Páginas

sábado, 15 de outubro de 2016

[9792] - A GRANDE DÚVIDA...

DESCENTRALIZAÇÃO E REGIONALIZAÇÃO VERSUS MUNICIPALISMO EM CABO VERDE

Introdução

Cabo Verde é um país-arquipélago situado no Oceano Atlântico, a cerca de 570km do cabo que forma o extremo do continente africano. É constituindo por dez ilhas de origem vulcânica, sendo nove habitadas e oito ilhéus, tendo no total uma superfície de 4033 km2 e cerca quinhentos mil habitantes residentes. O clima é tropical seco, com duas estações, uma de chuvas (Julho a Outubro) e outra de um período seco.É uma República soberana, unitária e democrática, reconhecendo a existência e a autonomia do poder local e a descentralização democrática da Administração Pública (CRCV).
A Constituição da República de Cabo Verde estipula que a organização do Estado compreende a existência de autarquias locais que são os municípios, podendo a lei estabelecer outras categorias autárquicas de grau superior ou inferior ao município.
O municipalismo em Cabo Verde tem cerca vinte e cinco anos de existência, havendo em Cabo Verde vinte e dois municípios com os seus órgãos executivos e legislativos democraticamente eleitos pelos respectivos munícipes de quatro em quatro anos desde 1991. Apesar dos ganhos evidentes alcançados em termos de desenvolvimento municipal e local, o municipalismo cabo-verdiano está na fase de consolidação e os municípios continuam a necessitar de mais autonomia, atribuições, poderes e recursos nos mais diversos sectores.
Estando o municipalismo cabo-verdiano na fase de consolidação, pode-se questionar a necessidade de passarmos a fase de regionalização, havendo pessoas que consideram desnecessária a regionalização, por considerarem que a consolidação do municipalismo em Cabo Verde pode ser suficiente para o processo de desenvolvimento local, municipal e regional.

Conceitos
Municipalismo pode ser entendido como sistema político que tem como objectivo a maior autonomia possível para os municípios, concebendo uma administração que dá resposta especialmente à organização e prerrogativas das autarquias pela via de descentralização da administração pública em favor dos munícipes.
Segundo Newton Thaumaturgo “municipalismo é uma instituição mais social que política, mais histórica do que constitucional, mais cultural que jurídica e mais humana que democrática”. 
Descentralização significa transferência efectiva de poderes, competências, atribuições, de recursos e autonomia legalmente definida, podendo melhorar, portanto, os níveis de bem-estar da população, conduzindo à equidade, justiça social, redução da desigualdade, participação comunitária e da sociedade civil, controle social do Estado e maior proximidade entre a Administração e a população.
Desconcentração consiste na delegação de funções, continuando a existir uma autêntica dependência hierárquica em relação ao poder central, sem uma transferência legal e formal dos poderes.
Regionalização pode ser considerada como divisão do país em áreas geográficas onde se escalonam (regionalizam-se funcionalmente) os serviços. A regionalização difere da descentralização porque não implica necessariamente na tomada de decisão. 
Os processos de descentralização e regionalização são complementares, na medida em que, no processo de descentralização, podem utilizar-se critérios relacionados com a delimitação de áreas geográficas, concentração populacional, existência de serviços, programas regionais de desenvolvimento, bem como as divisões políticas e administrativas, conforme as legislações dos países (GOMES, 2006).
Vantagens da descentralização, do municipalismo e da regionalização:
1-Permitir o aumento da massa crítica a níveis local, municipal e regional;
2-Melhorar a coerência das políticas públicas;
3-Reforçar princípio da complementaridade porque muitas decisões passam a ser tomadas por órgãos mais próximos das populações;
4-Atribuir aos autarcas legitimidade democrática directa, através de eleições, sendo obrigados a responderem perante os cidadãos que os elegeram em conformidade com o seu desempenho;
5-Diminuir a intervenção excessiva do Estado e o centralismo, aprofundando a democracia representativa;
6-Estimular a participação das organizações da sociedade civil em benefício do desenvolvimento local e regional;
7-Reduzir as desigualdades e as assimetrias regionais e locais. 
8-Induzir a uma melhor transparência na gestão dos bens públicos. 
9-Distribuir de forma mais justa, equilibrada e racional a riqueza nacional.
10-Incentivar a fixação de quadros.
Desvantagens da regionalização
1-Dar resposta a ficção criada para reforçar o poder dos políticos locais, bairrismo e o caciquismo regional, pondo em causa a integridade nacional. 
2-Originar vários centralismos em vez de um centralismo.
3- Ter as mesmas vantagens do municipalismo e descentralização já em curso em Cabo Verde.
4-Ser preferível reforçar os poderes, as atribuições e as competências dos municípios. 
5-Criar associações regionais dos municípios já existentes. 
6-Reforçar a burocracia e a o aumento de cargos. 
7-Aumentar a despesa pública. 
8-Comprometer a coesão nacional e a integridade do país. 
9- Fomentar um clima de conflito permanente entre regiões. 
10-Pôr em causa a solidariedade nacional.
Para cabo verde qual é o melhor caminho?
Existem em Cabo Verde acentuadas diferenças naturais, linguísticas, culturais ou étnicas? - Considero que não.
Um Estado pequeno, insular, com cerca de quinhentos mil habitantes e com parcos recursos, provavelmente terá que optar por um processo de reforma do Estado menos dispendioso possível e mais efectivo. A via da redução do aparelho do Estado, com reforço das competências, poderes e atribuições dos municípios já existentes poderá ser a mais aconselhável.
Como reduzir o aparelho do Estado em Cabo Verde? Em vez de vinte Ministros, oito Ministros poderiam ser suficientes? Os municípios que funcionam com nove vereadores não poderiam funcionar com sete? As Assembleias Municipais que funcionam com vinte e um eleitos funcionariam com a mesma efectividade se tivessem 17 eleitos? Considero que sim.
A redução das despesas do Estado desaconselha a criação de novos municípios e de governos regionais susceptíveis de trazer mais despesas para o Estado.
Se queremos reduzir o aparelho do Estado, como apostar na regionalização sem mais despesas para o Estado? Creio que a melhor via seria reforçar as competências, as atribuições, os poderes e os recursos dos governos municipais já existentes (Câmaras e Assembleias Municipais) e criar os Governos Regionais dos Municípios designadamente Governo Regional dos Municípios de Santiago Sul e do Maio, Governo Regional dos Municípios de Santo Antão, São Vicente e de São Nicolau, Governo Regional dos Municípios de Santiago Norte, Governo Regional dos Municípios do Sal e da Boa Vista e Governo Regional dos Municípios do Fogo e da Brava.
Esses Governos Regionais dos Municípios funcionariam como Governos Regionais dos Municípios sem novas e mais despesas para o Estado, tendo como membros os Presidentes das Câmaras que fazem parte da região e seriam presididos rotativamente por um dos Presidentes das Camaras Municipais que os integram, tendo competências, atribuições e poderes próprios nos termos da lei, sem necessidade de eleições.

CONCLUSÃO
As regiões não devem implicar maior despesa pública. Devem sim implicar uma redução e um melhor gasto do dinheiro público.
Pode ser preferível melhorar o modelo actual e concentrar esforços e recursos para a melhoria da qualidade de vida das pessoas, sobretudo nas áreas da saúde, educação, acção social, habitação, emprego e formação profissional a nível dos municípios cabo-verdianos.
ORLANDO P DIAS

2 comentários:

  1. DESCENTRALIZAÇÃO E REGIONALIZAÇÃO VERSUS MUNICIPALISMO EM CABO VERDE um artigo de Orlando Pereira Dias que vem trazer ao público o seu ponto de vista, uma opinião que deve ser tida em conta.
    O autor é contra a regionalização defendendo o municipalismo.
    Este é um debate que merece ser feito: Municipalismo versus Regionalização.
    Sou regionalista logo não defendo substituir o debate da Regionalização pelo o do Municipalismo. De resto sou da opinião que o Mucipalismo não é solução para o impasse que se encontra as diferentes ilhas de Cabo Verde no seu processo de desenvolvimento
    Para além disso não se pode misturar muncipalismo com regionalização como faz o autor, parece-me que há uma certa confusão conceptual. Sobre Desconcentração Descentralização Municipalismo e Regionalização há mesmo aspectos que podem baralhar o leitor pois na minha opinião, não estão suficientemente esclarecidos.
    Bom esperar um debate como reclama Orlando Dias é pedir demais. A sociedade está completamente alheia a tudo, para não dizer alienada. Este era um tema que deveria ser debatido em todos os sentidos e direcções pois poderá ter implicações na vida das pessoas. Mesmo no Mindelo onde a ideia pegou a ponto que a ilha pode ser considerada conversa à causa da Regionalização ninguém diz nada, nem coisa com coisa desde que o MPD tomou o poder, esperando que venha a Regionalização na bandeja. Pois temo que está a ser bem cozinhado e que haverá decepções.
    Costuma-se dizer fia-te na virgem...Pois cada vez fico com uma percepção que em Cabo Verde o povo nunca contou e nunca contará, nunca teve voto na matéria para grande coisa: os processos serão impostos de cima por quem mais ordena. O modelo de regionalização será imposto sem debates, pois em Cabo Verde ninguém debate nada, poucos dão a cara. Se os regionalistas tiverem força e a ombridade imporemos o nosso , senão será o do poder. That's tooo bad mas é assim..

    ResponderEliminar
  2. Vê-se mesmo que o autor deste artigo é declaradamente contra a regionalização. Não o esconde sequer. Produz um discurso que efectivamente pode ser tomado como um apalpar de terreno (auscultação de receptividade) por parte do MpD e seu governo no sentido de demonstrar que o reforço do municipalismo é o mais adequado para a nossa terra.
    Este artigo é uma espécie de réplica mal conseguida de tudo o que publicámos sobre a matéria esclarecendo questões conceptuais e de procedimento.
    Aliás, há afirmações desconexas e confusas, como por exemplo esta: “A regionalização difere da descentralização porque não implica necessariamente na tomada de decisão”. Absolutamente errado. A regionalização é a expressão mais acabada da descentralização. Como se compreende um poder regional sem capacidade de decisão?
    Ou então estoutro exemplo: “Os processos de descentralização e regionalização são complementares, na medida em que, no processo de descentralização, podem utilizar-se critérios relacionados com a delimitação de áreas geográficas, concentração populacional, existência de serviços, programas regionais de desenvolvimento, bem como as divisões políticas e administrativas, conforme as legislações dos países".
    Ele aqui cita um Gomes, mas é óbvio que subscreve a ideia de que “os processos de descentralização e regionalização são complementares”. Errado, pois a descentralização não é a mais que o modus operandi, a via instrumental, para a implementação da regionalização. Dizer-se que são complementares sugere a ideia de que são processos distintos. Penso que ele pretenderia dizer desconcentração em vez de descentralização. Pois, a desconcentração de organismos do estado é que, sim, pode operar-se complementarmente com a criação de regiões.
    Ao citar Newton Thaumaturgo: “municipalismo é uma instituição mais social que política, mais histórica do que constitucional, mais cultural que jurídica e mais humana que democrática”, percebe-se a intenção, subjacente, de passar a ideia de que o municipalismo é o que nos serve. Precisamente porque, como é aqui dito, o municipalismo é “mais social que político”. Neste reparo é nítida a advertência sobre o risco de criar poderes (regionais) que tenham capacidade de decisão política.
    Sem desprimor para o autor, esta sua contribuição para o debate é algo inócua, além de confusa em aspectos conceptuais.

    ResponderEliminar