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quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

[7733] - O LUGAR DA HISTÓRIA...

José Fortes Lopes
Da Independência à 1ª Via: 1974, a tomada do Poder pelo PAIGC e a fuga da Elite Cabo-verdiana
In Cabo Verde 40 anos após a Independência  

Este artigo constitui um subsídio à história de Cabo Verde para que se possa perceber o presente e antecipar o futuro, tendo em conta as lições do passado. Numa altura de grande desorientação social, política, religiosa e ideológica, em que se tenta escrever e reescrever a História, impõem-se repor alguma verdade sobre os factos históricos e reanalisá-los, sendo certo que ninguém pode ter a pretensão de saber tudo e deter toda a verdade.
É comum afirmar-se que Cabo Verde é um país que nasceu de um sonho utópico. Na realidade, reza a história que o sonho de uma nação independente parece ter sido acalentado desde o século XIX por uma elite cabo-verdiana proto-nacionalista, influenciada pela independência do Brasil, embora esbarrando no modus operandi para a sua conquista e nos meios para a sua concretização e viabilização, tratando-se de um arquipélago desprovido de qualquer recurso. Inegavelmente, foi Amílcar Cabral e o partido que fundou em terras da Guiné, que permitiram concretizar o sonho da independência de Cabo Verde. Mesmo assim, a génese deste movimento não é alheia às reivindicações nacionalistas/independentistas dos anos 60 nascidas nos países africanos, locais onde radicava uma importante comunidade emigrante, como é o caso do Senegal, uma colónia francesa bastante desenvolvida na altura, em contraste com Cabo Verde. É claro que embora a Guiné e Cabo Verde atingissem a independência em 1974 e 1975, concretizando o sonho de Amílcar Cabral, e hoje dois estados soberanos, o cerne do projecto inicial inspirado pelo líder do movimento consistia numa unidade orgânica das duas nações (a Unidade Guiné-Cabo Verde).
Não se pode esquecer que esta ideia se inspirava no pan-africanismo, uma ideia muito forte, nascida nos meios nacionalistas africanos dos anos 60 e que visava o projecto de integração africana, como vinha acontecendo um pouco por todo o Mundo (Europa, América) com a criação de várias estruturas de integração supranacionais. Todavia, a Unidade Guiné-Cabo Verde não deixava de ser uma das principais fraquezas do projecto político do PAIGC, o seu verdadeiro calcanhar de Aquiles: a razão da própria existência deste partido supranacional acabava por ser o germe da destruição do mesmo. As dificuldades conceptuais e práticas na implementação do projecto da Unidade Guiné-Cabo Verde, durante a luta de libertação na Guiné, não deixaram de ser admiravelmente exploradas e combatidas pelas autoridades coloniais portuguesas, com argumentos, hoje incontestáveis, sobre a sua inviabilidade prática e concreta. O facto de Portugal não pretender abrir mão do arquipélago de Cabo Verde, dada a sua importante posição geoestratégica, era a principal determinante da sua argumentação, e a história dos acontecimentos que se seguiram encarregar-se-ia de validar as suas razões. Os mesmos argumentos seriam retomados pelos críticos do PAIGC, no pós-25 de Abril, acabando por constituir o principal pomo de discórdia entre os protagonistas no terreno em Cabo Verde, no período de 1974/1975, o que levou tanta a gente à prisão e a submeter-se à expropriação dos seus bens e ao exílio forçado de milhares de cidadãos. 
Abro aqui parêntese para analisar esta problemática. 
Com efeito, ao desafiar o PAIGC, inclusivamente criando um partido concorrente, a elite social mindelense, particularmente representada pelos membros do cobiçado Grémio da Praça Nova (ver Nota), estava selando o seu destino, não tinha outra alternativa senão o abandono do país ou algo pior, incapaz de perceber que a sua situação política era francamente desfavorável. Com efeito, o PAIGC, que já era um partido aguerrido, com quase 20 anos de existência, composto de militantes com alguma experiência política e internacional, conseguiu angariar em poucos meses uma grande fatia da juventude, organizando uma vanguarda combativa, com ‘sangue na guelra’, que rapidamente se familiarizou com as mais diversas teorias e práticas revolucionárias, com vontade nítida de mostrar serviço e valentia frente aos Combatentes da Guiné. Por outro lado, face à situação de caos político e social na então Metrópole, com as forças armadas desorganizadas e um país dirigido por um MFA e um Conselho da Revolução de esquerda, totalmente devoto à causa da descolonização, e por isso aliando-se decididamente aos Movimentos de Libertação, os partidos que mais se reclamavam aliados de Portugal nas ex-colónias viam-se, por ironia do destino, sem a preciosa protecção da ex-potência colonial. As elites das ex-colónias eram todas conotadas com a Metrópole, agora maioritariamente adepta á causa da descolonização imediata e de mais nenhum soldado para as colónias, e vistos como colonos ou colonialistas, o que não era bem o caso da cabo-verdiana (ver NOTA). Portugal do pós-25 de Abril, queria resolver a questão colonial num ápice, virar a página e entrar na CEE o mais rapidamente. Acresce que a elite cabo-verdiana não reconhecia o auto-proclamado estatuto de heróis ou de melhores filhos da nação cabo-verdiana aos recém-chegados líderes do PAIGC, pelo simples facto de terem lutado nas matas da Guiné. Recorde-se que a oposição atacava este partido naquilo que talvez era o seu verdadeiro calcanhar de Aquiles, rotulando-os de perigosos comunistas encapotados e de quererem governar sozinhos e instaurar uma ditadura. O PAIGC negava defendendo ser um partido do povo, e considerava o único representante legítimo do povo cabo-verdiano, que iria instalar um regime revolucionário democrático, do povo, para o povo e pelo povo. Com uma resposta desta calava a oposição, mas estávamos conversados quanto às intenções deste partido, pois como sabemos o povo é sempre um bode expiatório das aspirações políticas dos partidos que aspiram poderes revolucionários. Por outro lado, punha-se em causa a legitimidade e a competência dos membros deste partido para dirigirem os destinos de Cabo Verde. Tendo em conta esta situação inconfortável, só restava ao PAIGC uma política de terra queimada e de intimidação, como única via possível para se desembaraçar desta inoportuna oposição e conquistar o poder total. Num espaço sociopolítico limitado e exíguo como era Cabo Verde em 1974, não havia lugar, para dois grupos em concorrência e que se odiavam mutuamente e que se fecharam nas suas razões e certezas. O PAIGC apresentava-se como um partido Demiurgo, messiânico, com pretensões ao culto da personalidade dos seus líderes. Pena não ter havido possibilidade de diálogo e concertação, sobretudo se tal tivesse sido facilitado pela potência colonial administrante. Mas a elite que agora estava representada por um partido de oposição, UDC (sediada maioritariamente em Barlavento), era, justamente ou injustamente conotada (pois haveria sem dúvida muita boa gente, pessoas de valor, patriotas e amantes de Cabo Verde, que poderiam ainda ter contribuído para o novo Cabo Verde) com o ‘ancien’ regime colonial fascista, simbolizavam pessoas do passado. A UPICV (sediada maioritariamente no Sotavento) era um pequeno partido alegadamente de inspiração maoista e que se opunha, também, ferozmente ao PAIGC. Ambos eram favoráveis ao Referendo ou a uma consulta popular democrática para que o povo se pronunciasse livremente, Defendiam também o multipartidarismo, mas o PAIGC respondia agressivamente a tais pretensões com um rotundo NÃO. O multipartidarismo muito discutido na época seria, pois, num tal clima inviável ou um nado morto. Pois é, hoje, só os mais jovens ficam surpreendidos pelo actual clima político, que é bem pacífico e civilizado quando comparado com o da intolerância e do radicalismos de 1974! Só os brandos costumes do povo cabo-verdiano decorrente do nível de civilização atingidos no arquipélago (que era cem por cento seguro e pacífico, a contrastar com a situação social actual) evitaram que se descambasse para situações perigosas ou trágicas.
 Em Dezembro de 1974, o ‘povo’ do Mindelo, conduzido pelo PAIGC, tomava o seu ‘Palácio do Inverno’, assaltava a Rádio Barlavento e o Grémio, ocupando-os e nacionalizando-os. Iniciava-se a revolução cabo-verdiana e o caminho para a Independência Total e Imediata. Mas, pior do que a tomada de qualquer palácio, de residências e de outros bens públicos e privados, o maior sacrilégio seria cometido na ilha, algo de que hoje ninguém se fala: a Biblioteca Municipal seria assaltada, vandalizada, desaparecendo para sempre o seu enorme espólio composto por várias obras, de certeza algumas de um valor inestimável, e que se encontram, 40 anos depois da revolução, em paradeiro incerto ou desconhecido. Instaurava-se o poder popular com comités de zona, denúncias, tribunais populares e outros órgãos de cariz revolucionário. A confusão era tal sobre os objectivos da pretensa revolução, que muitos não sabiam ao certo de que é que se tratava, não se percebendo que o que estava em causa não era mais do que uma pura transferência do poder e a substituição de uma velha elite, dita colonial, por uma outra nova, dita nacional. Acreditava-se que após a expulsão dos burgueses, ‘capitalistas’ e colonos, o povo apropriar-se-ia de tudo o que haveria na ilha e no país, seja bem público ou privado, a ponto de uma revolucionária ter dito: ‘Mim próxima vez q’ um parí, tita ba ser na Poloç’. Pois é, estes edifícios coloniais onde nunca o povo tinha posto os pés fascinavam, acreditava-se que se estava a dar um Golpe de Estado no Paraíso, desconhecendo-se que as revoluções engendram paradoxos e originam regimes ainda mais castradores de liberdade, direitos e garantias que os dos ‘ancien’ regimes detestados.
Com a tomada da Rádio Barlavento em Dezembro de 1974 estava tudo consumado do lado da oposição. O medo e o pânico instalaram-se e generalizaram-se na elite social, dava-se o sinal para a debandada final, o que para a maioria significava deixar definitivamente e para sempre a sua terra natal. De uma assentada, Cabo Verde perderia grande parte da sua elite de então (talvez mais de 50%), sobrando os que se acomodaram e se recompuseram com o novo poder ou os que viraram a casaca pura e simplesmente. Este facto terá permitido uma certa continuidade à vida do novo país, apesar do vácuo geracional criado, mas permitiria a consolidação do poder do PAIGC. Um pouco por todo o arquipélago, este vento de pânico provocava corrida para o estrangeiro, obviamente para quem pudesse e não simpatizasse com o novo poder, a maioria refugiando-se em Portugal, Holanda, Brasil e EUA. O movimento de emigração, provocado pelos eventos políticos em curso no arquipélago, agora atingia todos os estratos da sociedade cabo-verdiana, e ironicamente os mais abastados e confortavelmente instalados, nunca mais pararia, dando origem a uma nova dimensão à Diáspora cabo-verdiana. A oposição aproveitava este movimento para se organizar e fortalecer ameaçadoramente no estrangeiro, ao passo que a jovem revolução tomava todos os ares da revolução cubana, um pouco como acontecera havia cerca de 20 anos, em terras do amigo e aliado Fidel. A similitude era total, tínhamos em confronto os bons e os maus, a revolução e a contra-revolução, numa luta de vida ou morte entre o bem e o mal. É claro que para o novo regime aconteceu o melhor cenário possível, pois era de toda a conveniência dispensar estas pessoas contra-revolucionárias que seriam um estorvo ao projecto revolucionário do PAIGC. Este partido, em autêntico estado de graça, não tinha mais oposição em Cabo Verde, o povo entregou-lhe o poder total, um Cheque em Branco. E o país eufórico desembaraçava-se dos maus, os chamados inimigos, dos reaccionários, dos traidores e dos ‘catchores de dois pés’. Livrava-se, assim, daqueles que eram, conotados com o colonialismo português e logo, supostamente, os responsáveis por séculos de escravidão, pelo estado de miséria e de sub-desenvolvimento do país e do seu povo. O país mudava de mãos, substituía os seus maus pais e avós, por bons pais da revolução e da independência, homens com nova mensagem, uma nova visão do mundo, uma mensagem progressista da vida e do país, e uma experiência militar e política forjada nos matos da Guiné em Conacri, e nas ruas de Lisboa, Alger, Rabat, Moscovo, Habana e Paris. Abriam-se, assim, boas perspectivas para a “libertação” do país e a criação de uma sociedade sem classes, sem injustiças, sem exploração do homem pelo homem. Acreditava-se, assim, que estava garantido o desenvolvimento humano e material do país e mesmo a possibilidade da felicidade terrena ilimitada, sem mais delongas, aqui e agora. Até iria chover e as águas iam voltar a correr nos campos!!! Os lugares deixados vagos garantiriam durante décadas a fio emprego e tacho para toda a nova elite e para as pessoas que viriam a ser formadas pelo novo regime, através da oferta espectacular de todo o tipo de bolsas e formações disponibilizadas pelos países amigos e mais desenvolvidos. Só assim o poder poderia consolidar-se, fechando o ciclo revolucionário e entrando na senda do desenvolvimento.
Com os feitos ‘heróicos e históricos’ descritos, a ilha de S. Vicente entrava em plena efervescência juvenil, um misto de revolução cultural chinês e de revolução de Maio 68 francês, onde tudo era permitido, nada proibido, com ininterruptas e ruidosas festas e bailes populares: todos os valores que regiam a sociedade conservadora seriam postos em causa, varridos por uma juventude sedenta de liberdade e dos prazeres da vida mundana. Hoje, analisando os factos com novos olhos e perante a experiência acumulada dos 40 anos passados, sabe-se que a ilha estava a desferir sem dar por isso, o seu primeiro tiro no pé, transformara-se numa ilha perigosamente revolucionária, mesmo para os homens do PAIGC, que seriam o futuro novo poder. Mas o novo poder tomara todas as devidas precauções, para não acontecer o que acontecera aos seus inimigos: instalara-se longe dos rebuliços de Mindelo, calmamente e seguramente, na pacata cidade da Praia, a capital política do arquipélago onde residiam os governadores de cabo Verde colonial. O centro de gravidade de Cabo Verde estava a deslocar-se para o Sul, para a ilha de Santiago, e S. Vicente, já exangue em finais de 1974, iria perder continuamente recursos humanos para emigração e para o projecto centralista do novo poder, já que não havia projecto consistente para a ilha que desse continuidade ao que era antes, um centro intelectual e económico do país. A ilha, despovoada, privada da sua poderosa elite, que ela mesmo escorraçou, sem voz (a Rádio Barlavento foi substituída pela Rádio Voz de S. Vicente, uma nova rádio agora afecta exclusivamente ao novo regime, que acabaria por ser absorvida com todo o seu espólio na Rádio Nacional, ao mesmo tempo que não havia mais condições para a existência da Rádio Clube do Mindelo, que morreria assim de morte natural ou provocada), perderia paulatinamente e inexoravelmente o seu peso, a sua importância e a expressão social e política, num arquipélago em processo de nivelamento por baixo, ficando com a magra consolação da ‘capital da Cultura’ de um dia ou de uma ocasião polítca. Pois é, graças à revolução, de que foi o catalisador local, a ilha de S. Vicente nunca mais se levantaria, não obstante os diferentes processos de normalização e de democratização que mais tarde viriam a ter lugar em Cabo Verde e os avultados investimentos financeiros e económicos nele operados. Faltava-lhe a força anímica, sem a qual o progresso social não se realiza. 

Nota: O Grémio era um clube fechado, elitista, que reunia a poderosa e influente elite mindelense (que o povo chamava ‘gent grand’ ou ‘gent bronc’ ), constituída pela nata da sociedade de então, em geral pessoas próximas do regime anterior ao 25 de Abril, fortemente ligadas a Portugal, com um elevado estatuto social, económico ou profissional, incluindo pessoas do povo que simplesmente venceram na vida. O Grémio representava, assim, a elite em Cabo Verde, era uma amostra da elite colonial cabo-verdiana, constituída por quadros da terra, altos funcionários e profissionais liberais de sucesso, que quase sempre viveram em Cabo Verde. Eram portanto, na maioria cabo-verdianos descendentes das sucessivas vagas de europeus e/ou de judeus que povoaram Cabo Verde desde os tempos remotos da colonização, pelo que é um erro grosseiro associá-los a colonos. É o que muitos hoje em dia fazem por ignorância e desconhecimento da realidade e da história de Cabo Verde.

Janeiro de 2015
José Fortes Lopes

4 comentários:

  1. A história que há-de ser escrita com o maior rigor quando toda a poeira assentar, não poderá ignorar narrativas como esta que nos oferece o José Lopes. É que o autor deste escrito foi testemunha presencial e também interveniente directo nos acontecimentos que ora relata, e que certamente viveu com a paixão e a exaltação dos grandes momentos. Agora, o José Lopes olha para os mesmos acontecimentos com a lucidez de uma inteligência amadurecida e com o necessário repouso dos ânimos, e desta maneira o seu escopo dificilmente fugirá à verdade. Ora, o autor deste texto, em 1974, esteve no cerne dos acontecimentos e, portanto, dentro da História, mas seguramente não no lugar da História, pois isso só poderia ser avaliado por outro. Hoje, sim, reflectindo sobre os acontecimentos, estando simultaneamente perto e longe da sua ocorrência, está em condições de nos transportar para o lugar da História, como é o título cimeiro deste artigo.
    Lucien Lefebre classificou a História como o processo de mudança contínua das sociedades. Acontece que a ilha de S. Vicente tomou na altura a vanguarda social da mudança sem reparar que as pulsões do momento resultavam mais de uma explosão instantânea do que de um processo minimamente reflectido. E lixou-se porque o futuro encarregar-se-ia de o colocar fora da História com que ingenuamente sonhou. Mas como a mudança é um processo contínuo, vamos ver se a sociedade mindelense saberá recuperar as suas antigas pulsões cívicas para acertar o passo com um lado melhor da História.

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  2. Ensaio importante de um período conturbado vivido na inocência da infância de menin de Soncente, actualmente professor universitário em Portugal, depois de ter exercido funções similares em S. Vicente no ISECMAR e se ter qualificado em França, companheiro de luta recente. Viveu o período que bem descreve como jovem simpatizante do PAIGC, à semelhança de muitos outros jovens da época, vindo, no entanto, a contestar a justeza dessa luta nos aspectos oportunistas de muitos por medo, para ganhar um lugar na mesa da festa e por imaturidade política dos seus autores. S. Vicente tomou a dianteira nessa luta de emancipação e contribuiu decisivamente para a vitória do PAIGC. Só que, após essa vitória, o Partido virou-lhe as costas, preferindo instalar-se na Praia com armas e bagagens dada a passividade obediente dos praienses em contraste com o espírito rebelde e contestatário do mindelense.
    Com o tempo e a canalização de todos os recursos, ministérios e serviços para Praia, consequente atracção de muitos dos nossos cérebros e castração de qualquer veleidade de os nossos emigrantes investirem na sua ilha de origem (quando não Santiago), as outras ilhas ficaram ao Deus dará, e S. Vicente passou a viver de promessas jamais cumpridas e de projectos que, quando viáveis, iam para a Santiago. Resumindo, Soncente cabâ na nada, como se estivesse cumprindo pena de crime grave não cometido. O pouco que ficou foi-se degradando – escolas primárias e liceus, o movimento do Porto Grande praticamente nulo, desaparecimento dos cinemas, tanto do Miramar como do Eden Park, criaram-se pseudo universidades para chuchar com o mindelense, et j´en passe. O mindelense ficou num tal estado de desânimo que já nem sabe protestar e vai aceitando resignadamente todas as injustiças com fé numa recompensa divina depois da morte, sem um coice nem um grito de revolta. Homme crede! Parece incrive!, como dizia o nosso grande Djunga Fotógrafo.
    Quem já leu o livro do Dr. Teixeira de Sousa, Entre Duas Bandeiras, entende melhor este excelente ensaio do Doutor José Fortes da Silva, pois o colega viveu esse período como adulto e médico.
    Arsenio de Pina

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  3. Uma interessante reacção do Arsénio de Pina e de Adriano Miranda Lima ao meu artigo
    Arsénio de Pina mais do que qualquer um compreende a necessidade e da oportunidade deste meu artigo numa altura em que festejamos 40 anos de eventos extraordinários acontecidos em Cabo Verde. Mais do que nunca necessitamos de pessoas como ele e outros que analisam as causas da grave crise moral e social que atravessa CV, após o marasmo económico de décadas a fio a que se encontra a ilha de SVicente, a ilha do Porto Grande, situação que derivado de mais de 60 anos de ausência de perspectivas ou alternativas. Acresce que somos os grandes perdedores da nossa própria independência que provocou o colapso total, a estocada final da economia da nossa ilha.
    Ele que faz parte também do Movimento da Regionalização no seio do qual temos vindo a reflectir sobre soluções passíveis de ultrapassar os estrangulamentos diversos, políticos, sociais e económicos que atravessa a ilha e CV, através da libertação das energias
    Estou precisamente a ler o o livro do Dr. Teixeira de Sousa Entre Duas Bandeiras, emprestado pelo Dr Arsénio de Pina um livro que descreve um momento da História de CV que fiz parte como autor embora muito jovem. É com muita emoção e tristeza que o faço, pois é o retrato do outro lado da realidade, aquela que não descortinávamos, todos embriagados que estávamos pelo ambiente festivo e indiferentes ou surdos às outras opiniões e sobretudo ignorante do que se tramava, pois não estávamos humanamente formados para isso, estando a sair de uma longa noite de silêncio totalitário do regime do Estado Novo.
    Este é um livro que aconselho a todos de ler, e é incrível que só soube dele recentemente,meses. Este deve ser de de certeza um livro vítima de todas as censuras, pois trata-se de um retrato do período pós 25 de Abril em CV muito politicamente incorrecto, mas autêntico verdadeiro, real.
    Como é óbvio ao escrever este artigo falando da fuga da Elite Cabo-verdiana estava a pensar em Homens como o Dr Teixeira de Sousa, uma das pessoas incluídas no lote daquelas obrigado a fugir da sua terra, para se pôr a salvo, e que Cabo Verde perdeu num período crucial da sua história. Não para sempre pois Teixeira de Sousa está vivo no meio de nós. por aquilo legou para a posteridade. Que a terra lhe seja leve.

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  4. Onde se lê
    Dr Arsénio de Pina um livro que descreve um momento da História de CV que fiz parte como autor
    Deve-se ler
    Dr Arsénio de Pina um livro que descreve um momento da História de CV que fiz parte como actor, embora muito jovem, sem nunca ter participado em algum desacato, que sempre condenei

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