QUANDO O DEBATE REGIONALISMO E REGIONALIZAÇÃO MARCA A AGENDA
POLÍTICA
B-DESMISTIFICANDO A PROBLEMÁTICA DA
REGIONALIZAÇÃO
Como
demonstrei no artigo precedente
publicado neste jornal (O Modelo de Governador Provincial ou do Municipalismo
versus o Modelo de Regiões Autónomas), o reforço do Municipalismo pode ser, a meu ver,
inclusivamente muito perigoso em Cabo Verde, podendo engendrar uma miríade de
poderes paralelos, com caciques locais dispersos numa mesma ilha, ou seja, o
caos político, ao gosto dos centralistas que continuariam a tirar dividendos
políticos das querelas intestinas e das guerras fratricidas. O reforço do
Municipalismo seria no fim nefasto e alienante para a democracia. É
precisamente o oposto que se pretende com a Regionalização, propõe-se caminhar
rumo a políticas de maior integração e sinergia nas ilhas e entre as diferentes
autarquias, o todo integrado numa perspectiva de desenvolvimento insular ou
regional.
JMN desenvolveu uma argumentação falaciosa
alegando que na medida em que ela exigiria revisão da Constituição, a
Regionalização é inviável. Ou seja, na sua concepção estática, nenhuma reforma
em Cabo Verde é possível por causa da Constituição, que no seu entender deve
ser inflexível, imutável e eterna. Outro estafado argumento é o de Cabo Verde
ser um pequeno estado insular, com cerca de 500 mil habitantes com
grandes vulnerabilidades e que se encontra num processo revolucionário de
desenvolvimento, a tal Agenda de Transformação, pelo que não há condições para
a instalação da Regionalização. Recorde-se que estes mesmos argumentos e outros
espantalhos eram usados em finais da década de 80 do século passado pela ala
conservadora do PAICV contra o pluripartidarismo. A falácia desta argumentação
é total, pois nesta óptica o nível de democracia está condicionado pela
dimensão e a população (neste caso a Suíça seria o país menos democrático do
mundo) ou a riqueza de um país (neste caso os países do Golfo Arábico seriam os
mais democráticos do Mundo e a democracia podia-se comprar com uma injecção de
dólares).
Esquecendo que foi
o autêntico campeão do centralismo e da burocracia, apresenta outro argumento
paradoxal, a saber: ‘ Os custos para o funcionamento
desta rede de burocracias serão, também, enormes’… ‘E o déficit
de recursos tanto a nível nacional como a nível municipal é grande. Ou
será que com a criação de regiões multiplicaríamos milagrosa e imediatamente os
recursos para construir estradas, portos, aeroportos, cais de pescas e outros
equipamentos sociais e económicos e resolver-se-iam os problemas de desemprego
em todas as ilhas e municípios’. Todavia, como dois proveitos não podem
caber num mesmo saco, a Regionalização terá forçosamente implicações no coração
do próprio sistema e do regime, que terá que ser repensado, no sentido do seu
redimensionamento e reequilíbrio (talvez esteja aí a razão das resistências à
Regionalização), para evitar redundâncias. A criação de parlamentos regionais e
de governos regionais implicará uma redefinição, ou mesmo reforma do parlamento
nacional, por um lado, e do papel dos municípios, por outro lado, exigindo
forçosamente no fim uma reforma constitucional. Para que se possa criar um
poder regional dotado de órgãos e parlamentos regionais com custo quase zero
para o país, afigura-se, pois, necessário o emagrecimento da Assembleia
Nacional e das Assembleias Municipais,
com redução do número de deputados nacionais e municipais. A Regionalização vai
implicar, pois, a necessidade de um Reorganização Administrativa e Política do
país, incluindo Reforma do Municipalismo e do funcionamento do Parlamento
Nacional, afigurando-se necessário o emagrecimento da Assembleia Nacional e das
Assembleias Municipais, com a redução do número de deputados nacionais e
municipais.
Por fim JMN afirma que ‘Ou será que com a criação de regiões
multiplicaríamos milagrosa e imediatamente os recursos para construir estradas,
portos, aeroportos, cais de pescas e outros equipamentos sociais e económicos e
resolver-se-iam os problemas de desemprego em todas as ilhas e municípios’.
Esta Agenda de Transformação
voluntarista que consiste em pensar que se desenvolve o país somente
construindo estradas, portos, aeroportos, cais de pescas, etc, num único ponto
do país e sem retornos plausíveis, e sobretudo recorrendo a um endividamento
irresponsável, é muito duvidosa, na medida em que nunca se viu os efeitos
efectivos desta política numa ilha de S. Vicente (tampouco no resto de Cabo
Verde), que atravessa uma das piores situações socio-económicas. Politicamente
esta agenda não é sustentável e por variadas razões expostas noutros artigos
ela vem sendo posta em causa pelos regionalistas que acusam de ser um vector de
Centralismo: a Regionalização, a Descentralização Desconcentração exigem um
novo paradigma de desenvolvimento baseado na criação da riqueza nas
Regiões.
A Regionalização pretende precisamente
melhorar o funcionamento da democracia e do Estado, aproximando o poder das
ilhas e das pessoas, ao contrário daquilo que faz o centralismo, que monopoliza
tudo, e que tem empobrecido Cabo Verde de todos os pontos de vista. O povo
cabo-verdiano pela sua maturidade e valores civilizacionais merece e tem todas
as condições para assimilar uma reforma tão importante como a Regionalização,
ancorando assim o país de maneira definitiva no concerto das nações
democráticas e evoluídas.
Concluindo, JMN, o PAICV e o MPD têm que
estudar mais a Regionalização e reflectir melhor sobre ela para as próximas
declarações. Que não se enganem, a Regionalização implica a criação de Governos
Regionais Autónomos, pelo que deve-se atribuir soberania suficiente para que se
desenvolvam políticas indispensáveis para a alavancagem do desenvolvimento das
Regiões sem peias nem tutelas do poder central.
José
Fortes Lopes
Referências:
1- JOSÉ MARIA NEVES Regionalismo
Regionalização e Taticismo Políticos, Facebook2-JOSÉ FORTES LOPES: O Modelo de Governador Provincial ou do Municipalismo versus o Modelo de Regiões Autónomas. Jornal de São Nicolau, http://www.jsn.com.cv/index.php/opiniao/666-jose-fortes-lopes-o-modelo-de-governador-provincial-ou-do-municipalismo-versus-o-modelo-de-regioes-autonomas
3-ULISSES CORREIA E SILVA: Modelo centralista é um empecilho ao desenvolvimento de São Nicolau (III),
http://www.jsn.com.cv/index.php/entrevista/723-ulisses-correia-e-silva-modelo-centralista-e-um-empecilho-ao-desenvolvimento-de-sao-nicolau-(iii)
4-ULISSES CORREIA E SILVA: “A sociedade civil tem que mostrar poder” (IV) http://www.jsn.com.cv/index.php/entrevista/729-ulisses-correia-e-silva-a-sociedade-civil-tem-que-mostrar-poder-iv
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