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quinta-feira, 8 de maio de 2014

[6878] -- CRIOULOS COM HISTÓRIA...

Cabo-verdianos ilustres: Viriato Gomes da Fonseca, o General de Coculi


Foi inventor, político, militar, com onze louvores e sete condecorações no curriculo, músico (exímio executante de harpa e guitarra), tendo recebido das mãos da rainha D. Amélia uma guitarra especial (familiares referem que foi um violino de ouro) e participado em tertúlias com o Infante D. Afonso e D. Carlos, que o estimavam e lhe franqueavam as portas do Paço.
Viriato da Fonseca era igualmente um hábil contabilista e chegou mesmo a ser indigitado para ministro das Finanças de Portugal. Álvaro de Castro, na épocaPresidente do Conselho, ofereceu-lhe o cargo de Governador Geral de Angola, mas Viriato da Fonseca recusou. Preferiu esperar pela vaga de Governador Geral de Cabo Verde - que nunca chegaria, devido às mudanças políticas que se sucederam.
Viriato Gomes da Fonseca nasceu em 1863, no lugar de Curral do Coculi, freguesia de Santo Crucifixo, na ilha de Santo Antão. Aos sete anos viajou para Lisboa, tendo concluido os seus estudos de Artilharia na Escola de Guerra. Em 1897, o jovem tenente regressa a Cabo Verde com o objectivo fixo de ajudar no desenvolvimento das ilhas.
Muito cedo revelou dotes de orador extraordinário com grande capacidade de comunicação e enorme carisma, gozando de uma memória prodigidiosa que lhe permitia produzir os seus discursos sem recurso à leitura.
Guerra na Guiné
Em 1907, foi nomeado comandante de uma bateria numa missão expedicionária à Guiné. Travavam-se, na altura, as chamadas 'guerras de pacificação' contra os povos indígenas em luta contra a presença portuguesa naquele território. Ao contrário do que era costume com os soldados oriundos de Santo Antão, enviados para as guerras na Guiné, Viriato da Fonseca resistiu ao paludismo e outras febres que dizimavam estes cabo-verdianos naquela região de África.
Promovido a major, e novamente em Lisboa, Viriato da Fonseca dedicou-se à balística e a fazer algumas alterações à régua de Chalat, acabando por inventar um Sintómetro de Perpendiculo, que a Inspecção de Artilharia de campanha não aprovou.
De regresso a Cabo Verde, desempenhou cargos de director de Obras Públicas e de Chefe de Agrimensura.
abastecimento de água à Vila da Ponta do Sol, o estudo das levadas e um levantamento topográfico do 
Concelho do Paul, são as obras mais salientes que realizou na Ilha de Santo Antão.
Na Ilha do Fogo fez um reconhecimento do Montado Real e a ilha Brava ficou devendo-lhe um estudo completo do Porto da Furna, que nunca se construiu. Há quem diga que foi autor também de um projecto para a construção do Porto Grande.
Foi ainda Comandante Militar da Ilha de São Vicente, Administrador do Concelho da Ilha de Santo Antão, de Dezembro de 1910 a Novembro de 1912 e durante o mesmo período, desempenhou, igualmente, o cargo de Presidente da Comissão Municipal da mesma ilha.
Político
Em 1919, o povo das ilhas, reconhecido pela sua competência nos trabalhos por ele realizados e ciente do seu grande patriotismo e amor à terra natal, confiou-lhe o encargo de representar a Província no Parlamento. E é assim que ingressa na política para ser deputado pelo Partido Republicano Português (PRP), de 1919 a 1922 e pelo Partido Republicano Constituinte, de 1922 a 1925.

Nestas funções tomaria parte em inúmeras comissões nomeadas pelo Parlamento, tais como a de Recrutamento, a de Colónias, a de Guerra, a Parlamentar de Inquérito aos Bairros Sociais e do Ministério da Guerra, nesta, primeiro como vogal e depois como presidente, e ainda da que foi encarregada de receber o Marechal Joffre, quando este cabo de guerra francês veio a Portugal representar o exército do seu país nos festejos levados a efeito em honra dos Soldados Desconhecidos Portugueses.
Aos 63 anos, foi promovido a general e prestou serviços no Instituto Geagráfico e Cadastral, com vários estudos de sua autoria sobre cadastramento da propriedade rural publicados do boletim deste organismo e na Revista Militar.

Faleceu a 26 de Fevereiro de 1942, na sua residência, a Vivenda Cesária, em Paço d´ Arcos, Portugal.
Do seu casamento com Cesária da Conceição Machado Fonseca, natural de Lisboa, nasceram dez filhos: Viriato, Manuel, Augusto, João, Júlia, Ema, Celisa, Pedro, Lucete e Alberto.
De acordo com Fernando Casimiro, bisneto do general, e que tem em preparação uma biografia do ilustre antepassado, em 1961 a família de Viriato Gomes da Fonseca ainda vivia em Paço d´Arcos, na vivenda Cesária, nome da esposa. As duas filhas mais velhas, Júlia e Ema (com 97 e 95 anos, respectivamente), no final dos anos oitenta, moravam num rés-do-chão, junto dos bombeiros de Paço d'Arcos, tendo ambas vivido ainda mais três anos.
Os restos mortais do General Viriato e outros membros da família encontram-se depositados no jazigo em nome do General Viriato Gomes da Fonseca, no cemitério de Oeiras.
Uma rua com o nome do general Viriato Gomes da Fonseca existiu em tempos, em Mindelo, tendo sido retirada após a independência das Ilhas.

Algumas condecorações recebidas
Comendador da Ordem de Nossa Senhora de Vila Viçosa; Medalha Militar de Prata da Rainha D. Amélia; Medalha dos Serviços Distintos no Ultramar; Comendador da Ordem Militar de São Vicente de Aviz; Medalha de Ouro da Classe de Comportamento Exemplar; Cavaleiro da Ordem Militar de Santiago de Espada e Grã Cruz da Ordem Militar de São Bento de Aviz.

.COMENTÁRIO DE ADRIANO M. LIMA...


A primeira vez que ouvi falar deste conterrâneo general foi em conversa com uma tia minha, já lá vão mais de 20 anos. Até aí, não conhecia sequer a sua existência. Ela contou-me que o militar era amigo da minha bisavó paterna Ana Francisca de Oliveira (Lima por casamento) e da sua família e que sempre que ia a S. Antão não deixava de a visitar, ocasião em que faziam umas festarolas em casa dela e se tocava e dançava. Segundo a minha tia, havia entre eles um laço de parentesco, mas isso só o João Manuel Oliveira poderá confirmar, sendo que em S. Antão isso era uma possibilidade muito provável. O Viriato Gomes da Fonseca seria então um jovem oficial, tenente e mais tarde capitão, e os factos atrás referidos terão acontecido em finais do século XIX e princípios do século seguinte. Com efeito, a sua primeira colocação em Cabo Verde foi em 1897, como tenente.

Depois da narrativa da minha tia, fui ao Arquivo Geral do Exército pesquisar e recolhi material sobre o percurso militar desta personagem. Tudo o que é referido no texto do Viriato de Barros confere com os documentos militares do seu processo individual. Era efectivamente alguém especialmente dotado e com aptidões multifacetadas. Mas as pessoas pensam que ele esteve em Cabo verde como general, o que não é verdade nem podia ter acontecido. Ele esteve em postos mais baixos, e por mais de uma vez, quer em funções militares quer em civis. Além disso, ele nunca chegou a exercer funções como general, pois foi promovido a este posto um ano depois de ter passado à reserva como coronel. Ou seja, ele já estava fora da efectividade do serviço quando foi promovido. Tive ocasião de verificar que o mesmo aconteceu com outros oficiais seus contemporâneos. Presumo que deve ter sido uma forma de ressarcimento, que atribuo à mutabilidade dos governos da I República, uma vez que ele foi um deputado de grandes atributos oratórios. Essa circunstância pode ter interferido com uma normal promoção enquanto no activo, dado que a carreira política não seria de molde a salvaguardar a inteireza do seu estatuto militar, como é fácil de calcular. Refira-se que chegou a ser indigitado para ministro das finanças e que essa nomeação não se concretizou por entretanto ter caído o governo do seu partido.
Sobre a guitarra, que naturalmente não seria de ouro, a minha tia confirmou que ela foi mesmo oferecida pela Rainha. Há sempre um ponto que alguns tendem a acrescentar ao conto.
Faleceu em 1942 e o acontecimento foi noticiado na imprensa. Em 1950, no jornal República é publicado um longo texto da autoria de Manuel Mendes sobre o general, com o título UMA FIGURA COLONIAL – VIDA E OBRA DO GENERAL VIRIATO GOMES DA FONSECA.

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