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sábado, 2 de abril de 2016

[9079] - CRÓNICAS DA ESPERANÇA (V) ...


Podemos dizer que esta derrota do PAICV corresponde à segunda vaga de Mudança em Cabo Verde (a primeira iniciou-se em Janeiro de 1991 e correspondeu à quase eliminação política do PAICV na década de 90) com a retumbante vitória, ‘raz de maré’, do MPD em Março de 2016


Terá o MPD ganho mesmo, ou o PAICV foi derrotado por defeito, graças ao efeito Ulisses? O futuro do MPD como partido dependerá da resposta a esta questão.

Como referi no artigo anterior, Cabo Verde o tempo da Alternância: Novas Políticas para Tempos Novos, a democracia cabo-verdiana e os cabo-verdianos saíram no resultado do escrutíno a ganhar, todos ganharam: ninguém perdeu, independentemente da camisola partidária e/ou ideologia, pois ganhou a democracia! Sublinhei também o facto de, pela segunda vez em 15 anos, os cabo-verdianos terem votado por opção, para castigar um governo democraticamente eleito, o que obviamente é prova de maturidade política. Hélas, se tudo fossem rosas, se a maturidade política correspondesse à maturidade ‘tout court’, teríamos hoje um país novo à saída das urnas, mas isto está muito longe de ser realidade, pois, como se diz, o essencial não é ter a bandeira, mas hasteá-la.

Como referi no mesmo artigo, a questão angustiante que se colocava a todos os democratas cabo-verdianos no fim-de-semana que precedeu as eleições, é se, tendo em conta a máquina avassaladora do PAICV, e não obstante o cansaço após 15 anos de poder ininterrupto, esse partido poderia ainda assim coagir os cabo-verdianos a uma solução de continuidade, através de promessas inexequíveis ou por recurso a truques e estratagemas pouco ortodoxos. Mas os ‘jovens' não se deixaram iludir pelas anunciadas Agendas Transformadoras e, sacudindo desta vez o marasmo e o conformismo, apostaram na Mudança. Com efeito, a lengalenga da gloriosa luta de Libertação e as romarias nacionalistas, já não seduzem os jovens desempregados, muitos deles com menos de 20 anos, confrontados com as políticas da dita Agenda e os seus efeitos perversos. Assim, a prosápia enganadora do governo foi desmentida pela realidade crua e dura das políticas sociais e dos seus resultados nocivos: o desemprego que atinge toda a sociedade mas que afecta sobremaneira a juventude, a faixa etária mais vulnerável. Nem mesmo a Diáspora, com excepção da residente em África, normalmente a mais alienável e manipulável pelas estratégias ardilosas do poder, resistiu à vontade da Mudança. Podemos dizer que esta derrota do PAICV corresponde à segunda vaga de Mudança em Cabo Verde (a primeira iniciou-se em Janeiro de 1991 e correspondeu à quase eliminação política do PAICV na década de 90) com a retumbante vitória, ‘raz de maré’, do MPD em Março de 2016. O castigo infligido ao PAICV pelos eleitores de S. Vicente nestas eleições, revela o profundo e persistente descontentamento de uma franja enorme da sua população em relação às políticas perseguidas ao longo de décadas a fio pelo partido da independência. Os mindelenses, que levaram o PAIGC ao colo até o colocarem nas poltronas do governador na Praia, acusaram muito cedo este partido de lhes ter traído a confiança ao instalar uma ditadura centralista, contrariamente ao que anunciara, e de ser o principal responsável pelos 40 anos de decadência política e estagnação económica em que caiu a sua ilha, que era a mais importante do arquipélago em 1974. Com efeito, é inaceitável que a ilha que congregava o essencial do poderio intelectual, económico, social e político, tenha sido transformada paulatinamente em deserto social e político, a ponto de até se tornar culturalmente e politicamente irrelevante, triste corolário da sua precária situação socioeconómica. O Centralismo Económico e Político do PAIGCV matou de vez uma ilha que acreditou que a independência lhe traria a oportunidade de um segundo nascimento, daí ter apostado nela com entusiasmo, depois de ver esgotado o ciclo anterior em que florescera, sem que o Estado Novo tivesse encontrado alternativas viáveis. O modelo económico planificado e centralizado de estilo socialista da 1ª República foi o primeiro desencontro da ilha com o PAIGC. Como é que uma ilha impregnada da herança liberal inglesa, que antes se afirmara pelo primado da criatividade humana, poderia sobreviver num regime que suprimia a liberdade económica individual, a essência da sua histórica vitalidade?  

Em 1977, os comerciantes eram a ponta do iceberg de uma contestação latente e silenciosa, isto é, os que restavam depois do êxodo daqueles que recusaram o regime de partido único, ou se abrigaram convenientemente debaixo do guarda-chuva do novo poder instalado na capital. No final da década de oitenta, o PAIGC/CV já não era mais visto pelos mindelenses como libertador, mas sim como opressor, sobretudo depois da repressão exercida contra o mais leve sinal de discordância ou dissidência. Por isso, 40 anos passados continua nas urnas o ajuste de contas com este partido, sem perspectivas de reconciliação, na mediada em que ele continua a defender políticas pouco favoráveis à ilha, fazendo orelhas moucas à problemática da descentralização do poder (continua). (in Cabo Verde Direto)

Abril de 2016

José Fortes Lopes | jose.flopes@netcabo.pt

1 comentário:

  1. A minha esperança é bem modesta. Simplesmente, que o novo governo trabalhe com empenhamento e seriedade e que não engane os cabo-verdianos. Estou um pouco confiante porque este homem parece-me sério, incapaz de se armar em vendedor de banha de cobra como o seu antecessor.

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