José Pedro Chantre Oliveira |
REGIONALIZAÇÃO & POPULISMO
“O populismo ama tanto os pobres que os multiplica”
(Mariano Grondona)
É nossa opinião que estando o país a meses das eleições, há determinadas matérias que por serem desígnios nacionais – como é o caso da Regionalização – deveriam ficar à margem das manobras de oportunismo ou de populismo que são normalmente utilizados nesses períodos pré-eleitorais.
Por um lado, os políticos têm o dever de demonstrar um pouco mais de patriotismo, e até de pudor, não usando o vale tudo na sua legítima luta pelo poder, e por outro, o cidadão tem a obrigação de se manter atento e íntegro para recusar entrar nessa dança, a troco de ganhos materiais momentâneos, para posteriormente vir acusar os políticos, assumindo a condição de cordeirinho abocanhado por aqueles.
Se assim não for, apesar dos bons acontecimentos com que a juventude nos tem brindado nos últimos tempos, poderemos estar à beira de um 2016 a repetir o triste espectáculo do folclore eleitoral em que tudo que não seja essencial e primordial para o país é trazido para as ruas numa competição a cheirar o primitivismo em que o vencedor é escolhido por emoções, cores e “rebuçados”. As questões importantes que podem mudar a vida das populações vão sendo adiadas.
Bem, e como o tempo está ficando escasso, nada melhor que usar um expediente que atiça o interesse de todas as ilhas, e qual é? A Regionalização, claro!
Tivemos todo o tempo deste mundo, um espaço temporal de 04 (quatro) anos sem qualquer acto eleitoral, e, NADA, apesar de algumas firmes chamadas de atenção aqui e acolá que era tempo de se repensar outras formas de melhor administrar este arquipélago, sempre dentro dos princípios republicanos e da unidade nacional. Ouvidos moucos, a regionalização é muito custosa, etc., etc., etc., eram as respostas, quase sobranceiras, dos que entendem (?) da coisa.
Às vésperas das eleições, quando já não é possível fazer nada, e muito menos sonhar com a veleidade de mexer na Constituição, lá vamos nós distrair os eleitores com uma Cimeira sobre Regionalização. Como não acreditamos nisso e nem estamos dispostos a perder a centralização do Poder, logo no discurso de abertura vamos condicionar as recomendações finais com uma clara abordagem a favor do fortalecimento do municipalismo e, quiçá, uma aposta no infra-municipalismo. Isto é, meus convidados, vamos desviar do objectivo para o qual a Cimeira fora programada!
Ora, tenhamos um pouco mais de cuidado, diria mesmo, de respeito pelos demais, pois a história era para ser outra! Era para reflectir sobre a REGIONALIZAÇÃO, isto é, sobre a organização administrativa e política destas ilhas em regiões supra municipais, entende-se, e não para o reforço do municipalismo e muito menos Infra, o que iria, se acontecesse, deixar o polvo central com a mesma cabeçona que vem sendo o mal de todos os males. É verdade que as estruturas das autarquias municipais e das freguesias (quando existir) reclamam uma outra montagem no sentido de se aproximar e melhor servir o cidadão, mas esta é uma outra história que poderá vir complementar a Regionalização após efectivada. Nosso entendimento é que o municipalismo em vez de se tornar mais pesado, como propõem alguns, deverá andar em sentido contrário e tornar-se mais leve, menos custoso e mais eficaz, coadjuvado pelas juntas de freguesia lá (e só) onde justificar. Portanto é outra história, ou se quisermos, será o aprimorar do item Regionalização!
Contudo, e ainda para reforçar que não levamos isto a sério, fomos procurar experts estrangeiros num país onde, até hoje, um dos seus maiores handicaps ao desenvolvimento tem sido exactamente a incapacidade de equilibrar as condições de vida em todo o seu território, continuando os centros do poder a asfixiar e a desertificar o interior, em assimetrias impensáveis e inaceitáveis, hoje em dia, num espaço como o europeu. Esquecemos os países nórdicos (quase todos), esquecemos a Suíça dos cantões (um belo exemplo), esquecemos alguns arquipélagos (de realidade próxima à nossa), isto tudo porque não é para levar a sério. Também, é só para gastar mais uns trocados públicos e animar o povão, distraindo-o do essencial pois vêm aí as eleições todas.
Eu diria mesmo, que um Governo que está preparando com pompa e circunstância (com o qual estou inteiramente de acordo) as comemorações do 40º aniversário da Independência Nacional deveria contribuir com acções concretas para seu povo ir perdendo essa tara de tudo copiar “chapado” na ex-metrópole colonial, mesmo quando se trata de matérias em que ela demonstra ignorância e inaptidão totais. É já tempo, meus senhores, de manter e desenvolver uma amizade digna e profícua, mas “15 na 15”, come on!
A essa mise en scène da Cimeira Regionalização se chama populismo, nu e cru, que nos leva a citar Mariano Grondona, jornalista argentino: “Hugo Chaves ganhou o voto dos pobres, depois de tê-los aumentado. O populismo ama tanto os pobres que os multiplica.”
Já que se perdeu a oportunidade de termos tido 04 anos sem pleitos eleitorais para, juntos e sem pressão, pensarmos Cabo Verde, é de ética recolhermo-nos às boxes e irmos atrás de experiências reconhecidas e válidas que sirvam de exemplo à nossa realidade e regressarmos tranquilos após 2016 com propostas sérias e despidas de qualquer dose de populismo, em vésperas de eleições. Já se viu que o actual figurino está mais que esgotado e, com certeza, não será por culpa unicamente dos parlamentares, havendo necessidade de todos assumirmos, cada um sua responsabilidade no que acontece de mal ou de bem nestas ilhas de todos. Sem fugas à frente, sem oportunismos e, sobretudo, sem populismos.
Já disse várias vezes mas nunca é de mais repetir: as duas forças político-partidárias que se alternam no poder em Cabo Verde deveriam abandonar, de vez, algumas colagens históricas falsas para que o povo se sentisse tranquilo na sua escolha de acordo com cada momento e fruto de sua análise em relação aos feitos concretos de cada partido na governação ou na oposição. O PAICV, que nasceu em Janeiro de 1981 na sequência do golpe de estado de Bissau, e apenas para não perder o poder em Cabo Verde, continua autoproclamando como partido de Cabral e da Independência para confundir os mais jovens, na lógica do voto com o coração nacionalista. O MPD, é levado a responder na mesma moeda, agarrando-se à mudança de regime em 1991 onde venceu estrondosamente as primeiras eleições livres e democráticas num momento em que o povo das ilhas já havia conseguido o direito ao voto contra o obscurantismo do regime de partido único.
Portanto, quando o PAICV diz que é o partido da Independência e de Cabral, é mentira porque o herói foi morto em Janeiro de 1973, a Independência é de 5 de Julho de 1975 e o PAICV só nasce em Janeiro de 1981. E quando o MPD diz que é o partido da democracia também não é verdade porque ganhou as primeiras eleições democráticas num acto fruto da vitória do povo sobre o totalitarismo.
Sem qualquer pretensão, e apenas para provar que essa minha opinião vem de longe, cito um pequeno extracto duma intervenção no Parlamento 11 anos atrás, mais precisamente a 22.04.2004 : A fria aritmética dos votos não deverá continuar, eternamente, a alimentar e aprofundar os atritos de certas sociedades. Mesmo aqui em Cabo Verde, espero e faço votos que um dia, se ainda estiver vivo melhor, as duas siglas actualmente mais geradoras de votos, o PAICV e o MPD, ambas pretensamente ligadas a feitos de elevado significado histórico para o nosso povo, possam ser, normalmente, substituídas por designações que identifiquem ideologicamente essas formações partidárias criando assim condições para que as grandes questões nacionais sejam encaradas numa só voz pela família cabo-verdiana no seu todo e nas suas diferenças.
Dessas duas forças, o MPD já clarificou sua posição a favor da Regionalização e do modelo ilha/região, e o PAICV, talvez pelo seu apego genético à centralização do Poder, continua numa ambiguidade muito silenciosa. Todavia, o Governo suportado por esse partido e chefiado pelo seu ex-presidente vem, neste momento tão inoportuno, agitar as águas da Regionalização por razões simplesmente populistas, porque durante os 15 anos de governação ficou bem patente a convicção sobre as (não) necessidades de se equilibrar o país.
A Regionalização, pela sua importância no desenvolvimento futuro de todas as ilhas e sua gente, não deverá ser tida como oferta de qualquer partido ou governo mas sim uma assumpção consciente das populações, na sequência de demonstrações científicas, para colmatar falhas gritantes da actual híper centralizada organização administrativa e política. Nesta matéria, pede-se que os partidos políticos sigam as populações e a massa crítica do país e, não o contrário. E para que tal aconteça, algum paradigma terá que ser alterado.
A Regionalização, também ela, aconselha mexidas na Constituição para oxigenar o regime democrático e recuperar a confiança dos cidadãos nas instituições da República que vêm andando nuas e manipuladas pelas forças partidárias.
Cabo Verde precisa que tudo isso seja feito, mas bem feito! E, tenhamos em atenção, as coisas nunca ficam bem, quando feitas em momentos de efervescência espiritual. Esperemos pois, com temperança, que os espíritos se acalmem, e projectemos então os grandes passos que a vida das ilhas requer. E, sem dúvida para mim, a Regionalização é um deles! Sem Oportunismos e sem Populismos!
Santo Antão, 27.04.2015
Tem toda a razão o articulista. Confirma aquilo que em devido tempo dissemos: esta Cimeira não passou de um simulacro. O que é inadmissível é a comunicação social ter passado ao lado, como se ela não existisse ou para nada sirva senão para dar cobertura às manigâncias do poder. Tal como denunciámos, um letreiro com o nome de Regionalização no frontespício de um palco para se falar municipalismo e infamunicipalismo. Já chateia tanta mistificação.
ResponderEliminarPartilhamos a mesma opinião sobre esta Cimeira que de resto condenamos a sua realização que era prevista para Novembro dada o seu formato show off e a vacuidade dos temas que não tinham nada com o título publicitado. Que ninguém duvidas este Forum teve unicamente um objectivo eleitoralismo. O PAICV está cada vez mais um partido fechado na sua verdade e convencimento
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