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quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

[8853] - ERA UMA VEZ, ANGOLA...{56}


RESUMO DOS EPISÓDIOS ANTERIORES

- Foi no ano de 1955 que fui do Mindelo à Praia fazer provas de condição física e intelectual na mira de uma colocação, em Angola, como Aspirante do Quadro Administrativo daquela, então, Província de Portugal no Continente Africano...Cerca de um ano mais tarde, eu com outros quinze, fomos aprovados e lá seguimos, em grupos de três e quatro, até Lisboa, primeiro e,  cerca de um mês mais tarde, para Luanda, onde cheguei em Dezembro de 1956, fazia um calor de derreter as pedras da calçada e chovia dilúvianamente...Passados mais cerca de 30 dias, lá segui com destino a Cazombo, no Alto Zambeze, que ficava - e fica - a cerca de 1500 quilómetros da Capital angolana...Até Vila Teixeira de Sousa, na fronteira do, então, Congo Belga, transportou-me o Caminho de Ferro de Benguela onde tive o meu baptismo de, num comboio,  dormir entre lençóis e tomar três refeições quentes diárias, numa viagem inolvidável de cerca de 40 horas.
Passada mais um a noite no Hotel Términos em V.T.Sousa, lá segui, de boleia de um camião carregado de telhas e tijolos de barro, para Cazombo, onde conseguimos chegar ao fim de 250 penosos quilómetros, estava eu tão partido por mais de cinco horas de solavancos...Instalei-me na "pensão" do crioulo Mário Matos, onde ele morava com mulher da Figueira-da-Foz, filho e duas irmãs e comi o primeiro almoço de arroz de berbigão de lata...Durante cerca de três anos vivi uma nova vida, numa nova terra, conhecendo nova gente e fazendo coisas novas como ir à caça de nuces e encontrar leões de anhara (sem juba), degustar febras de javali com licor de Singeverga com o padre Dâmaso, caçador de hipopótamos ou, como lá os apelidam, de cavalos-marinhos...Içar a Bandeira Nacional no terreiro da casa nova de Nhacatole, Raínha dos Luenas, que recentemente alguém tinha ido raptar à Rodésia do Sul e estava, agora, instalada em Nana Candundo,  ou assistir à inauguração da Gafaria do Alto Zambeze, a maior de toda a África, participar num churraco de testículos de porco numa ilha do Zambeze onde um ex-pescador da Nazaré tinha uma gigantesca criação de suínos, viajar de "jeep" até Balovale, na então Rodésia (cerca de 800 km, ida-e-volta) onde comprei a um logista de Castelo-Branco uma carabina BSA calibre 22-long que, depois de mirada pelo padre Dâmaso - que tudo fazia, incluindo tirar dentes e reparar bicicletas - me permitiu abater uma cabra-de-leque, à noite, num abandonado campo de aterragem, num tiro que devia constar dos anais das obras-de-arte...Na realidade, o bicho estava morto mas não tinha vestígios de qualquer ferimento em nenhuma parte do corpo...Só depois de esfolado se constatou que o tiro, à espádua traseira, lhe tinha acertado num dos ouvido e...saído pelo outro! Nem chegou a sangrar...
Depois, veio a penosa despedida de amigos conhecidos nesta curta passagem pelas planuras sem fim de um Alto Zambeze onde se colhe o arroz duas vezes ao ano, que produzia, ainda, toneladas de amendoim (ginguba), cera de abelha e...porcos vivos, claro, sem os ditos! Cazombo devia ser o único sítio do mundo, onde a única rua (estrada) que atravessava a povoação de uma ponta à outra, era ladeada por centenas de mangueiras cujos frutos ninguém consumia à excepção das abelhas, aos milhões delas! Único era, também, um pomar de várias  dezenas  de maracujazeiros que ninguém se lembrava de quem o tería semeado, que, esses sim, proporcionavam uns sumos de beber e chorar por mais...Não será certamente por acaso que os ingleses chamam ao fruto "passion fruit"... A seguir, veio a viagem até ao Cuíto Cunavale e, daí, para Norte com  a conturbada travessia em improvisada jangada, do rio Luande, a caminho de Malange e para o posto de Cangandala, onde ía ajudar a uma das tarefas mais problemáticas da acção administrativa do território: o censo da população indígena da área...(Continua...)
---------------------------------------------------------------------------------------------- N.E. - Creio que, desta forma, fica a memória das coisas minimamente actualizada, conforme me aconselhou a fazer o amigo Adriano M. Lima, como medida para que os eventuais seguidores da saga não percam completamente o fio à meada que, na realidade, já irá longa, quiçá, demais!

2 comentários:

  1. Ora, sim senhor, era importante esta súmula dos antecedentes para a retoma da narrativa, que esperemos não demore. Este apanhado é já o suficiente para os que andaram por África sintam fundas saudades e anseiem pela continuação.

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