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sábado, 4 de junho de 2016

[9286] - NHÔ JONAS, SEM PAPA NA LÍNGUA...

UN VEZ, GENT' DE SONCENTE CÂ TÁ LEVÁ D'SAFOR PÂ CASA...


"Notas do canhenho de um caboverdiano"

Sob este titulo, veio publicado no nº 93 do "Cabo Verde” um extenso artigo da autoria do Exmo. Sr . Dr. Bento  Levy, no qual, entre vários assuntos,   este  sr. não só  insinua  que existe da parte  dos habitantes de S. Vicente uma grande rivalidade com a Praia, senão também que, pessoas responsáveis, devido à paixão qua as move, teriam tentado ou vão tentar a mudança da Capital da província para S. Vicente.
O sr . Dr. Bento Levy atirou pois, a luva  sobre duas questões, uma das quais, a transferência, bastante oportuna e pede que “responda quem  tiver... resposta” . -. . . .
Pela parte que me toca, aceito o repto, esperando que outros se me seguirão breve na resposta que também tiverem, por haver chegado o momento de S. Vicente acordar e sacudir de si os parasitas que vêm impedindo o seu progresso e o progresso desta Província, não obstante o carinho que lhes vem dispensando o Governo da Nação. 
0 sr. Dr. Bento Levy é uma criatura que merece a maior consideração, e por isso me repugna acreditar que, intencionalmente, tenha querido desvirtuar os factos, pretendendo criar um problema – o da rivalidade com a Praia, que jamais  existiu no espírito dos habitantes de S. Vicente -, apenas com o propósito deliberado de estabelecer confusão e colocar os incautos em posição perante o estudo dos problemas que enfrenta Cabo Verde.
E o sr. Dr. Bento Levy se desse ao trabalho de estabelecer paralelo entre as duas cidades, Praia e S. Vicente-, logo veria o erro em que labora, pois nunca S. Vicente poderia alimentar qualquer rivalidade com a Praia. O inverso é que seria admissível. Senão, vejamos:
S.Vicente, como é de todos sabido - e o Sr Dr Bento Levy não o ignora -,   contribui para a erário com cerca de 75% das receitas totais da Província de Cabo Verde. Isto quer dizer, sem a mais leve contestação, que S. Vicente é que alimenta a quase totalidade da máquina  administrativa do arquipélago, inclusivamente  a da Praia, não obstante ser a ilha de S. Tiago o seu maior centro populacional,  mas também, diga-se de passagem o maior centro de pessoas analfabetas.
S.Vicente é a única ilha desta Província pela qual passam diariamente sem interrupção muitas dezenas, senão centenas de estrangeiros e nacionais ou sejam os passageiros e os tripulantes dos inúmeros vapores de todo o mundo que escalam o seu porto.
S.Vicente é a única ilha visitada pelos mais altos vultos políticos nacionais e estrangeiros, como sejam Presidentes de República, Reis, Príncipes, Ministros, Embaixadores,  e t c . ,
Bem como jornalistas de todas as nacionalidades, professores, cientistas, turistas, possivelmente, até observadores, salvo as duas vezes em que Sua Exª o  Presidente da nossa República bem como a sua comitiva também visitaram a Praia.
S.Vicente é a única ilha do arquipélago visitada frequentemente pelos maiores e mais importantes navios de guerra de todo o mundo, que  transportam os mais  destacados oficiais (almirantes, comodoros, etc.).
S. Vicente é a única ilha de Cabo Verde que possui instalações para o abastecimento de combustíveis à navegação, bem como Instalações de cabo-submarino  que a ligam e ligam Cabo Verde a todas as partes do mundo e cujos valores se poderão calcular em centenas de milhares de contos.
S. Vicente é a única ilha do arquiplago que se encontra em permanente contacto com o exterior, através dos navios paquetes outros vapores que escalam diariamente o seu porto. 
S. Vicente é a única ilha que possui valor militar, pela sua situação geográfica e pelos valores materiais avultadíssimos que nela se contem.
Em S. Vicente  por isso é que se encontram instalados o Comando Militar de Cabo Verde e a maior concentração de forças militares e aquartelamentos da Província.
Em S.Vicente  é onde que se encontram instalados os consulados de todas as nações
En S.Vicente é que, devido à sua irrefutável importância, o governo da nação vem investindo dezenas de milhares de contos  na construção de um cais acostável; e finalmente S. Vicente é a única ilha do arquipélago à qual todos - nacionais e estrangeiros - se referem quando tenham de mencionar a terra portuguesa do Atlântico qua liga a Europa às Américas ou quando se tenha que referir o elo que liga Brasil a Portugal.
0 sr. Dr. Bento  Levy talvez tivesse tomado como rivalidade ou paixão  de S. Vicente para com a Praia, o facto de  todos lamentarem que se esteja ultimamente  desenvolvendo a cidade da Praia com inúmeras construções urbanas de preços elevadíssimos (milhares de contos) sem olhar à pobreza do meio e com manifesto desprezo
pelas necessidades mais prementes das outras ilhas, nomeadamente  S.Vicente, que pouco ou nada vê dos 75% das receitas totais da Província com que contribui anualmente para equilibrar o orçamento.
Talvez tivesse tomado como rivalidade, o facto de se lhe haver referido durante a sua estadia em que a todos agradaria aqui, ver a ilha de Santiago devidamente apetrechada com boas estradas, bons portos, celeiros, etc, em lugar de nessas obras de fachada que já se construíram ou se vêm construindo na Praia em ritmo acelerado, obras sem significado algum para o fomento dessa ilha nem da Província, antes constituindo verdadeiro peso morto na sua economia, para único gáudio dos habitantes dessa cidade, que são, praticamente, as únicas pessoas que as vêm, pois estranhos, só se foram os tripulantes de dois pequenos vapores da Cuf que escalam mensalmente o porto.
Talvez ainda tivesse o Dr. Bento Levy tomado como rivalidade, o facto de havermos enumerado as referidas obras, as quais são mais ou menos constituídas pelo seguinte:
Um palácio da Saga, um grandioso palácio de Justiça (que só retretes dizem possuir 18), um grandiosíssimo Liceu para a instalacão da delegação do Liceu Gil Eanes instituida ultimamente na Praia (consta que com vista à transferência da Sede que se encontra instalada em S. Vicente), um cineteatro, prédio para magistrados, inúmeros prédios para outros funcionários, blocos de casas para particulares, etc, além de varios automóveis distribuidos  a quási todos os chefes de serviços, como se coubesse o Estado construir de novo uma cidade, onde os particulares pouco ou nada vêm fazendo para o seu desenvolvimento como se esta Província andasse a nadar em dinhairo e já não houvesse mais nada que fazer para o fomento das ilhas.
Pelo que, pois, se vê, o sr. Dr. Levy ou está enganado ou quer enganar os outros. Não existe, nunca existiu nem podia mesmo existir rivalidade de S.Vicente com a Praia, uma pequena cidade composta apenas por quatro pequenas ruas e cujo mérito  é ter a capital da Província, porque nem como escoadouro natural dos produtos produzidos pela ilha de S.Tiago serve.
O que existe realmente - e sabe-o o sr. Dr. Bento Levy perfeitamente -, é o desejo sincero de toda a gente, que haja uma aplicação mais útil e de melhor alcance económico dos dinheiros da Província para o bem-estar do seu povo e orgulho de Portugal; o que existe ainda é o desejo de que os indivíduos que se encontram à testa dos serviços públicos na Praia tenham um influência mais benéfica na administração da Provincia em lugar de pretenderem, por ' norma "colonisar" S. Vicente negando-lhe sistematicamente todos os meios de progresso, sem quererem lembrar-se de que, se um dia faltassem à Província as receitaa desta ilha, toda a máquina administrativa do arquipélago se desmantelaria. 
Os referidos funcionários não se dão conta de quanto maior for o desenvolvimento de S.Vicente, maiores serão as suas receitas que irão influir em beneficio de S. Tiago como das demais ilhas suas irmãs.
Ao contrário do que acontece na Praia, onde as construções urbanas se vêm fazendo (pelo Estado, é claro, da forma, mais acelerada que imaginar se possa), S.Vicente possui um pequeníssimo Tribunal numa casa quási  secular que dantes era habitação particular e que não é património do Estado; O Liceu, não obstante fundado há  40 anos, fulciona num prédio que foi, sucessivamente quartel, correio, Liceu, Câmara, Fazenda e não sei que mais; não possui nenhum prédio para magistrados nem outros funcionários: os cineteatros que existem são particulares, como particulares são  quási todas as obras de valorização da cidade; não tem um só hotel; não tem esgoto; não tem água canalizada; a luz é precária; os pavimentos das ruas são uma miséria, não possue estradas dignas deste nome, e os caminhos carroçáveis que existem  aIguns encontram-se há anos intransitávels, etc. etc.
A burocracia da Praia não quer compreender que sendo S.Vicente a sala de visitas da Província de Cabo Verde, a qual, por força, manifesta perante estranhos tudo quanto de Bom ou de Mal pratica a nossa administração pública, tem, necessariamente, de merecer mais e melhores cuidados, sobretudo para evitar que observadores mal intencionados, nesta época conturbada do mundo se tenham de referir às Provincias Ultramarinas de Portugal pelo que vêm nesta ilha, aquilatandos-as todas por igual. 
Quanta à mudança da capital da Províncla para S. Vicente, pensa-se nisso efectivamente e oportunamente se apresentarão as respectivas razões aos poderes Centrais na Metrópole para resolverem como for mais conveniente.  Mas pensa-se nisso não por rivalidade com a Praia nem por paixão como insinua o sr. Dr. Bento Levy no seu infelicíssimo artigo. Pensa-se por estar dentro da sua boa lógica, está dentro da sua boa razão e porque a Capital, a continuar na cidade da Praia como até aqui, apenas contribuirá como tem sempre contribuido com o exclusivismo desta cidade, para a estagnação da Província e o retrocesso de sua maior fonte de receita.
S. Vicente, o que no admite dúvidas, é a ilha economicamente mais importante da Província de Cabo Verde,  a que possui maiores valores materiais e culturais, a que se encontra em permanente contacto com estrangeiros e com a metrópole através do magnífico e afamado porto, e é onde as necessidades burocráticas, digam o que disserem, mais se fazem sentir, e a permanência do governador mais seria de desejar .
 A Praia fica-lhe distante, separada por mar 160 milhas, sendo tão escassas as suas comunicações que ainda há pouco tempo era muito mais fácil a comunicação de S. Vicente com a Metrópole ou com o Japão do que com ela.
Além disso, a intercâmbio comercia com as outras ilhas de Sotavento, nomeadamente o Fogo e a Brava, é muito maior com S. Vicente, que todos preferem, pois o comércio com S. Vicente é muito mais vasto, os seus preços são mais acessiveis, existem mais facilidades de crédito, etc.
 Assim, nada justifica que a Capital da Província se mantenha Praia. Não há  duas opiniões a este respeito salvo a do sr. Dr. Bento Levy. Isto não é ter rivalidade com a Praia nem com os seus habitantes de S. Tiago. Tão pouco se encontra o remédio no maior intercâmbio entre as populações das duas ilhas, o que de nada valeria com o de nada tem valido, sabido que a deslocação de S. Vicente até Praia tem sido mais frequente do que imagina o sr, Dr. Bento Levy.
Afirmar o contrário será pelo gosto apenas de estabelecer um ambiente de permanente desconfiança entre todos, o que, agora, conforme declara o sr. Dr. Bento Levy no seu artigo, poderá, afectivamente, “gerar incompreensão e provocar até ressentimentos”.
É o que se me oferece dizer por enquanto, a bem de Cabo Verde e da Nação a que me honro e orgulho de pertencer. 

S. Vicente  5 de Julho de 1957

Jonas Wahnon
   S. Vicente


N.E. - Texto integral obtido de uma cópia da carta original facultada  por Luis Silva e editada por Fátima e José F. Lopes.

10 comentários:

  1. O Senhor Joanas, proprietario dua padaria célebre que ficava na Chã de Cemitério, conhecido pela sua rebeldia contra o regime colonial, fazia parte do grupo dos Claridosos politicos e que teria encorajado o carpinteiro Ambrosio a organizar em 1934 a célebre revolta que mais tarde foi poetizado pelo Gabriel Mariano. Dizia Baltasar Lopes que se o Senhor <jonas vivesse num outro pais seria um grande polemista. Baltasar lopes considerava Claridoso todas as figuras do Mindelo como Nhô Fidjito que organizava constantes manifestaçoes junto à Câmara de São Vicente e fornecia o papel para a ediçao da Claridade. Seria Baltasar Lopes o unico intelectual cabo-verdiano que pertencia aos dois grupos: claridosos literatos e claridosos politicos. O Senhor Jonas era também uma grane figura do desporto mindelense, tendo sido grande jogador de criket e presidente do Club Sportivo Mindelense. Hoje é habito dizer que já Soncente não tem homens da tempôra do Senhor Jonas, Nhõ Fidjito, Nhô Damtatinha, que frontalmente defendiam as injustiças sociais de que eram victimas os cabo-verdianos. As desigualdades sociais, o fosso entre ricos e pobres, principalmente nas cidades da Praia e São Vicente, a perda de credibilide dos partidos politicos nos obrigam a recuar no tempo e a reler as obras de figuras como Eugénio Tavares, Pedro Cardoso, José Lopes, porque Cabo Verde não nasceu em 1936 com a Claridade e nem com o Paigc em 1956 mas sim nos finais do século XIX e cujo papel da nossa emigraçao na América foi determinante.

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  2. Sem tirar nada do que diz o Luiz, acrescento que o Sr. "Joana" (como o chamavam as vendedeiras), foi sócio co-fundador do efémero Sporting Clube de S.Vicente, com o então Capitão dos Portos Daniel Duarte Silva e outros.
    Importante frisar ainda que o sr. Jonas Wahnon foi um dos dinâmicos elementos que constituíam as Forças Vivas em S.Vicente que defendiam os interesses de Cabo Verde. Senão, lembro-me de uma pessoa pacata, de poucas palavras e bom pai de 4 filhos e 3 moças, qualquer delas a mais bela.

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  3. " UN VEZ, GENT' DE SONCENTE CÂ TÁ LEVÁ D'SAFOR PÂ CASA..."Uma carta de Jonas Wahnon (2º das Foto), um importante comerciante da praça mindelense (proprietário da mais padaria célebre que ficava na Chã de Cemitério em S. Vicente) datada de 60 anos, ao seu amigo Bento Levy (1º das Foto) um importante advogado e político, natural da Praia-Santiago, e influente deputado de Cabo Verde na então Assembleia Nacional em Lisboa, em pleno regime de Estado Novo. Ambas as figuras de destaque foram homenageadas nos Blogues ArrozCatum e Praia de Bote.
    Como bem recorda Luiz Silva, Jonas Whanon era um “enfant terrible” conhecido pela sua rebeldia contra o regime colonial, fazia parte do grupo dos Claridosos políticos e deu muitos suores ao regime de Salazar assim como muitos intelectuais mindelenses, razão por que ser despachou de Lisboa um importante destacamento da Pide para calar a boca contestatária que se levantava contra o abandono a que Cabo Verde se encontrava quando O Porto Grande começou a perder influência em favor de Las Palmas e que os ingleses anunciavam a sua retirada futura na ilha diminuindo os investimentos.
    Esta carta é uma resposta a Bento Levy por ter insinuado que existia da parte dos habitantes de S. Vicente uma grande animosidade com a Praia. Na realidade tratou-se de uma polémica que se estalou entre as duas cidades numa altura em Lisboa considerava seriamente a transferênciadefinitiva da capital de Cabo Verde para a cidade do Mindelo, que era, como reclama Whanon, a única cidade digna do seu nome em Cabo Verde com todas características urbanas de qualquer cidade no mundo, e onde se concentrava a massa crítica do arquipélago, para além de produzir 75% do PIB de Cabo Verde, já lá vão 60 anos.
    Naquele tempo S. Vicente fervilhava de intelectuais, homens de negócios, provenientes de todo o arquipélago e mesmo do mundo. Jonas já acusa a burocracia da Praia de não querer compreender que sendo S.Vicente a sala de visitas da Província de Cabo Verde e que matando a ilha matava-se Cabo Verde, e condenava-se todo o arquipélago. Numa altura em que a partidarização da sociedade era inexistente (ninguém ligava 'boia' ao partido de Salazar), a ilha tinha através das suas redes sociais uma força política intrínseca. Mesmo assim já se queixava do peso da burocracia da Praia que emperrava o desenvolvimento de S. Vicente, através de “riolas” ou intrigas e invejas.
    (continua)

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  4. (continuação)
    Como sabemos isto tudo foi mudado com o regime instalado em 1974 que praticou uma política económica (centralizada e planificada) que não dava hipóteses a economia liberal de S. Vicente (daí a revolta de 1977 e o terror que se seguiu e se instalou na ilha e depois em todo CV) só podia levar à sua morte económica, social e intelectual da ilha, para além de ter contribuído ao exílio da sua elite ou à sua emigração forçada para Praia, para a instalação da poderosa máquina burocracia que é hoje o estado de em Cabo Verde.
    Todavia como sabemos é com a constituição democrática de 1992, bastante imperfeita, quese institui um regime baseado exclusivamente no número de votantes, com um peso excessivo da dimensão, desprezando outras variáveis importantes, tais como a insularidades o facto de se viver num arquipélago, e não num país continental (uma ilha que dista da capital por mar em 160 milhas, sendo tão escassas as suas comunicações que ainda há pouco tempo era muito mais fácil a comunicação com a antiga Metrópole ou com o Japão do que com ela) matou por completo S. Vicente, uma ilha em estado avançado de “clochardização''.
    Hoje a geração Jonas ao ver o estado de cabo Verde da sua ilha deve dar voltas de indignação nas suas tumbas. Há 60 anos Jonas já acusava o novo-riquismo e a superficialidade da elite administrativa carreirista, totalmente desgarrada, vivendo numa redoma dourada, ignorando a realidade da ilha (vivendo em castelos rodeados pela ‘choqueira’) e do arquipélago:” 0 sr. Dr. Bento Levy talvez tivesse tomado como rivalidade ou paixão de S. Vicente para com a Praia, o facto de todos lamentarem que se esteja ultimamente desenvolvendo a cidade da Praia com inúmeras construções urbanas de preço elevadíssimo (milhares de contos) sem olhar a pobreza do meio e com manifesto desprezo pelas necessidades mais prementes das outras ilhas; nomeadamente S.Vicente, que pouco ou nada vê dos 75% das receitas totais da Província com que contribui anualmente para equilibrar o orçamento.”
    (continua)

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  5. (continuação)
    De certeza a geração Jonas teriamsaído à rua há décadas, não para as orgias festivas, mas para manifestar e exigir dignidade à sua ilha como fizeram o reduto que em 1977 pagou caro a sua dignidade. Felizmente que ainda há poucos mohicanos ( e tinha que haver, pois por mais que se faça contra esta ilha, ela tem sempre reservas morais tanto no país como na Diáspora) que vem honrando esta tradição mindelenses. Desde há 10 anos para cá foram criados movimentos e associações reclamando mais autonomia para a ilha e reformas em Cabo Verde para beneficiar não somente a ilha mas todo o arquipélago, em perigo de se transformar num enorme oásis plantado num deserto boiando no Atlântico.

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  6. Um texto interessante. Faz desfilar aos olhos desta geração, infelizmente, mal informada, ou pior - univocamente orientada em termos da História destas ilhas - de que existiram em Cabo Verde desde há longuíssimo tempo, figuras interventivas, de grande relevo, de destaque, que o povo respeitava e que não tinham medo do destino nem de eventuais interpretações das suas palavras. Estão neste caso, para além do autor e do destinatário do artigo, os vultos que os meus companheiros dos comentários citaram.
    É sempre bom estas achegas evocativas de um tempo e de uma forma de pensar e de reagir da nossa gente ilustre.

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  7. A geração desse tempo tinha o que muitos não têm hoje em dia - o amor à terra e a vontade de ver o país a prosperar. Faço votos para que os S. Vicentinos continuem a honrar esta tradição de gente que não leva desaforo.

    Matrixx

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  8. Depois do muito que foi dito, e bem dito, pouco me resta acrescentar.
    Esta posição assumida desassombradamente pelo Senhor Jonas Wahnon, na senda de ouros protagonistas cívicos e intelectuais do Mindelo de outros tempos, permite sublinhar o seguinte:
    - A ilha de S. Vicente contribuía para 75% do orçamento da colónia;
    - O produto da actividade económica de São Vicente resultava exclusivamente do empreendedorismo privado, a começar pelo investimento feito pelos ingleses;
    - No entanto, o orçamento da colónia não privilegiava a ilha na mesma proporção da sua contribuição, mas muito longe disso;
    - É o Senhor Jonas que nos lembra que fatia grossa do orçamento destinava-se à capital para sustentar a parafernália do Estado. Deste modo, pode-se inferir que São Vicente é que em grande parte sustentava os custos da capital e da administração do território;
    - Não obstante, havia certa animosidade da Praia contra São Vicente;
    - Dá para concluir que se a iniciativa privada (que começou com os ingleses) não tivesse agido de modo a que S. Vicente pudesse praticamente sustentar a colónia, de duas uma: ou o Estado central teria de proceder em conformidade, recorrendo acrescidamente aos cofres públicos; ou então a tragédia da fome no arquipélago teria atingido proporções inimagináveis nos finais do século XIX e na década de 1930/1940.
    Por tudo isto é que é absolutamente incompreensível que a estratégia política interna a seguir à independência tenha sido a promoção artificial da Praia e a marginalização de S. Vicente. Com o agravante de ter sido politicamente anulado um dos principais pólos de desenvolvimento do território, com os resultados que hoje são visíveis no país anquilosado, a funcionar com um centro empolado e uma periferia estagnada e em retrocesso.
    Temos assim de sentir saudade da gente de fibra de outrora que fez da ilha de São Vicente o que ela foi.



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  9. Voltei para ver os novos comentários esperando que houvesse alguém para corroborar o que diz o sr. Jonas e o que fica omitido por interesses obscuros. A verdade por vezes fere e procuram deturpà-la ou mesmo omitir conteúdos que não caiem no goto de muitos.
    Adriano fala dos anos 190/40 de má memória e lembrei-me (mais uma vez) do que faziam os ingleses declaradamente ou à socapa. Insisti aqui com o nome do Captain Sands, oficialmente Cônsul de Sua Magestade Britânica no Mindelo e, mais uma vez, agradeço ao amigo Saial que fez buscas muito interessantes que nos deliciaram. Nunca esqueci o velhinho e seu interesse pelo Povo de Cabo Verde. E uma que deve ter tido a sua chancela foi - em época de plena necessidade - o encalhe de uma barco novinho que vinha da Argentina carregado de milho. O cargueiro que devia passar ao pé do Ilhéu dos Pássaros e seguir para o Norte foi encalhar-se numa Praia de Santo Antão de fácil acesso.
    Não me perguntam mais. Nada sei e ninguém pia.
    Que Deus tenha a sua alma !

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    1. Ops: - Quis dizer anos 1930/1940.
      Uma década horrorosa na nôs terra

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