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terça-feira, 8 de abril de 2014

[6775] - SOBRE A MENSAGEM DE PARKER..

PEGAR O TOURO PELOS CORNOS...        07 Abril 2014
 
No artigo anterior disse que voltaria à crítica do turista australiano a S. Vicente como destino turístico. Cá estou depois dos desenvolvimentos que a matéria teve. Mas o que menos interessa é falarmos do australiano e da sua atitude. Reafirmo: independentemente das suas motivações, seria um desperdício e sinal de pouca inteligência emocional concentrar a atenção no mensageiro e não na mensagem... Insisto em como a crítica pode ser, se bem aproveitada, uma oportunidade de ouro de auto-superaçãO,

Pegar o touro pelos cornos
´MÁRIO MATOS
 
Há um consenso nacional, desde os anos 90, em como o turismo pode ser uma das alavancas para o desenvolvimento económico e social do país, adentro de um novo modelo baseado na melhoria da produtividade e da competitividade, que rompe com a reciclagem da APD (em queda e que já não satisfaz as ambições do país) e das remessas dos emigrantes.
Os indicadores da evolução do sector demonstram que há uma estratégia global acertada e que o mesmo pode cumprir esse tal papel de uma das alavancas de que Cabo Verde precisa para crescer e desenvolver-se. Não se pretende, julgo eu, cair, por outro lado, naquilo que economistas apelidam de “economia de monocultura”, conceito usado por analogia, tomado de empréstimo à realidade de muitas colónias do antigamente que se especializaram (ou foram forçadas a especializarem-se) no cultivo e exploração extensiva de um só produto agrícola, no quadro da distribuição de papéis nos impérios coloniais da época.
Aliás, a estratégia dos clusters está aí para comprovar que a opção é pela diversificação dos sectores sobre os quais se assenta o desenvolvimento. Mas, deixemos de lado esse aspecto - o dos riscos de uma economia fortemente dependente de um único sector - porque embora pertinente, não é o objecto deste despretensioso artigo...
A inovação, o agenciamento da singularidade, a criatividade e a qualidade, dimensões da competitividade, são exigências do sucesso pretendido, sendo o aumento da produtividade - desafio de fundo da economia nacional - também nesse sector um desiderato incontornável.
O segmento de mercado do turismo de cruzeiro está em franco crescimento entre nós. Os dados estatísticos recentemente divulgados revelam um aumento exponencial da procura nos anos mais recentes, em que os Portos de S. Vicente e da Praia se destacam no conjunto nacional, mas com forte empenho dos poderes públicos na modernização e infra-estruturação do complexo portuário do país, alargando e diversificando a oferta a todas as outras ilhas.
Mas, e é aqui que a observação crítica da nossa oferta é indispensável para o sucesso dessa estratégia, estamos a competir com destinos com décadas de experiência no turismo de cruzeiro, com vantagens comparativas mas sobretudo competitivas muito fortes.
Assim, não podemos proceder como amadores e com a displicência que frequentemente fazemos gala de ostentar quando se trata de lidar com estrangeiros, turistas, que nos visitam. Por isso, terminei o artigo anterior afirmando, em relação a S. Vicente, não obstante visíveis melhorias nos últimos tempos, que há défice de esforço local face aos investimentos em promoção e em infra-estruturas e noutros sectores conexos, no quadro das políticas públicas para o desenvolvimento do turismo e face, também, ao empenho dos operadores públicos e privados mais directamente envolvidos, a saber a ENPOR e os tour operators.
Se ficarmos apenas satisfeitos com esse crescimento exponencial da demanda, sabendo que ele não é de geração espontânea, e não cuidarmos das medidas para consolidar as conquistas e assegurar um crescendo de competitividade, damos cabo da “galinha dos ovos de ouro”...
É preciso que o modelo com base na concepção rentista e fixista do valor geoestratégico do complexo portuário cabo-verdiano, no cruzamento de rotas e de fluxos de pessoas e bens - como no-lo recorda o Historiador e Sociólogo António Correia e Silva -, não se reproduza nesse domínio do turismo e, em particular, no nicho de mercado do turismo de cruzeiro. Dito de outro modo, que não olhemos para o sucesso que é o aumento exponencial da procura como uma conquista perene assente em vantagens comparativas imutáveis.
Assim, defendemos aqui essa visão estratégica holística do turismo em geral, referida no artigo anterior e, no caso em apreço, do turismo de cruzeiro, exigindo do lado público uma capacidade institucional reforçada (não se confunda com multiplicação de burocracias), descentralizada e eminentemente competente. Salvo melhor opinião e fazendo jus à visão abrangente e integradora, o Núcleo Operacional para o Cluster do Mar deverá, no seu escopo, ter atribuições e competências para assumir esse papel institucional e construir com sentido de urgência as soluções para a melhoria da qualidade, inovação, criatividade, enfim, competitividade da nossa oferta.
Dito isto, é incontornável o papel do Poder Local, no processo. Há, aliás, respostas que só podem ser dadas com pertinência, celeridade e eficiência pelas autarquias. Há um mundo a desbravar nesse particular. Mas, para tal, há que reforçar as pontes de diálogo e cooperação complementar entre os poderes central e local, na perspectiva win-win e romper com a “tradição” do conflito como forma de relacionamento e afirmação...
A montante e a jusante, no sector privado, para além dos tours operators que laboram directamente nesse mercado, há uma miríade de oportunidades de negócios que quedam por explorar, gerando rendimentos e empregos e que contribuirão para a diminuição da actual situação do desemprego na ilha, sobretudo do emprego jovem. Quando se pensa que nem uma simples oferta de uma espreguiçadeira e de um guarda-sol estamos a assegurar nas praias da ilha, a nós mesmos e aos que nos visitam como turista, dá-nos para avaliar não só a nossa fragilidade mas, sobretudo, perceber as oportunidades de negócio por desbravar, alguns nem exigindo grandes capitais...
De igual modo, mister se torna que ultrapassemos duas pechas que marcam negativamente quer a Administração quer o próprio sector privado porque quiçá fazem parte do nosso substrato cultural: o espírito de “capela” que vem torpedeando a exigência de articulação e coordenação intersectorial com tudo o que estas representam em matéria de sinergias, ganhos de tempo e gestão criteriosa de recursos e o pensamento (a conduta) disjuntivo que não acolhe a possibilidade (frequentemente uma necessidade imperiosa) de simultânea ou alternadamente, conforme os casos, se competir e cooperar.
Por exemplo, a modernização e o desenvolvimento do complexo portuário nacional, enquanto vector estratégico à concretização das nossas ambições de construção de um país desenvolvido, passam pela competição e cooperação inter-portuária e não por uma luta inter-regional de soma zero.
Regressando a S. Vicente, o epicentro da questão despoletada, ao contrário do que diz Parker, a ilha, a cidade, têm imenso para dar! Mas essa é matéria para outra reflexão, que convoca todos os actores implicados, e que - também aqui insisto - exige que cada um não enjeite as suas responsabilidades e o seu papel.
in A SEMANA
 

1 comentário:

  1. Ultimamente o Màrio Jr. tem estado acutilante com os seus artigos. Pena não ter acordado hà mais tempo pois teria ganho bastante e S.Vicente também. Mas nunca é tarde para levantar o desafio e/ou associar-se aos outros filhos diligentes da Ilha do Porto Grande que batem para a preservação dos usus e costumes, e do Patromônio Regional que são ao fim e ao cabo, uns e outro, a riqueza da Nação Cabo Verde.
    Nunca é tarde e... quando "no ta juntà mom" as nossas força tornam-se "ambrosianas".
    Vivam os nossos irmãos ! Viva Soncente ! Viva Cabo Verde !!!

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