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segunda-feira, 4 de junho de 2012

ERA UMA VEZ, ANGOLA...


Corria o ano de 1956 - tinha eu 22 anos - e estava a bordo do paquete Império em viagem entre Lisboa e Luanda, no mês de Dezembro...Não deixa de ser motivo de alguma graça, lembrar como, à medida que se descia em direcção ao Equador, todos os dias se vestia uma peça de roupa a menos à medida que a  aproximação dos trópicos ia  aliviando o frio do Inverno europeu: era uma espécie de "streap-tease" colectivo em que, mais do que tudo, era espectacular assistir ao progressivo descascamento de uma dose bem razoável de bonitas mulheres e moças cheias de pressa para se mostrarem com o mínimo peso possível de roupa...À parte isto e a boa mesa, várias vezes ao dia, havia jogos de convés, o baptismo à passagem pelo Equador, com direito a diploma e tudo, uns pés de dança depois do jantar e os inevitáveis "flirts", a maioria do quais eram esquecidos no dia da chegada ao destino...Enfim, era o que se poderia esperar da vida em semi clausura, olhando para o mesmo horizonte deserto dia após dia, vendo as mesmas caras, murmurando os mesmos cumprimentos, seguindo as mesmas rotinas...Tinha uma vantagem sobre a vida em terra é que, durante a viagem, a gente nem se lembra da  importância do dinheiro pois, quando embarcamos, já está tudo pago...Até dá a sensação de estarmos a comer e a beber de borla o que, no meu caso e no de outros sete companheiros mindelenses, até era verdade pois éramos, todos,  Aspirantes do Quadro Administrativo Privativo de Angola e o Ministério do Ultramar é que custeava as nossas passagens...
Foi cerca de uma dúzia de dias de "dolce fare niente" que muitas saudades nos deixou, logo no dia do desembarque em Luanda, pois a canalização celeste parecia ter apodrecido e vazava água, torrencialmente, como se estivéssemos debaixo das Cataratas do Niagara...O calor era tão sufocante que era preciso respirar com o dobro da velocidade habitual e dava vontade de despir tudo, pele inclusive...Lá do alto, por entre o ribombar dos trovões parecia ouvir-se a voz de S.Pedro dando-nos as boas-vindas por entre umas risadinhas de pura gozação...
Continua...

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