Sempre se disse que as esquerdas têm um problema com o dinheiro. A começar pelo facto de não o terem. É natural. Tivessem dinheiro e talvez não fossem esquerdas. Com algumas excepções, as pessoas de esquerda não têm muito. Por isso, quando estão no governo, têm uma atitude ligeira com o dinheiro dos outros. Querem promover a educação, a saúde, a segurança social e as obras públicas, o que é excelente, só que para isso, que custa tão caro, faz falta o dinheiro. Mas, convencida de que a direita tirou aos pobres para dar aos ricos, a esquerda também quer reverter e devolver aos pobres... No entanto, dar é uma coisa. Crescer e distribuir é outra, bem diferente e mais difícil. Mas a verdade é que uma e outra, esquerda e direita, desde 2000, não conseguem investir nem crescer.
Nos bons tempos, gasta-se o que se tem. Nos anos difíceis, gasta-se o que não se tem. Depois, é necessário encontrar dinheiro. As soluções: fazê-lo, pedi-lo emprestado ou ir buscá-lo onde ele está. Portugal está a viver um período desses, dos maus. Só que não se pode fazer dinheiro, o Banco de Portugal e a Casa da Moeda já não servem para isso. Pedir emprestado, é o que se vai fazendo, mas está cada vez mais caro. E quem tem dinheiro ficou exigente: ou não empresta ou impõe condições proibitivas. O que se deve é tanto que só os juros levam os recursos para investimento. Foi aliás por causa de se ter pedido a mais que chegámos onde estamos.
Sobra, portanto, a última hipótese. Ir buscá-lo onde ele está. Em primeiro lugar, entre os capitalistas do mundo inteiro, para investir. Seria o ideal. Só que Portugal não oferece hoje, nem sequer nos últimos anos, boas condições. Não sabe criar incentivos nem atrair investimento. Se não há capitalistas lá fora, é preciso ir ter com os de cá de dentro. E levá-los a investir. Só que... Já não há! Ou quase não há! O capitalismo português acabou. Sobravam uns banqueiros, umas empresas e umas famílias: faliram, estão depenados, levaram o seu dinheiro para outros países ou não têm confiança no regime e no governo. O dinheiro dos bancos já não existe ou está preso pelo BCE. Os bancos já não têm que chegue e precisam dos contribuintes!
Há, evidentemente, o dinheiro dos turistas, mas não é suficiente. Há o dos emigrantes: é bom, apesar de já não ser o que era, mas também não chega para as encomendas. Há finalmente os dinheiros europeus, os famosos "fundos". Esses são excelentes, essenciais há mais de trinta anos, mas o montante já não é o que era. Além disso, estão sob controlo europeu cada vez mais apertado e presos na tenaz burocrática portuguesa. E também em risco de suspensão, dado o mau comportamento financeiro do governo e do país. Os fundos já não são a solução!
Se o que havia fugiu e se não se atrai o que está lá fora, só resta mesmo ir à receita miraculosa dos comunistas, do Bloco e dos socialistas mais nervosos: ir buscá-lo onde está! É há anos a receita infalível. Os dirigentes políticos dos novos aliados do PS sempre o disseram. Ir buscá-lo onde? Aos ricos. Às contas bancárias. Às empresas. Às casas.
O problema é que não há ricos. Ou antes, não há ricos que cheguem. Os que tinham dinheiro já o puseram a recato. E o dinheiro já não chega. Por conseguinte, vamos aos que se seguem, todos os que têm alguma coisa. Passam a ser todos ricos. Por exemplo, para já, aos que têm património de mais de 500 mil euros... Faz-se uma lei sem saber quantas pessoas, quantas casas, qual o rendimento... Não se faz a mínima ideia, o governo não define o que é um rico nem um pobre. É quem convém. E se não chega, arranjar-se-á mais, com os impostos indirectos, antes de se passar aos directos. E a tudo o que vive. Tudo o que tem ou ganha qualquer coisa. Até se chegar aos remediados. Até deixar de haver ricos. Mesmo que então já só haja pobres..
(Pesquisa de Tuta Azevedo)
O António Barreto há muito nos habituou a estes discursos superficiais, simplistas, fazendo lembrar parábolas. Gostaria de saber se ele considera de “esquerda” os governos sociais-democratas dos países nórdicos. Nesses países, a distribuição da riqueza obedece a princípios de verdadeira justiça social. Aí os executivos são também exemplares na governação da coisa pública, e fugir às responsabilidades cívicas é difícil quer para o governante quer para o cidadão. Creio que até hoje é onde o ideal de esquerda encontrou uma verdadeira realização. E é em democracia, respeitando as liberdades e tendo os direitos humanos como um valor sagrado. Aí há dinheiro e ele é socialmente bem distribuído, pelo menos segundo padrões sem paralelo noutras paragens do planeta.
ResponderEliminarQuanto ao dinheiro, ele hoje vive misteriosamente num limbo que é difícil de definir. As tecnologias de produção criam riqueza de uma forma sem precedentes e no entanto o dinheiro “não existe”.
O problema não tem a ver com a dicotomia esquerda/direita mas sim com uma degradação de valores morais como nunca se viu antes. Tem a ver com o capitalismo de casino mais descarado e sofisticado do que nunca, com a existência de bancos como o Goldman Sacks, com paraísos fiscais e com outros interesses obscuros planetários que não têm como objectivo o bem da humanidade, não se importando com o envilecimento da condição humana.
O António Barreto devia ter metido um pouco mais a mão na massa para nos dizer se a falta de dinheiro ou o seu desvio para as tais zonas escusas, subtraindo-o da fruição das comunidades humanas, é por culpa da esquerda ou da direita.
Por isso, acho censurável este seu discurso porque foge ao âmago dos problemas e, uma vez mais, denuncia o preconceito ideológico que há muito o domina e condiciona o seu raciocínio.