CRISTIANO JOSÉ DE SENNA BARCELLOS
SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA DE CABO VERDE E GUINÉ – 1460 A 1466
A História destas ilhas não é para nós, filho delas, um estudo indiferente, de mera curiosidade, em que toquemos ao de leve.
Consultámos os principais cronistas, Fernão Lopes, Rui de Pina, Damião de Gois, João de Barros, André de Rezende, e lemos com atenção as viagens do piloto veneziano Luís de Cadamosto; passámos pela vista trabalhos de Lopes de Lima e de outros escritores modernos; com sossego vimos os arquivos das ilhas, Torre do Tombo e as bibliotecas públicas de Lisboa, Évora, Porto, Coimbra, e particularmente a da Ajuda, as quais encerram preciosos manuscritos.
Encandear todos os sucessos que se deram desde o descobrimento até hoje, seguindo um moderno critério na apreciação das notícias espalhadas em centenas de antigos e empoeirados volumes e boletins oficiais, nos pareceu tarefa de não pequena monta.
Sobre a descoberta encontrámos alguns cronistas e abalizados escritores em perfeita discordância, e improfícuo seria este estudo se lhe déssemos crédito, pondo de parte documentos que eles certamente desconheciam e que existem nos arquivos públicos.
Sem método, todo o estudo é vão, e quanto mais o desta História nos parece importante tanto mais cresce a precisão de varrer as nebulosidades em que as ilhas andavam envoltas, formando cada um a seu respeito puras lendas e caprichosas narrativas.
Os vestígios que de si deixam as pessoas nos monumentos e a narração dos coevos é tudo o que deles fica, e sem estas fontes não há viveza de engenho nem agudeza de raciocínio que lhes possam suprir a falta.
Supõem alguns que estas ilhas já eram conhecidas dos antigos geógrafos com o nome de Hesperíidas ou Gorgonas, como diz Plínio.
Plínio e outros, falando das ilhas próximas a Cabo Verde, promontorium Hesperius, não se referiam decerto às do arquipélago de Cabo Verde, que ficam mui distantes do continente negro. Deste não se avista a mais leve sombra daquelas.
Não nega a História que os fenícios, cartagineses e outros povos fossem navegadores, porém é um facto que a navegação deles era toda costeira, mui diferente da do século XV em diante, século em que Portugal abriu caminhos marítimos, ligando assim todos os povos do mundo. Descobriu esse caminho para o oriente e pelo ocidente até à América.
Como explicar, pois, o conhecimento destas ilhas por Plínio e outros, se para isso lhes era preciso fazer uma navegação larga?
Não seriam as Hesperidas ou Gorgonas as mesmas ilhas de que nos fala o Livro 1º. Fl.61 da Chancelaria de D. Afonso V (Torre do Tombo), da temporalidade das quais fez o Infante D. Henrique, doação a seu sobrinho D. Afonso V, incluindo o Cabo Verde? Não seriam as de S. Luis, S. Denis, S. Jorge, S. Tomás e Santa Eiria? Não duvidamos.
Estas ilhas que foram descobertas por Denis Fernandes, acham-se arrumadas nas proximidades do promontorium Hesperius.
Delas falam Ptolomeu, Pompónio Mela, que lhes dá o nome de Gorgonidas, e até os poetas lá descobriram a morada de três irmãs Medusa, Sthenion e Euriala.
Ignorada evidentemente a existência do arquipélago de Cabo Verde durante séculos, deles foram descobertas em 1460 cinco ilhas, ainda em vida do Infante D. Henrique, pelos navegadores Diogo Gomes, português e António de Noli, genovês.
Os documentos comprovando esse grande facto na brilhante história marítima portuguesa eram ignorados pelos nossos antigos historiadores, e até pelo ambicioso Luís de Cadamosto, que pelos anos de 1460, andando ao serviço do infante, queria partilhar a glória desta descoberta, eliminando, numa falsa narrativa que fez, o nome do navegador Diogo Gomes, e substituindo-o pelo seu.
Esta narrativa mereceu encómios e alguns dos nossos historiadores, enquanto a crónica de Azurara, então desconhecida, não veio derramar a precisa luz sobre tão importante assunto; e ainda mais tarde, para tirar todas as dúvidas, mostrou o inglês Richard Henri Major a verdade, fazendo sair do pó da biblioteca de Munich a descrição da viagem do arrojado português Diogo Gomes”…
Pesquisa de A.Mendes
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