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segunda-feira, 18 de maio de 2015

[8161] - PATRIOTAS E PATRIOTEIROS...

Amadeu Olive
O primeiro ponto da agenda de hoje seria ir à procura, pessoal e fisicamente, do Doutor Corsino Tolentino a fim de lhe agradecer o feito de ter sido distinguido pela Universidade de Minnesota, Estados Unidos da América, pela sua carreia profissional e pelos serviços prestados às causas da educação e desenvolvimento cívico, cultural e económico de Cabo Verde. Com efeito, trata-se de uma distinção que deve orgulhar a todos os Cabo-Verdianos. Bem hajam os homens de boa vontade que ao longo da sua carreira profissional conseguiram manter uma coerência absoluta entre o pensamento e a acção, esforçando-se para adquirir conhecimento e sabedoria para depois partilhar com os demais, com generosidade, abrindo caminho para a luz, combatendo as trevas da ignorância e servindo de fonte para outros se inspirarem. Essa tem sido a missão do nosso Tolentino por todo o sítio onde tem passado, desde os tempos da luta política para a independência da Guiné e Cabo Verde, passando pelo Ministério da Educação, Cultura e Desportos, pelos cargos de Embaixador e Diplomata de carreira, pela Administração da Fundação Gulbenkian, pela instalação da primeira Universidade Pública em Cabo Verde, pela criação do Instituto da África Ocidental, pelos programas de rádio e de televisão que tem mantido, enfim...., não se deve elogiar em demasia um homem enquanto ele ainda está vivo, pois nunca se sabe o que o futuro nos poderá reservar, porém, no caso particular do nosso Tolentino, estou em crer que ele é digno e merecedor dessa e de muitas outras distinções.

Quando o encontrei, depois dos cumprimentos, à laia de aconselhamento, o mesmo deixou claro que o importante é ser-se digno e merecedor de reconhecimento, que os louvores em si, se vierem, serão bem-vindos, mas o importante é cada pessoa fazer a sua parte com diligência e zelo, sem se preocupar com os reconhecimentos que podem vir ou não. Escutei e registei.

Entretanto, logo de seguida, ele encaminhou-me para uma esplanada discreta, para comentarmos alguns temas da actualidade nacional, desta feita para trocarmos impressões sobre o último “incidente diplomático” havido entre o nosso Governo e a Embaixada da União Europeia em Cabo Verde. Ou seja, em vez de celebrarmos o prémio que lhe fora atribuído, a sua preocupação estava voltada para questões nacionais e os eventuais efeitos prejudiciais que as desinteligências deste Governo poderão ter sobre os superiores interesses da Nação.

Dizia-me que os nossos governantes nunca deveriam esquecer que as Relações Internacionais são, por definição, relações de poder e simpatia entre nações. Neste contexto não compreendia como o Sr. Primeiro-Ministro da República de Cabo Verde, Dr. José Maria Neves, teria tido a coragem de boicotar, premeditadamente, uma recepção oferecida pelo Sr. Embaixador da União Europeia, para assinalar o dia da União Europeia, somente porque este cometera o pecado mortal de afirmar, numa entrevista concedida ao jornal “Expresso das Ilhas”, que “o ambiente de negócios em Cabo Verde é mau”.

Ora, sendo certo que a União Europeia tem sido o nosso maior e mais importante parceiro de desenvolvimento, também a mim pareceu desproporcional a reacção do Governo quando resulta evidente que tal afirmação é a expressão da mais pura das verdades.

Aliás, é inegável que devido a omissões desta maioria, tanto a nível do Governo como da Assembleia Nacional, ainda não foram criadas as condições para um investidor estrangeiro, incluindo os oriundos da União Europeia, poderem vir operar no nosso território, pois ainda existem muitos imprevistos e arbitrariedades no que se reporta ao Sistema Fiscal e Tributário, demoras e delongas injustificadas no sistema judicial, insegurança jurídica no registo dos terrenos, deficiência de transportes marítimos inter-ilhas, enfim.

Daí que, em vez de fazer birras de menino mimado que não aceita críticas, o Governo deveria era agradecer as achegas e acelerar as reformas no sentido de se colmatar, o quanto antes, eventuais insuficiências ou desinteligências reinantes. Entretanto, de tão autistas que estão, já só toleram os elogios e jactâncias, rejeitando, marginalizando, hostilizando e apelidando de “confusentos” todos aqueles que, mesmo por bem, ousam apontar as falhas.

Entretanto, convinha alguém advertir que tais “retaliações”, pese embora serem muito utilizadas entre nós, não podem ser dirigidas contra Embaixadores, ainda por cima da União Europeia, sob pena de estarmos a ferir de morte as relações que, até agora, têm mantido a viabilidade do nosso Estado. Nesta ordem de ideias, o dever Patriótico obriga a uma maior contenção e ponderação na forma como o Governo quer protestar contra o suposto e eventual “excesso de crítica” protagonizado pelo Sr. Embaixador Pinto Teixeira, não sendo aceitável deixar uma representação diplomática tão importante pendurada, a espera dos membros do Governo de Cabo Verde, para iniciar um evento cujo convite tinha sido formulado com a devida antecedência. Ser patriota é, sobretudo, saber encaixar críticas e reparos, por forma a se corrigir falhas e insuficiências existentes. Ser patriota não deve nem pode ser confundido com o ser “Patrioteiro” que são as pessoas balofas e inconsequentes que dizem “Amar a Terra” só porque calam e escondem as verdades, varrendo o lixo para debaixo do tapete, encobrindo a Não-Justiça reinante e a iniquidade da Administração Pública e Fiscal com discursos retóricos e caprichosos, em vez de se esforçarem para que tenhamos um Cabo Verde cada dia realmente melhor.

Pelo exposto, espero que este “incidente de percurso” não venha a constituir um “incidente diplomático”, pois deveremos todos ter a consciência de que as relações entre Cabo Verde e a UE devem prevalecer acima dessas desinteligências circunstanciais.

Ademais, para além dos interesses de Cabo Verde, parece-me cristalino que a União Europeia sempre entendeu que Cabo Verde, devido à sua posição geográfica, desde 1460, aquando do seu descobrimento, que tem servido de porto de abrigo, praça de raças múltiplas, fábrica de novas mestiçagens, útero da crioulagem - e, mais recentemente, útero de muita bandidagem. Daí que Cabo Verde, para além do clima, mar, praias e entreposto comercial, também poderá actuar como um excelente ponto de travagem de muita criminalidade que vai por este mundo fora caminho da Europa e dos Estados Unidos da América, como será o caso do tráfico de drogas, terrorismo, imigração clandestina, etc. e tal.

Nesta ordem de ideias, se, em vez de roermos essa amizade, nos preocuparmos mais em alargar o Acordo Especial de Parceria com a União Europeia, certamente que Cabo Verde, como Estado e como Nação, cumprirá melhor a sua razão de existir que é a de aproximar povos, equilibrar sons, misturar cores e sabores, e conciliar interesses de Estados e gentes de diferentes latitudes. Assim, tal qual na era dos descobrimentos, quando Cabo Verde foi o porto que permitiu aos Portugueses darem novos mundos ao mundo, agora, com as Relações com a União Europeia, Cabo Verde continuará a ser o elo de ligação entre os mundos deste mundo cada vez mais pequeno pela força e graça da globalização. A Bem da Nação Cabo-verdiana.

Cidade da Praia, 11 de Maio de 2015.0s levianão e bipolar de cabeça. Viva o PAICV, sem patetas alegres desse tipo.

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