Cabo Verde "Stuck in the Middle"...
· Escrito por Paulo MONTEIRO, Jr - Prof. de Economia do ISCJS
Neste começo da Primavera de 2014, o governo completou treze anos em funções. A lembrança desta efeméride deveria servir para analisar e compreender as razões dos principais bloqueios à mudança da estrutura da economia cabo-verdiana e os desafios à governação que colocam.
Raghuram Rajan – académico e investigador indiano, antigo economista-chefe do Fundo Monetário Internacional e atualmente Governador do Banco Central da Índia – publicou em 2010, um livro intitulado Fault lines que pode ajudar na compreensão do porquê que um país pequeno com as caraterísticas de Cabo Verde permanece stuck in the middle. Vários fatores concorrem para essa situação. Estes fatores têm natureza distinta mas os seus efeitos reforçam-se mutuamente. Em particular, podemos salientar: qualidade muito fraca das instituições – a começar, pela educação e o sistema judicial –, a incapacidade dos governantes de promover verdadeiras respostas estruturais para resolver os problemas de sempre do país – designadamente os baixos níveis de capital social e de competitividade –, a intervenção substancial e ineficiente do governo na economia, o buraco das finanças públicas – acompanhado de uma dívida pública excessiva –, clientelismo e lóbis políticos.
Estas razões sugerem que o estado atávico da economia cabo-verdiana resulta tanto da crise internacional como, e sobretudo, de problemas próprios que o governo não tem sabido resolver. Par dar um exemplo eloquente, e, basta um: o governo neste horizonte de treze anos não conseguiu reestruturar a empresa pública de transportes aéreos (TACV), ineficiente e com um passivo alarmante, e, nem criar com parceiros estratégicos – nacionais e estrangeiros – um sistema de transportes entre os pólos de atividade económica no Arquipélago e com os países vizinhos. Não basta a retórica triunfante do governo.
Cabo Verde vai ter que redefinir e viabilizar a sua posição como país de rendimento médio e membro efetivo da Organização Mundial do Comércio. Adicionalmente, ao processo de transição em curso veio sobrepor-se o aprofundamento da integração da economia cabo-verdiana na CEDEAO. A confluência da transição com o aprofundamento da integração económica na CEDEAO é um processo de grande envergadura que cria um contexto concorrencial e de financiamento externo substancialmente diferente com impacto profundo sobre a gestão orçamental do Estado, a reestruturação do tecido empresarial e o jogo de vantagens comparativas entre nações. Acresce que nesse processo o governo deveria encorajar ativamente a iniciativa privada – nacional e estrangeira – e promover a orientação da economia para o setor dos bens e serviços transacionáveis internacionalmente. O problema é que o governo não preparou a economia para os desafios actuais e não consegue criar as condições favoráveis para a concretização das iniciativas empresariais privadas sobretudo das vocacionadas para fazer do Arquipélago uma plataforma logística do Atlântico para serviços transacionáveis no mercado global.
Neste triénio da VIII legislatura a economia cabo-verdiana regista, em média, uma taxa de crescimento do PIB real per capita inferior à 0,5 por cento (ou seja, queda brusca para uma quase estagnação do nível de vida ou de bem-estar da população) e desequilíbrios macroeconómicos profundos e persistentes. Destaque-se que, devido a um sector de exportação de bens atrofiado e à competitividade – em termos de custos muito fraca da economia cabo-verdiana –, o défice da balança comercial, uma medida da procura interna de bens que foi satisfeita pelo exterior, é gigantesco, à volta de 40% do PIB. Num contexto de forte especialização geográfica das exportações e importações – quase 4/5 do comércio externo é feito com a União Europeia –, as importações de bens e serviços continuam a cair , traduzindo-se numa nova descida da taxa de penetração das importações na procura global. A evolução das importações está intimamente associada com a queda da procura doméstica ponderada por conteúdos importados. A evolução da balança financeira do país traduziu essencialmente a recomposição do financiamento externo, com a contínua queda do investimento direto estrangeiro acompanhada por uma significativa entrada líquida de fundos associada aos desembolsos dos empréstimos externos para financiar o programa de investimento público e, como consequência, o crescimento extraordinário da dívida externa pública.
Em conclusão, no período analisado, existe evidência empírica no sentido de considerar que a estratégia de intervenção do governo falhou e a economia cabo-verdiana permanece stuck in the middle. No momento presente, para o reposicionamento sustentável do país, as duas questões – chave são: primeira, uma estratégia orçamental de saída – da responsabilidade do governo – e, neste contexto, uma política monetária eficaz – da responsabilidade do Banco de Cabo Verde; segunda, assegurar uma combinação específica de fatores para a captação de investimento direto estrangeiro – estrutura de incentivos – e para a atratividade de quadros e talentos criativos nacionais e estrangeiros, favorecendo o crescimento económico e a correção dos desequilíbrios macroeconómicos fundamentais numa perspetiva intertemporal.
O economista autor deste texto parece dotado de competência e clarividência.
ResponderEliminarEu diria 'Stuck in the Time' parado no tempo apesar das aparências e da ilusão em que alguma pessoas da elite vive. Até quando a falsa ilusão de desenvolvimento quase exclusivamente suportado de fora? 'This is the point'!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
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