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segunda-feira, 21 de janeiro de 2013

ERA UMA VEZ, ANGOLA...XX


Quando nessa noite, já na cama, revi as aventuras do dia e que haviam conhecido o seu epilogo com o tiro certeiro da Winchester do Padre Dâmaso sobre um cavalo-marinho que iria matar a fome a muita gente da Missão Católica e da Gafaria do Alto Zambeze, dei comigo a rever tudo o que já sabia sobre os sítios e as gentes...
O Alto Zambeze era uma planície (anhara)  imensa, povoada, sobretudo, por Luenas (ou Luvales) súbditos da Rainha Nhacatole, que residia na Rodésia do Sul, perto da pequena cidade de Balovale de onde seria deslocada bem mais cedo do que eu poderia pensar na altura...Além da capital da Cicunscrição, Cazombo, havia mais seis Postos Adimistrativos; Caianda, Calunda, Nana-Candundo, Lumbala, Lóvua e Cavungo...Eu haveria de conhecer os homens - ou Chefes de Posto - que administravam esses núcleos territoriais como o velho Pimentel, do Lumbala, um sessentão que conhecia Angola de lés-a-lés e de quem se dizia falar seis línguas autóctones, o Rodrigues, de Nana-Candundo (árvore-da-borracha) e caçador inveterado, o José Manuel Nobre, de Caianda (e por isso seria baptizado de Zé Caiandas) e, por ultimo, o mais castiço deles  (e mestiço),  de Calunda, o José Ruy Cardoso de Mattos (assim mesmo: Ruy com ipsilon e Mattos com dois tês como jamais se escusava de referir). Era casado com uma loira líndissima, de nome invulgar: África Agripina, ex-trapezista de circo e que todos os meses vinha a Cazombo visitar o Dr. Poupinha das Neves pois sofria daquilo a que o médico chamava de "menstruação dolorosa"...Durante o tempo que estive em Cazombo, não houve Chefes de Posto, que me lembre, em Lóvua e em Cavungo, cujos assuntos eram tratados em Nana-Candundo ou em Cazombo...
Estes, afinal, eram as pessoas de quem eu sabia os nomes mas ainda não conhecera mas cujas imagens, mais tarde ou mais cedo, se viriam juntar às do Administrador José Eduardo Marques Estaca e esposa, ao médico, Dr. Eugénio Poupinha das Neves e esposa, do enfermeiro Pedro Alencar, do motorista-caçador Heitor Cardoso, do gerente do "hotel" Mário Matos, esposa, irmãs, cunhados e filho, etc.etc. não contando com o Secretário da Aministração, já nomeado em Boletim Oficial mas ainda ausente, o Amílcar von Willer Salazar...
Havia, alem disso, mais dois comerciantes europeus, o Sr. Cupertino, de Peniche, já entradote, casado com uma senhora que raramente se via, e pai de uma moça tão branca que parecia viver na Sibéria e o Sr. Coutinho, um homem minúsculo e de tez tão escura que parecia africano, natural, claro, de Cuba (Alentejo). Era  casado com uma jovem senhora de olhar doce e cabeça baixa como se se envergonhasse do seu belo rosto de mulher trigueira...
O meu ultimo pensamento, antes de adormecer, foi para a formação de uma mesa de "king" que nessa noite se havia combinado para o dia seguinte, com o Heitor, o M. Matos, o Coutinho e eu...Mal podia esperar!
(Continua)

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