CLUSTER DOI MAR - INVESTIMENTO BORDA FORA
(Expresso das Ilhas)
A criação e desenvolvimento do Cluster do Mar tem sido uma das bandeiras do governo de José Maria Neves. Mas o processo tem sido lento e recheado de casos de iniciativas privadas que nunca chegaram a sair do papel.
O caso Africa Pescas é apenas o último episódio da novela Cluster do Mar.
A empresa África Pesca desistiu de um investimento de 8,6 milhões de dólares no sector das pescas em Cabo Verde, por alegada “má vontade de certas instituições do Estado”, conforme referiu o sócio cabo-verdiano, Paulo Abu-Raya, em conferência de imprensa realizada na segunda-feira no Mindelo.
A empresa África Pesca tinha o suporte financeiro do investidor norte-americano Carlos Rafael, tido como o maior armador dos Estados Unidos, e proprietário da empresa C&R Fishing LLC, que tencionava investir, numa primeira fase, 8,6 milhões de dólares (cerca de 770 mil contos) no sector das pescas em Cabo Verde.
Na mesma conferência de imprensa foi anunciada a “retirada definitiva” do projecto e o sócio-gerente Paulo Abu-Raya considerou que o investimento encontrou “forte resistência” do Instituto do Desenvolvimento das Pescas (INDP) e da Direcção-Geral das Pescas, e, paradoxalmente, “elogios” da ministra do Turismo, Investimento e Desenvolvimento Empresarial, Leonesa Fortes.
É que, conforme apontou aquele responsável, o navio Voyager, uma embarcação de arrasto de meia-água, encontra-se em São Vicente há 71 dias com inspecções de navegabilidade, segurança e sanitária concluídas e validadas, registo na Agência Marítima Portuária (AMP) e com licença de pesca para pequenos pelágicos por seis meses, emitida pela Direcção-Geral das Pescas (DGP), “mas sem conseguir pescar”.
Segundo Paulo Abu-Raya, as autoridades cabo-verdianas introduziram novas condições “a meio do jogo”, nomeadamente que a embarcação só poderia pescar melva (catchorrinha) e não as outras espécies de pequenos pelágicos como a cavala preta, o olho largo e a sardinha, uma quota de captura máxima para a embarcação fora das 12 milhas, e aprovação dos planos de pesca, trabalho e investigação.
Por outro lado, em números, a mesma fonte explicou que o projecto da África Pesca iria proceder ao desembarque de 100 por cento da matéria-prima em Cabo Verde, vendida na totalidade à Frescomar, e que iria ainda distribuir o produto da conserveira cabo-verdiana em 2.700 supermercados do Canadá e em 10.000 supermercados dos EUA.
Num desabafo, e quando perguntado em que condições poderia aceitar repensar o seu projecto, o armador norte-americano foi taxativo: “O PAICV [partido no poder] terá que ir à vida”, concluiu.
Nada contra, diz a DG Recursos Marinhos
A Direcção Geral dos Recursos Marinhos nunca foi contra a implementação do projecto de investimento da empresa África Pesca no domínio das pescas em Cabo Verde, disse na segunda-feira, na Cidade da Praia, o responsável da instituição.
Em conferência de imprensa para informar sobre as circunstâncias em que a empresa foi autorizada a investir em Cabo Verde, Juvino Vieira reafirma que “contrariamente à acusação feita pela África Pesca”, à empresa foi atribuída uma “licença experimental, apenas para pesca de melva, na Zona Económica Exclusiva e não comercial”, condição previamente acordada.
Sobre a apanha de cavala, que a empresa diz ter por seis meses, emitida pela Direcção-geral das Pescas, Juvino Vieira disse que a África Pesca não foi autorizada pelo facto do “estado actual de exploração desta espécie ser preocupante” em Cabo Verde.
Cluster do Mar
Como já foi dito atrás, o cluster do mar tem sido, ao longo dos anos, uma das grandes bandeiras do executivo liderado por José Maria Neves. E São Vicente foi escolhido como o seu centro principal. De tal forma que em Fevereiro de 2013 o Governo realizou na ilha do Monte Cara um Conselho de Ministros Especializado em assuntos económicos, inovação e competitividade.
Presidida pelo primeiro-ministro, José Maria Neves, a reunião, que decorreu na sede do Instituto Nacional de Desenvolvimento das Pescas (INDP), teve no centro da agenda o cluster do mar e a discussão do Documento Estratégico de Crescimento e Redução da Pobreza, 2012 – 2016.
Island Seafood
Na mesma altura da realização deste Conselho de Ministros Especializado era assinado o contrato de concessão do terreno para a implantação de um projecto na área da indústria transformadora de pescado, denominado Island Seafood, o qual iria construir uma fábrica e criar cerca de 400 postos de trabalho e dar 10 por cento do seu lucro futuro para o crescimento social de São Vicente, a partir de 2016.
O impacto social deste investimento prometia ser grande. Fazendo fé nas palavras de Geir Eriksen seriam “empregadas cerca de 358 pessoas”, que iriam ter “um salário mensal de 25 mil escudos, com a possibilidade de terem um bónus de dez mil escudos, dependendo do seu empenho e comportamento”.
O projecto representaria, segundo garantiu Eriksen numa entrevista à Rádio Morabeza, um investimento total na ordem dos 70 milhões de euros (cerca de 7 milhões de contos) com a fábrica a estar operacional em finais de 2014 e a ter uma capacidade estimada de transformação de 260 toneladas de peixe por ano.
O projecto, ainda que ambicioso, acabou por nunca sair do papel.
Franklim Spencer, presidente do Núcleo Operacional do Cluster do Mar, confirmou essa informação ao Expresso das Ilhas. “O Island Seafood caiu”, disse Franklim Spencer em conversa telefónica.
“Os accionistas tiveram problemas em mobilizar financiamento”, explicou Franklim Spencer que, de seguida, acrescentou que, pelos documentos a que teve acesso no início do projecto, “eles tinham financiamento de fundos noruegueses”, depois os promotores “estiveram em negociações com o Banco Africano de Desenvolvimento” sem que estas tivessem, no entanto, chegado a bom porto.
Os problemas agravaram-se entretanto, conforme contou Franklim Spencer ao Expresso das Ilhas, com os sócios a “terem conflitos entre eles”.
Eleito como bandeira do Governo, que com este projecto quis demonstrar a vitalidade do Cluster do Mar, o projecto Island Seafood “nunca teve qualquer investimento por parte das entidades públicas nacionais”, garantiu Spencer.
Esta é uma matéria em que tenho dificuldade em opinar por não conhecer os detalhes e os verdadeiros contornos do processo. É que não se pode esquecer de situações fraudulentas que aconteceram com alguns investimentos no passado. Pena é constatar que nada vinga em S. Vicente.
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