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domingo, 23 de fevereiro de 2014

(6564) - REGIONALIZAR - RESPOSTA A JMN...[1]


QUANDO O DEBATE REGIONALISMO E REGIONALIZAÇÃO MARCA A AGENDA POLÍTICA
A- Tacticismos Políticos e os Desafios da Regionalização.

O Senhor Primeiro Ministro José Maria Neves (JMN) fez recentemente um pronunciamento sobre a Regionalização no Facebook (Regionalismo, Regionalização e Taticismos Políticos) após um longo e ensurdecedor silêncio sobre uma matéria de extrema importância para o futuro de Cabo Verde. Tirando muitos aspectos de pura retórica política da sua comunicação, é de saudar este facto, que poderia ser importante para o debate se tivesse apresentado ideias novas e mais próximas da solução.
Logo à partida, convém esclarecer uma ideia errada desenvolvida que pretende relacionar a Regionalização como uma iniciativa da oposição partidária, ou que vem sendo defendida por ela. A Regionalização nasceu da sociedade civil associada à diáspora (que tem dado sim um apoio estóico, determinado e destemido à causa) e o combate que dura 2 anos tem sido integralmente assumido por este movimento de cidadania. Inclusivamente, fazem parte deste movimento pessoas com simpatia ou filiação em todos os partidos. Embora até ao presente momento não se conheça bem os contornos e os pormenores exactos dos projectos dos partidos da oposição (MPD e a UCID), certo é que reagiram formalmente mais cedo do que o PAICV aos apelos dos regionalistas. O posicionamento tardio deste partido prende-se obviamente com questões de ordem ideológica, uma resistência a um projecto que vai ao encontro da sua matriz ideológica leninista, embora muitos filiados deste partido sejam favoráveis à Regionalização. Em relação ao MPD uma importante entrevista do seu líder Ulisses Silva no Jornal de São Nicolau veio abrir novas perspectivas, ao afirmar por exemplo que ‘Para a democracia ser forte e de qualidade, a sociedade civil tem de ser autónoma e a cidadania ativa fazer caminho’ ou que ‘o modelo centralista é um empecilho ao desenvolvimento de São Nicolau’ e que o seu partido já se definiu favorável à Regionalização, tendo inclusivamente definido um modelo de Regionalização, que será o governo da ilha. Todavia, o mesmo deixa claro que a única competência da Região é Deliberativa e não Legislativa (um modelo sui generis, único no mundo), não perspectivando assim hipótese alguma de soberania partilhada entre o Estado Central e as Regiões, quando sabemos que a instituição de um Governo Regional implicaria a atribuição de poderes e competências necessárias para legislação de âmbito local/regional (é por esta precisa razão que JMN e uma la conservadora do PAICV se opõem à verdadeira Regionalização), sem o qual poderá haver bloqueios no funcionamento da própria Região e mesmo conflitos com o Poder Central. Embora o MPD se afaste progressivamente das posições conservadoras daquele partido, teme-se assim que estejamos ainda próximos da Regionalização Administrativa paicvista, mercê do peso dos centralistas no partido. Todavia JMN acusa o líder do MPD de ter um sobre a regionalização uma posição confusa e eleitoralista, respondendo a desígnios meramente tacticistas. Assim não se exclui futuros bloqueios no seio MPD à uma maior evolução da sua posição.
JMN, apesar de se ter declarado favorável à Regionalização, não alterou uma vírgula do seu posicionamento anterior. Manifestando a sua abertura ao diálogo, fecha a mesma, ao não querer discutir as Reformas necessárias, a saber Descentralização e Desconcentração. Não sendo favorável aos pressupostos da reforma, toda a argumentação por ele desenvolvida é contrária à própria ideia da Regionalização, matando assim à nascença a hipótese de um debate aberto sem pré-condições. Convinha reconhecer que o modelo de Regionalização para Cabo Verde não pode ser um processo definitivamente formatado, dogmático, mecânico, mas sim algo sujeito a uma progressiva evolução e constante avaliação crítica, sujeito a  aperfeiçoamento ao longo do tempo. Não reconhecendo assim o direito do povo cabo-verdiano à auto-governação local não responde ao apelo a um consenso para pôr termo ao Centralismo e para a transição democrática para a Descentralização e o reforço da Democracia Local, e tão pouco a necessidade da partilha e cooperação de soberania e competências políticas entre o Estado Central e as Comunidades Regionais Locais Eleitas. Ser contra um poder local forte é perpetuar a situação em que os poderes da Praia continuem desrespeitando o voto local, a exercer o seu ‘diktat’ sobre as comunidades eleitas, a dividir para reinar, perpetuando os joguinhos e esquemas de manipulação partidária, a compra de votos e de consciência, ou seja a política de baixa qualidade que tanto tem desprestigiado Cabo Verde. No essencial não responde às questões colocadas pelos regionalistas e chega até a justificar o centralismo ou mesmo a continuação desta política, apostando inclusivamente numa política que foi aplicada nos primórdios da Independência, há 40 anos, ou seja a nomeação de Delegados do Governo sob estreita tutela do governo. De qualquer maneira, fica-se curioso para conhecer as novas atribuições e poderes no quadro desta Regionalização Administrativa. Na hipótese da sua concretização, pergunta-se como é que os dois poderes (um eleito, o Autárquico) e o nomeado (o Delegado do governo) iriam coabitar-se politicamente numa ilha como S. Vicente. Ao apresentar de maneira definitiva o seu modelo de não Regionalização, JMN fecha assim as portas a qualquer debate aberto. O PAICV coloca-se mais uma vez na posição como um partido do bloqueio e situa-se assim mais uma vez na retranca de um movimento de transformações sociais e políticos de Cabo Verde.
 Mas se o PM é favorável à Regionalização Administrativa e o reforço do Municipalismo então porque é que matou a ideia no Colóquio de 2007 ou não aplicou estas ideias durante os seus dois mandatos? O seu governo teve e tem todos os poderes para nomear os Delegados do governo ou reforçar o poder dos municípios. Agora, ele não pode convencer as pessoas que procedendo assim esteja a fazer Regionalização. Mesmo assim defende a necessidade das reformas reclamadas pelos Regionalistas: ‘Num país de ilhas como Cabo Verde, a política de regionalização é indispensável como exigência de desenvolvimento………………….Não é possível avançar-se na regionalização através de um processo exclusivamente jurídico-administrativo, para responder a exclusivos interesses político-partidários ou de grupos... A regionalização deve, pois, inserir-se num quadro mais amplo de uma profunda reforma do Estado e da Administração Pública e num movimento gradual e progressivo de descentralização administrativa que está intimamente correlacionado com os processos de transferência de novas competências e correspondentes recursos  às autarquias locais....». Se isto não contradiz com a sua posição oficial, então não dá para entender, e é com muita pena que as reformas que aqui elenca não tenham sido concretizadas durante os seus dois mandatos. Mas não tenhamos dúvida de que uma verdadeira reforma do sistema cabo-verdiano exigirá revisão da Constituição para que esta conquista tão importante do povo cabo-verdiano não seja posta em causa por reviravoltas políticas. 
José Fortes Lopes

 

1 comentário:

  1. Todos esperamos que haja uma resposta concreta e convincente do governo de Cabo Verde sobre este assunto, abandonando o seu circunlóquio.

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