ou seja é possível num médio ou longo prazo encontrar mecanismos de integração política das Regiões afins, pois como disse anteriormente, o modelo de Regionalização para Cabo Verde não pode ser um processo definitivo, formatado, dogmático mas sim algo sujeito a uma progressiva evolução e em constante avaliação crítica e aperfeiçoamento.
Assim considero que a atribuição de mais poderes aos Presidentes de Câmara no presente contexto político centralizado representará um presente envenenado às ilhas periféricas (e aos seus dirigentes) redundando num prejuízo para as suas populações, pelo que esta opção deve ser rejeitada. As futuras Regiões não podem ficar reféns do Poder Central nem dos jogos políticos internos, devem estar acima deles, para que os seus governos desempenhem as suas tarefas com total independência e responsabilidade. Para além disso, os cargos de responsabilidade regionais devem ser dignificados, não podem ser em “part-time” nem mal pagos.
Acredito na irreversibilidade de um processo de Regionalização que permita reconfigurar profundamente o país e tirar as ilhas periféricas de Cabo Verde do estado de letargia. A regionalização deve corresponder a um maior e melhor poder local e aproximar o poder das populações.
Afigura-se assim inevitável a reorganização administrativa e política do país. A criação de Regiões com autonomia Política e Administrativa terá implicações no coração do próprio sistema e do regime, que terá que ser repensado, no sentido do seu redimensionamento e reequilíbrio (talvez esteja aí a razão das resistências à Regionalização) para evitar redundâncias. A criação de parlamentos regionais e de governos regionais implicará uma redefinição, ou mesmo reforma do parlamento nacional, por um lado, e do papel dos municípios, por outro lado, exigindo forçosamente no fim uma reforma constitucional. Para que se possa criar um poder regional dotado de órgãos e parlamentos regionais com custo quase zero para o país, afigura-se necessário o emagrecimento da Assembleia Nacional e das Assembleias Municipais, com redução do número de deputados nacionais e municipais. Por outro lado, torna-se indispensável o reequilibrar a balança dos poderes no pais e entre as ilhas através da criação de um Senado ou de uma Câmara Alta, onde cada Região terá um certo número de assentos.
Resumindo a Centralização em Cabo Verde constitui uma forma de governo, uma estrutura de organização política anacrónica, paralisante, ultrapassada, que não responde mais às exigências da vida moderna e da competitividade entre as nações evoluídas pelo que deve ser abolida.  O Estado Central não pode continuar a exercer tutela sobre as colectividades eleitas. A Regionalização é pois uma exigência e uma urgência para Cabo Verde.

ANEXO: Esboço de uma proposta de Plataforma para Regionalização

11 Ideias para a Implementação da Regionalização

 -Medidas a Curto Prazo

1)Abertura imediata sem pré-condições do debate alargado à sociedade civil sobre Regionalização, incluindo a Reforma do Estado, a Descentralização e a Desconcentração do país;
2) Reconhecimento de que o modelo de Regionalização para Cabo Verde não pode ser um processo definitivamente formatado, dogmático, mecânico, mas sim algo sujeito a uma progressiva evolução e constante avaliação crítica, sujeito a  aperfeiçoamento ao longo do tempo;
3)Reconhecimento do Direito do povo cabo-verdiano à auto-governação local com a instituição de parlamentos e de governos locais ou regionais;
4) Acordo de Fim do Centralismo e transição para a Descentralização, mercê da transferência de soberania, competências políticas, e recursos (humanos económicos e financeiros) do Estado Central para as para as comunidades regionais locais;
5) Acordo de Desconcentração para melhorar a eficácia da máquina do Estado a nível local;
6) Acordo de Descentralização com um Calendário ou Coteiro onde constam medidas concretas (quantificadas e quantificáveis) para combater o Centralismo de modo a estancar a desertificação humana das ilhas periféricas, a fuga de cérebros e ao empobrecimento das ilhas;
7)Definição do Calendário e do Roteiro para a Implementação da Regionalização
8) Instauração no curto prazo de um Parlamento e Governo Regional Provisórios e em regime Experimental na Ilha de S. Vicente, com amplos poderes políticos e executivos até à  oficialização da Regionalização, no sentido da urgente recuperação económica e política da ilha;

 -Medidas a Médio Prazo

9) Reorganização Administrativa e Política do país: Reforma do Municipalismo e do funcionamento do Parlamento Nacional no sentido de uma Regionalização a custo zero;
10)Instituição do Senado ou Câmara Alta com um representante em cada Ilha para o re-equilíbrio político do país;
11) Reforma Constitucional de modo a integrar perenemente plenamente as Reformas acordadas na Constituição.
 
José Fortes Lopes

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