Naturais do Concelho de Soure, Distrito de Coimbra, os irmãos Amadeu e Celso eram oriundos de uma família de gente humilde que afanosamente trabalhava, ano após ano, a terra madrasta…Em busca de melhores perspectivas de vida, resolveram um dia, por meados da década de 30 do século passado, ir de abalada para Leiria onde o Amadeu, 11 anos mais velho do que o irmão, se estabeleceu com uma pequena papelaria a que chamou “Casa do Leão”…
Entretanto, Mariazinha, esposa do Amadeu, que era professora no único Liceu existente em Leiria na altura, recebeu uma oferta para ir trabalhar para S.Vicente de Cabo Verde, como docente do Liceu Gil Eanes, com a promessa de uma vinculação à função pública…Consumada a transferência, cedo se lhe juntou, no Mindelo, o marido, que se fez acompanhar dos irmãos Celso e Irene, que estimava profundamente. Corria o ano de 1940…
Empreendedor nato, Amadeu não hesitou muito e, pouco depois, abria as portas, na Pracinha da Igreja, a segunda “Casa do Leão” que, desde logo, se revelou um êxito assinalável. O fundador, homem perspicaz, via no irmão as qualidades que, efectivamente, acabou por vir a revelar ao longo da sua vida e, logo que o Celso atingiu a maioridade, fê-lo seu seu sócio paritário…
Infelizmente, a professora Mariazinha viria a falecer no Porto, para onde viajara em tratamento de grave enfermidade…Tinha sido acompanhada pela jóvem Irene que ali acabou por terminar os estudos liceais e formar-se em medicina.
A natural melancolia decorrente da perda de um ente querido que, ainda por cima, tinha sido a grande responsável pela ida dos irmão Leão para S.Vicente, não lhes arrefeceu o ânimo empreendedor e foi iniciado um período de enorme desenvolvimento, para logo, com a mudança da Casa do Leão para instalações novas na Rua de Lisboa, enquanto davam corpo a outros empreendimentos com outros parceiros… Estes, antigos militares portugueses que, uma vez passados à reserva tinham decidido ficar e reorganizar as suas vidas em Cabo Verde, associaram-se aos irmãos Leão e deram origem à firma Nunes Leão & Cia., Lda. que era proprietária da Drogaria do Leão (S,Vicente), Farmácia do Leão (S.Vicente e Praia) e Adega do Leão (S.Vicente e Praia). Cremos ser justo destacar que, nas duas primeiras os irmãos Leão tinham como sócio o Armando Mões Joaquim e na outra, António Moreira de Almeida Pinto.
Entretanto, Amadeu havia contraído segundo matrimónio com D. Aida e o Celso, já em 1948, com a D. Livia Feijóo, de uma ilustre família com raízes na Ilha Brava…Infelizmente, em 1955 e de forma de todo em todo inesperada, Amadeu Leão faleceu, na sua residência da Pracinha da Igreja, ao lado da Escola Camões e pode-se afirmar que a sua morte foi sentida como se de um filho da terra se tratasse.
O facto, no entanto, não esmoreceu o vigor dos empreendimentos daquilo a que se podia chamar Organizações Leão, com o alargamento das actividades à importação e intervenção industrial em madeiras vulgares e exóticas, na empresa Simal-Sociade Industral de Madeiras, Lda., à industria de panificação, com a aquisição da Fábrica Sport, à construção civil com a edificação de imóveis no Mindelo e na Praia e, inclusivamente, à exploração de uma Loja Franca, no Aeroporto Internacional do Sal.
Celso Leão e a esposa, infelizmente, já ambos faleceram, entretanto. Mas, os seus descendentes, bem como o de Amadeu Leão, bem podem olhar sem receio para o passado e orgulhar-se do que os seus pais construíram ao longo de profícuos cerca de 40 anos…As Organizações Leão, durante largo tempo, devem ter sido, depois do Estado, o maior empregador de Cabo Verde, com uma politica de relacionamento laboral de mútuo respeito, retribuições justas e protecção social adequada…Um exemplo de que, pessoalmente, não conhecemos muitos seguidores!
Agradecemos a colaboração de
John Leão e A. Mendes
Sempre os consideramos e eles a nós como família... Não tenho qualquer dúvida, que meu pai , nascido na mesma aldeia e amigos de infância, ficou também em S. Vicente devido a essa inseparável amizade. Todos os meus Irmãos (e eu em parte) trabalharam nas diversas empresas da Sociedade Nunes Leão & Cª Lda... Saúdo os seus descendentes com muita amizade .
ResponderEliminarMantenha pâ tude Leão.
Esta crónica é muito importante e sem rebuço digo que é uma peça da história da ilha de S. Vicente.
ResponderEliminarOs Leão foram efectivamente gente empreendedora e dinâmica e muito dedicada à nossa ilha e às suas gentes. Irradiavam simpatia e introduziram no comércio local um "savoir faire" que antes não existia, tal a atenção e o trato que dispensavam ao cliente.
Estava eu na 2ª classe e na Escola Camões, quando morreu o Amadeu Leão, o irmão mais velho. O corpo estava amortalhado em casa, e, dada a vizinhança com a escola, entrei para o ver assim como outros coleguinhas da escola. Fixei os olhos nos sapatos do defunto, que eram pretos e de verniz. Nunca esqueci esse pormenor. Embora criancinha, apercebi-me de que a morte dele causou consternação geral.
Conheço bem o Luís Leão, o filho mais velho do Celso, e encontro-o quase sempre quando vou a Cabo Verde porque é amigo de peito de um primo direito meu, em casa de quem ele é presença assídua. Também conheço a filha Liza, que, tal como eu, é tomarense adoptiva, vivendo relativamente perto de mim.
Quando, por acaso, se cruzar com a Liza, de-lhe um beijo do Zito, pai da Ana Paula, de quem ela é madrinha...
EliminarUma linda cronica para a historia da cidade do Mindelo de que os irmaos Leão foram agentes activos da vida economica e cultural. Conheci melhor o Sr. Celso Leão, humano e solidario e por isso o seu nome ficou ligado à historia de CAbo Verde. Com o encerramento da Casa leão é mais uma pagina da vida economica e cultural que se apaga. Ele bem merece que o seu nome fique gravado numa rua da cidade. Não o fazer seria por desconhecimento da historia do Mindelo...Deus nos oiça.......;;;
ResponderEliminarRectifico a minha afirmação de que eu estava na 2ª classe da instrução primária quando faleceu o Raimundo Leão. Fiz confusão com a data. Tinha 11 anos e estava na admissão e o trajecto para a respectiva aula passava pela rua da escola Camões, que eu de facto frequentei até à 2ª classe.
ResponderEliminarDeu-me para lapsos. Quis no último comentário escrever Amadeu e saiu Raimundo.
ResponderEliminarO que poderei fazer além de agradecer comovidamente a simpática iniciativa do Artur Mendes e do Zito Azevedo? E de acrescentar que os comentários dos leitores e/ou colaboradores do blogue, que acabo de ler, também representam um enorme conforto?
ResponderEliminarUm abraço.
John
Afinal, venho adicionar um comentário para responder a Luiz Silva, que sugeriu amavelmente que fosse atribuída a uma artéria da cidade do Mindelo o nome do meu pai. Essa artéria existe. Trata-se de uma rua próxima da parte da frente do Hospital Baptista de Sousa e das traseiras da Escola Salesiana. A placa com o nome do meu pai está lá há mais de 10 anos, por iniciativa da Câmara Municipal de São Vicente, liderada por Onésimo Silveira. O proponente foi o Dr. João Brito, mindelense, advogado, falecido na força da vida, que era então vereador ou deputado municipal - não posso, de momento, precisar -, e que muito jovem, antes de prosseguir estudos universitários em Lisboa, tinha trabalhado na Fábrica Sport, designação que o meu pai conferiu à unidade de produção de bolacha e de pão que adquiriu ao Sr. Jonas Whanon e esposa, em 1964.
ResponderEliminarTio John, sendo este mundo muito pequeno, sou por mero acaso amiga da sobrinha-neta (?) do Sr. Jonas Whanon, viemos a saber desta ligação Whanon - Leão já depois de nos conhecermos em Lisboa.
EliminarJulgo que seria mais que justo mencionar algo que talvez esteja esquecido ou não seja do conhecimento público e que aprendi quando estava a organizar o capítulo Nôs Terra, Nôs gente com o Tó Faria. O Sr. Celso Leão emprestou dinheiro muitas vezes a quem queria emigrar em buscar de uma vida melhor. Emprestava sem juros e anotava num papel o nome e a quantia, esperando que um dia o empréstimo fosse reembolsado. Às vezes demorava anos mas creio que quase todos estes empréstimos foram liquidados logo que foi possível. É de um mérito e generosidade que não devem ficar esquecidos. O Sr. Celso Leão não tinha de o fazer, mas era amigo do "seu povo" e da "sua terra". Por circunstãncias que podem adivinhar, faleceu em Lisboa mas foi seu desejo regressar à terra e ser transladado para S. Vicente. Sem dúvida, ficou...
ResponderEliminarA única razão porque publico o comentário como anómino" é porque não me lembro da minha password no google :). In Cabo Verde, Terra de Morabeza, página 263. Suzana Abreu
Creio ter chegado o momento de dizer alguma coisa, face aos ecos despertados pela minha despretenciosa crónica...Conheci a Organização por dentro pois trabalhei durante 15 anos na Drogaria do Leão, fiz alguns trabalhos de contabilidade na Adega de S.Vicente e, todos os anos, ía à Praia representar o patrão ("!) Celso, no Inventário e Balanço da Adega do Leão local.
ResponderEliminarQuando, em 1977 tive que abandonar Cabo Verde, já em Lisboa o mesmo Senhor se ofereceu para me emprestar uma soma importante em dinheiro para eu recomeçar a minha vida numa qualquer actividade...E que não me preocupasse, nem com juros nem com prazos de reembolso!...Declinei a generosa oferta pois, graças a Deus, já tinha garantido o emprego em que, práticamente me mantenho até hoje, quase 40 anos volvidos...Dou publico conhecimento deste facto como reforço do imenso humanismo e espírito de solidariedade de Celso Leão, como descritos pela Exmª Anónima, Suzana Abreu...
Obrigado a todos os que acudiram à chamada!
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ResponderEliminarNão podia ficar sem comentar quando se trata de um dos meus "Role Models". Um ser humano de qualidades impar, amigo dos amigos um homem com "H" grande.
ResponderEliminarQuando, apos o 25 de Abril o meu falecido pai, teve que sair de Cabo Verde a caminho de Lisboa, e meses depois da nossa chegada, foi precionado a regressar a Cabo Verde, o BNU passou a fazer os pagamentos do seu salario na dependência de S. Vicente, entretanto fez-se uma lei que não permitia a transferencia desses fundos para Portugal, foi nessa altura que o Sr. Celso passou a dar o dinheiro ao meu pai em Lisboa e este dava-lhe cheques pre-datados que ele cobrava em S.Vicente. Houve também uma altura em que o meu pai teve que alugar uma casa num local perto da Costa de Caparica (Lazarim) e o Sr. Celso tinha vindo de S. Vicente, vai o visitar, este tinha decidido viver nesta pequena aldeia onde na altura nem as rua eram asfaltadas, apesar de que a casa que alugou era bastante boa pois pertencia a um emigrante em Franca, E Sr. Celso com lagrimas nos olhos e indignado diz-lhe: "Oh Chibete eu não te posso ver aqui, tens que mudar-te de aqui para fora". Isto acontece num sábado e no domingo depois do almoço aparece outra vez o Sr. Celso desta vez com a chave de um apartamento na Costa de Caparica que pertencia a uma tia da prima Lívia. E diz: " Vais mudar para Costa e ficas la ate resolveres a tua situacao, pagas uma renda nominal" vi o meu pai comovido, dar-lhe um grande abraco e a expressar-lhe toda gratidão e amizade que lhe tinha.
O meu pai teve vários carros e todos foram comprados ao Sr. Celso e pagos a prestacoes.
Quando ficou doente e teve que vir a Boston fazer tratamento, acompanhei o meu pai varias vezes para o visitar no hospital, em 1980 levei para Lisboa, uma algaria para ele, nessa altura não o pude ver porque estava praticamente nas ultimas. A morte dele afectou muito ao meu pai, como se tivesse perdido um irmão.
Tenho um grande apreço e amizade aos meus primos e amigos: Fatu, Leninha, Luiz, John, Ze-Rui e Liza, para quem estarei sempre à disposição para o que precisarem. Um abraco , To' Faria
Desejo sinalizar aqui a visita de um Faria, neto de Nhô Chente com quem aprendi contabilidade, filho de Chibete, um bancário apaixonado pela radiotelevisão, sobrinho de Vicente, meu amigo de sempre e cuja morte enlutou meu coração e que, há décadas, me vendeu uns sapatos de pele de porco que nunca mais acabam, que já não uso, mas de que não me desfaço...Talvez os leve calçados para a cova!
EliminarBem vindo Tó, apareça sempre!
Associo-me à homenagem à frateria Leão que conheci logo assim que chegaam a S.Vicente e, sinceramente, esperava por esta homenagem com o mesmo empenho que venho tendo na defesa de outros Cidadãos que tanto fizeram para a nossa ilha, para a nossa gente.
ResponderEliminarSempre admirei o amor que tiveram à terra onde puderam empreender e onde se sentiam filhos porque eram respeitadores e generosos, cativando até crianças.
Infelizmente só depois da morte do meu Pai (parceiro da Livia no golfe) e numa passagem com a minha irmã (a mais nova) soubemos de um "caso" que ficou por arranjar localmente - repito, localmente - que tentamos resolver de imediato mas o nosso pedido de encontro com um dos filhos de Celso não aconteceu. Ficamos pesarosos (eu com maior razão) mas isso não nos impede (a Edna e eu) de nos associar a esta meressidissima homenagem.
Pela primeira vez, desde a minha saída (60 anos no proximo mês de Agosto), soube que o nome Leão figura na toponímia do Mindelo cujo Município não tem sido justo. Razão para se ver quão eram apreciados e merecedores de tal honra.
Avé !!!
Para que fique registado:
ResponderEliminarA Aldeia onde os Leões e o meu pai nasceram chama-se : DEGRACIAS... Concelho de Soure -- Distrito de Coimbra ( 39 Km) ... Na altura em que o destino os levou a abandonar a a paupérrima terra, não havia estrada... alcançava-se de burro ou a pé... Isto na década de 50.
Muito mais tarde, quando o Sr Amadeu visitou a sua aldeia... conduzindo um Citroen... houve foguetório e festa rija,,, Para muitas crianças foi a primeira vez que viram um carro... Tenho fotos de desse imemorável acontecimento.... Por coincidência a família Mendes estava lá!
A reacção que este post despertou (para mais, em pessoas que aqui se estrearam) é a melhor prova do sentimento de amizade e gratidão que o povo do Mindelo nutria pela família Leão. Isto demonstra que um empreendimento económico não tem de regular-se apenas pelas regras estritas da contabilidade aritmética. O rosto humano que lhe foi emprestado pela família Leão foi um acréscimo de valor que mais do que nenhum outro talvez explique o sucesso comercial alcançado. O capitalismo malvado que por aí anda tem muito a aprender de pessoas como estas. Diria que Cabo Verde, e principalmente a nossa querida ilha de S. Vicente, precisa de empreendedores da estirpe Leão. Diz-se que não há pessoas insubstituíveis mas umas há que são mais difíceis de substituir do que outras.
ResponderEliminarNão conheci o senhor Amadeu senão no dia em que o vi amortalhado, aos meus 11 anos. Mas o senhor Celso conheci-o muitíssimo bem e dele guardarei para sempre a sua imagem de homem dinâmico, simpático e generoso.
Zito, irei bater à porta da Liza para, com muito gosto, lhe transmitir as suas mantenhas. A última vez que lá fui foi para levantar um frasco de doce de papaia de que alguém foi portador para mim.
Também eu não podia deixar de divulgar a admiração pela grande amizade que existia entre o Casal Celso Lívia e minha mulher e eu. Quando se proporcionou o meu casamento com a Isabel Mendes, na altura empregada na Farmácia do Leão, D. Lívia foi perentória ao afirmar que esse casamento só se realizaria(?) se a festa fosse em casa dela. Claro que foi assim mesmo. D. Lívia alem de dar a casa dela deu todo o seu saber na feitura de toda a doçaria. Aquela Senhora tinha umas mãos de ouro para a feitura de toda a espécie de doçaria artística. Já lá vão 54 anos e alguns meses pois decorria o dia 23 de Abril de 1960...
ResponderEliminarRetifico o meu último comentário:
ResponderEliminarEfectivamente, trata-se da década de 40.
Saudações.
Não resisto a contar-vos que o que mais me fascina nas pessoas, ou melhor, uma das coisas que mais me fascina nas pessoas é a memória, a respectiva memória e a capacidade de contar estórias ou histórias, como quiserem. E o Tuta Azevedo teve a grande virtude de despertar a minha memória para um episódio de que eu não me recordava: a festa do casamento dele e da Isabel, em casa dos meus pais na Rua de Lisboa. 23 de Abril de 1960, diz o Tuta. Eu tinha 5 anos, em Abril de 1960, mas o Tuta fez-me recordar uma cena animadíssima, então, para um puto da minha idade. A azáfama do transporte das mesas para a boda, da rua para a varanda e para as salas em que o banquete teve lugar, no 1º andar. As mesas foram içadas por homens com cordas, numa acção que, então, me parecia ter algum risco e um enorme encanto. E eu estava na varanda a assistir à operação. Visualizei novamente em detalhe, a cores e tudo, essa cena. Como se tivesse voltado a esse momento e adoro este tipo de sensação. Obrigado.
ResponderEliminarEmbora com um mês de atraso, venho responder à Marta. Às vezes é pequeno o mundo, como neste caso em que conheceste e fizeste amizade com uma sobrinha neta de Jonas Whanon, sem que provavelmente vocês adivinhassem que ambas tinham ligações com Cabo Verde. Também conheço alguns dos descendentes do Sr. Jonas e dá-se ainda o caso da esposa dele ser (ter sido) prima da minha avó, qualquer uma delas natural da ilha Brava.
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