O apurado sentido de pesquisa do nosso colaborador A. Mendes, levou-o à descoberta de escritos do SEC. XIX sobre a Ilha de Santo Antão e a que, gostosamente, vamos dar guarida, mantendo a escrita da época, o que torna a leitura bem mais divertida...Esperamos que apreciem devidamente...
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ARCHIPELAGO
DE CABO VERDE
ILHA
DE SANTO ANTÃO
(Clima)
Desfructa a ilha de
Santo Antão excelente clima.
São alli desconhecidas
essas febres emdemicas e malignas, a que chamam carneiradas, e que dizimam, em certos períodos do anno, a população
das ilhas de S. Thiago e S. Nicolau principalmente. As sezões que tanto afligem
os moradores da ilha de Maio, e as disenterias, que tantas vidas custam aos
habitantes d’esta e de outras ilhas do archipelago de Cabo Verde, também
isentam dos seus rigores a ilha afortunada de Santo Antão, que em salubridade
leva vantagem á nossa Lisboa, que tanto se ufana de gozar de ares salubérrimos.
As frescas brisas do
Oceano, que por todos lados a bafejam, modificam a sua temperatura africana,
fazendo-a muito menos quente que a das terras do continente situadas na mesma
latitude. Apenas em alguns valles do interior, onde, por mui baixos e cercados
e montanhas altas, aquellas brisas não penetram, é que se sente esse calor
excessivo dos trópicos.
Junho, julho, agosto
e setembro, e principalmente os dois últimos são os mezes das chuvas, e é isto,
com alguns temporaes do sul, o que constitue o inverno. Durante esta quadra
está a atmosphera mais ou menos nebulosa. Não é raro, porém, passar-se um anno
ou mais sem chover. Quando sucede esta desgraça, os horrores da fome levam á
sepultura milhares de victimas.
Os mezes de outubro a
dezembro e de janeiro a maio são chamados mezes das
brisas , porque n’essa quadra sopram frescas de E. N. E. até N.N. E., as quaes
ás vezes se convertem em fortes ventanias. Enquanto o ceo conserva-se
ordinariamente limpo e a atmosphera clara, excepto quando o vento, voltando a
lêste, traz das praias africanas aquelle sopro ardente, que até nos chega no
verão, parecendo sufocar os viventes, e crestando as plantas como se fossem
tocadas do fogo. É em dezembro e janeiro que esse vento abrasador açoita de vez
em quando as ilhas de Cabo Verde. Por essa ocasião turva-se a atmosphera de
vapores crassos.
As manhãs e as noites
são em geral sempre frescas, tanto na ilha de Santo Antão como em todo o
archipelago, e não é raro aparecerem algumas frias. As cacimbas são commumente
tão copiosas, que chegam a ensopar as velas das embarcações surtas nos portos,
e até as dos navios que vão sulcando aquellas aguas. Se durante a noite ou
madrugada houve ventania forte, o que acontece a miude , levanta um pó mui fino
e amarello, que se vai impregnar, tingindo da sua côr, em quantas velas
molhadas encontra em seu caminho. D’aqui tiram motivo os que exaggeram a
insalubridade de algumas ilhas do archipelago para dizerem que “ nas ilhas de
Cabo Verde até as velas dos navios se fazem amarellas”…
E. de Vilhena Barbosa
Foto - John Leão
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