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quinta-feira, 28 de abril de 2016

[9170] - AS LIÇÕES DO CHIQUINHO...


A primeira coisa que eu me lembro de ter feito em termos radiofónicos, no Rádio Clube Mindelo, aí por volta de 1950 foi a adaptação das Lições do Tonecas, de José de Oliveira Cosme que, por motivos óbvios, adoptaram o título de As Lições do Chiquinho"...
Claro que eu fazia o papel de Tonecas-Chiquinho e o professor era interpretado pelo Henrique de Albuquerque, proprietário do Salão Mimoso, não muito longe do edifício do R.C.M.
Foram alguns meses de puro divertimento e o programa tinha uma tal audiência que, na rua, muita gente já me chamava de Chiquinho...
Anos mais tarde, já eu trabalhava na Drogaria de Leão, nos anos 70 - vinte anos depois das aventuras escolares do Chiquinho - aconteceu algo que me deixou estupefacto... Às sextas-feiras era costume e Drogaria do Leão distribuir uns dinheirinhos por idosos mais necessitados que faziam fila frente ao "guichet" da zona do escritório... Nessa tarde, cabia-me a mim fazer a distribuição das moedas e, a certa altura, uma velhinha, já de cabelos brancos e vergada ao peso dos anos e das desventuras, olhou-me nos olhos e disse:
- M' tá lembrá de voçê naquel echcola de rádio, senhor Chiquin...
Mirei a velhota, de olhos húmidos e dei-lhe o dobro do óbolo... Ela afastou-se, sorrindo, certamente satisfeita por ter visto a sua memória compensada...

quarta-feira, 6 de abril de 2016

[9091] - AS MATRIARCAS...


Que seja do meu conhecimento, tudo começou com D. Gertrudes Vieira aqui sentada ao centro, com os seus, talvez, 80 aninhos, já que presumimos que esta foto seja de 1930...Essa senhora foi minha bisavó, a quem a gente chamava de Vó Tuda... Já eu era vivo quando ela se foi e recordo ter estado no seu funeral, estranhamente contente...Porque minha mãe me tinha comprado umas meias pretas, daquelas até ao joelho, que eram o meu orgulho...Se calhar eu não teria conseguido as almejadas meias altas se a velha avó não tivesse morrido e o facto acabou por me marcar de forma indelével pois jamais esqueci a dor da perda um tanto atenuada pelo prazer das meias novas... Coisas de miúdo inconsciente!
Sempre ouvi dizer e constatei-o pessoalmente, que as matriarcas da minha família materna leiriense  eram mulheres pro-activas. Minha avó Lucília, aqui sentada à direita da mãe, que casou com o Senhor Faria que não cheguei a conhecer, teria sido a "alma-mater" de um estabelecimento de comes-e-bebes, uma espécie de percursor dos restaurantes que, à época se apelidavam de "Casas de Pasto"... Era nas margens do Rio Lis, na baixa da cidade onde, muito mais tarde, esteve instalado o terminal da Rodoviária Nacional... Os petiscos e a pinga da Ti Lucília tinham uma fama quase tão notória como a inclinação do Senhor Faria para pular a cerca matrimonial...A filha, D. Laura, que na fotografia aparece por detrás dela, herdou-lhe a mão para o tempero e o faro comercial.
Na realidade, minha mãe dava apoio ao meu pai Azevedo no estabelecimento, ao balcão dos objectos de ourivesaria e, nos últimos anos de actividade no Mindelo, também vendia selos fiscais e dos CTT, graças a uma parceria com a Fazenda e os Correios, que lhe rendia cerca de 3% de lucro. Tinha instituído um sistema de vendas de peças de ouro e prata a prestações graças ao qual muita gente de posses reduzidas não deixou de comprar o seu cordão, pulseira, brincos e anéis...
Mas, claro, esta actividade não doméstica de minha mãe só foi possível pois tínhamos lá em casa outra jovem matriarca que mantinha a casa e a nossa roupa nos "trinques" e cozinhava divinamente: era a Nininha de quem, aliás, já tive oportunidade de aqui falar e que, nos temperos, dava continuidade à tradição de D. Lucilia e D. Laura...
Não sei se será por esta tão vasta convivência com mulheres com estatutos muito definidos que me tornei admirador  incondicional do género feminino. Em todos os sentidos e em todas as latitudes, diga-se, pois também não sou homem de meias tintas!
Umas palavras finais para as outras duas figuras da foto. À esquerda Vó Tuda, a tia-avó Dina, em cuja casa se comia um doce de tomate cujo sabor jamais se esquece e a filha, Georgette, a quem a gente chamava Jójó e com quem eu costumava ter um interessante diálogo quando era muito miudo:
- Jójó, dás-me um bocadinho de açúcar?
- Dou!
- Então, dá!...
Não sei se será por isso que sou, confessadamente, guloso!

sexta-feira, 18 de março de 2016

[9026] - AGUÇAR O ENGENHO...

Creio que todos nós, numa altura qualquer das nossas vidas, já experimentamos situações em que, como reza o adágio "a necessidade aguçou o engenho"...
Como já relatei noutras crónicas, uma das condições para se poder concorrer a um  cargo de "aspirante provisório" do Quadro Administrativo de Angola, isto em 1955, era ser apurado para "todo" o serviço militar, independentemente das provas de aptidão física a que todos os concorrentes eram sujeitos. 
Ora, na altura, vi-me confrontado com uma situação duplamente peculiar, qual seja a de que as inspecções militares, em S.Vicente, só se realizavam depois das provas documentais e físicas na Praia e, alem disso, como S.Vicente dava sempre um numero razoável de inspeccionados para a recruta, eu corria o risco de ser arregimentado para o serviço militar e lá se ia à viola um eventual aspirante de Angola...
Ora, um sargento amigo de meu pai, sabendo dos meus problemas, encontrou uma solução com as medidas perfeitas para a minha situação:
ir à inspecção ao Porto Novo, que era dois meses mais cedo e, além disso, aquela localidade nunca dava mais do que três ou quatro elementos para a recruta... E, assim, se fez...
Preparada  a papelada, lá fui no Carvalho de manhãzinha, fiz a inspecção, almocei com o Dick Ferro que tinha tido o mesmo problema mas vivia na Ponta do Sol e regressei na mesma casca de noz antes do por-do-sol...
Tinha apanhado o Nº 159 da classe de 1955 e, segundo as expectativas, eu jamais seria chamado do meu refúgio na O.T.E. - organização territorial do Exército - por ter excedido o contingente...
Pouco mais de um ano depois, estava eu a bordo do "Ganda" a caminho de Lisboa com destino a Angola porque, na altura, "a necessidade aguçou o engenho" e não creio que tenha prejudicado, nem o Estado, nem a Nação! 

terça-feira, 15 de março de 2016

[9011] - BRANDY V. S. O. P. ...


Hoje, o Blogue-irmão "Praia-de-Bote" publica uma noticia de um jornal de Lisboa, de Outubro de 1959, segundo a qual teria sido localizado a bordo do navio "Ganda" um passageiro clandestino oriundo do Porto Grande (Mindelo) que o navio escalara na sua viagem de Luanda para Lisboa...Era, afinal, um futebolista do Derby que queria ir para o Futebol Clube do Porto...O resto desta história, farão o favor de a ler no citado Blogue pois o que aqui nos trouxe é que o Dick Ferro, o Adriano Brito Lima e eu próprio, estávamos a bordo desse navio, a caminho de Lisboa e, mais tarde, para Angola...Danada de coincidência, pois o Comandante, que se fartou de beber do melhor grog à custa do Dick, nada nos disse sobre o patrício apanhado escondido numa casa de banho do navio...Aliás, em Dezembro de 2011 escrevi uma crónica sobre esta viagem que o PdB publicou e hoje, por motivos óbvios, aqui me permito repetir...
«ooOoo»

BRANDY v.s.o.p. 

Corria para aí o ano de 1953 e o Rádio Clube Mindelo, que funcionava nos dois andares superiores do ultimo prédio da Rua de Lisboa, mesmo em frente ao, então, Palácio do Governo (hoje, Palácio do Povo), organizava um dos seus famosos bailes com orquestra, não me lembro se era o Baile da Pinhata, se era o Baile das Chitas. Só sei que estava animado, como sempre acontecia naquelas organizações do amigo José Pedro Afonso, o primeiro amigo que me calhou com três nomes próprios. Eu, passava as horas a tirar um pequeno espelho do bolso para controlar o estado do meu laço de gravata, pois havia, nessa noite, dois concursos: um para o melhor nó de gravata, para os homens, e outro, para a mais bela flor artificial, para as senhoras.

Reunido o júri, foi deliberado que o Zito Azevedo (que era eu) vencia o concurso do melhor nó de gravata e a menina Maria do Carmo, mais conhecida por Maiúca, vencia o concurso das flores. Não me lembro qual era o prémio mas o simples facto de os dois vencedores terem que dançar um com o outro, já era prémio suficiente para mim pois a menina da belíssima rosa que uma tia lhe havia enviado dos “States” já há algum tempo que me vinha despertando os instintos em fugazes olhares de esguelha naquelas intermináveis voltas na Praça Nova. Mas, encurtando razões, o que é certo é que naquela noite de baile no RCM eu acabara de ter um encontro com o destino, conhecendo a mulher com quem, há 54 anos, partilho a minha vida.

 Algum tempo mais tarde, depois de resolvermos que queríamos dar o passo seguinte, era mister que eu pensasse em dar o corpo ao manifesto. Foi quando me confrontei com uma notícia de que o Governo de Angola queria recrutar em Cabo Verde elementos para o seu Quadro Administrativo, na categoria de Aspirantes. Lá fui de abalada à Praia, prestar umas provas de conhecimentos gerais e físicas sem qualquer tipo de dificuldades, de tal forma que, duas ou três semanas mais tarde fui notificado de que tinha sido aprovado, eu e mais uns tantos amigos e ex-colegas do Liceu Gil Eanes. Lá teria que voltar à Praia, para oficializar a situação e receber guia-de-marcha para Angola…De armas a bagagens rumei à Brava para me despedir da minha futura noiva e esposa, vi a vida mal parada quando, a caminho de Santiago, desembarquei no Fogo abandonando um “Novas de Alegria” demasiado dançarino para o meu gosto, consegui, quase por milagre, viajar, de avião, para a Praia, quase me afoguei nas águas do porto quando buscava meu navio para S. Vicente e a calema inundou a casca de noz que tio Polu tinha colocado à minha disposição por o tráfego profissional estar suspenso, dei de caras com meu pai no aeroporto da Praia e na viagem para S. Vicente ainda houve tempo para uma breve passagem pelo Sal, para reparar um dos tirantes das asas do “Dragon Rapid”. Depois de ter perdido o mesmo navio duas vezes em 24 horas, uma vez na Praia, outra no Porto Grande, lá consegui, com outros amigos, lugar no cargueiro “Ganda” onde, finalmente, me encontrava, três anos depois daquele célebre baile, no Rádio Clube Mindelo, de tão boa memória! Parecia a vida do Tim-Tim em 48 horas…

O Dick Ferro, o Adriano Lima e eu, fomos acordados, subitamente, pela sineta que, insistentemente, chamava os passageiros para o pequeno-almoço. A primeira impressão foi de um certo pânico, pois não se via nadinha. Foram necessários alguns segundos para nos recordarmos que estávamos num camarote interior, onde a luz do sol não tinha acesso e onde, segundo a judiciosa constatação da noite anterior, era tão escuro que se podia dormir de olhos abertos… Tinha começado a rotina que nos haveria de acompanhar nos próximos quatro ou cinco dias, dependendo do estado do mar e esta era a minha primeira “grande” viagem desde que, treze anos antes, tinha partido de Lisboa para o Mindelo, S. Vicente de Cabo Verde.

A vida a bordo de um navio no alto mar, tem um sabor especial em que as dimensões do espaço imenso que nos rodeia nos produz uma sensação de isolamento e solidão tão incoerente quanto é certo que nos encontramos rodeados de gente e de ruídos que percorrem os nossos sentidos como um filme, sempre o mesmo filme, visto e revisto, hora após hora, dia após dia… O nosso relógio orgânico vai-se adaptando a novas realidades, recuperamos o equilíbrio sincronizando os nossos movimentos com as oscilações do grande navio e, sobretudo, sentimos uma certa tendência para engordar. Efectivamente, uma parte substancial da vida a bordo de um navio de longo curso é passada… a comer! São, normalmente, quatro refeições: pequeno-almoço, almoço, lanche e jantar e começa-se, logo ao pequeno-almoço, a comer de garfo, além dos habituais pão, manteiga, café, chá, bolachas, etc. É que, segundo dizem, o ar do mar abre o apetite…

Talvez por deferência institucional, nós os três fomos convidados para almoçar à mesa do comandante do navio, onde também tinham assento os quatro oficiais de bordo, um major reformado que vinha de Luanda e uma senhora a quem, que me lembre, apenas ouvi dizer “bom-dia”, “boa-tarde” e “boa-noite”. Findo o repasto, o comandante pediu licença para acender o primeiro dos dois charutos que fumava por dia, enquanto se deliciava com uma dose generosa de “cognac” cujo aroma se misturava, de forma muito subtil com o do café de Timor que era exclusivo daquela mesa. O nosso anfitrião não se cansava de tecer elogios ao “cognac” que, segundo confessava, não conseguia dispensar depois das principais refeições do dia, tal como o charuto. E explicava que se tratava de um “brandy” de alta qualidade e que, por isso, se designava por v.s.o.p. que significa Very Special Old Pale ou seja, um perfeito Reserva do melhor “Napoleon” que ele conhecia…Foi, então, que o Dick Ferro teve a frase de que, dias mais tarde, se haveria de arrepender até às lágrimas. Disse: “Isso, senhor Capitão, é porque o senhor nunca provou um bom grogue de Santo Antão!”. Levantou-se e saiu, disparado, para voltar dois minutos mais tarde com uma garrafa que acabava de libertar do papel pardo em que vinha embrulhada. Era uma bem conhecida garrafa de “whisky” que conservava o rótulo negro do “Johnny Walker”. Exteriorizando um entusiasmo que eu lhe desconhecia, o Dick tentava destacar um papelinho preso à garrafa com fita-cola, (mais tarde vim a saber que tinha o nome de um familiar residente em Lisboa) enquanto explicava que, segundo constava, os ingleses que trabalhavam em S. Vicente na estação do cabo submarino da Cable & Wireless, a que todos chamávamos de Telégrafo, recebiam o “whisky” da Escócia em pequenos barris de madeira de carvalho, de 50 litros. Em S. Vicente era “destemperado” até se obter a graduação oficial e engarrafado, apenas para consumo do pessoal da Companhia. Ora, os produtores da melhor aguardente de Santo Antão, sabendo muito bem que o carvalho era uma madeira óptima para envelhecer destilados, compravam aqueles barris que, ainda por cima vinham “bêbedos” de “whisky”, e neles guardavam as suas melhores “colheitas” por anos, obtendo autênticos néctares de sabor e aroma inigualáveis… Um “rum” melhor do que muitos mundialmente célebres como os da Jamaica e de Cuba.  Com tanta euforia o Dick já suava enquanto o comandante, que já ia no seu segundo “brandy v.s.o.p.” se afirmava pronto a experimentar o grogue especial do Dick Ferro, no dia seguinte, quando não tivesse o palato adormecido pelo distinto sabor do Napoleon...

No dia seguinte, ao almoço, não tivemos o prazer da companhia do Comandante que, segundo o telegrafista, estava um pouco febril. Pensei logo que devia ser do “calor” do “cognac” que, por ausência do anfitrião, também parecia indisponível e não deu as caras sequer. O telegrafista, para além de um tanto comprometido pela ausência do seu chefe, parecia cansado e eu os meus amigos não deixamos de sentir uma carta pena do homem – afinal, tinhamo-lo desalojado do seu camarote para podermos usufruir de instalações similares a uma primeira classe, já que o navio não tinha segunda, a que tínhamos direito por inerência de funções – e nem sequer sabíamos como é que ele estava acomodado.

Ao jantar, o Capitão da nave parecia fino que nem um pêro, barbeado de fresco e impecável na sua farda de brancura “Omo”, decerto e, segundo dizia, em grande expectativa de que a refeição terminasse para provar “aquela maravilha envelhecida em barris de “whisky”. Cá com os meus botões, eu pensava que no dia seguinte ao almoço o Comandante iria primar, de novo, pela ausência…E já não falo do pequeno-almoço porque, esse, tomava-o, sempre, nos seus aposentos. Enfim, após uma primeira baforada do robusto charuto, levou ao nariz o cálice de meio-cristal, meio de grogue, inspirou longamente, de olhos semicerrados, fez o liquido âmbar rodar dentro do cálice para acentuar mais o aroma e levou-o aos lábios entreabertos sorvendo, quase que com receio, uma lágrima que o obrigou a esbugalhar os olhos e esboçar um sorriso de deleite quase sensual a que se seguiu o veredicto que haveria de fazer do Dick o mais feliz e o mais infeliz dos cabo-verdianos de Santo Antão: “Isto, meus amigos, é uma bomba!!!”

E, claro, os bombardeamentos que se seguiram, até ao fim da nossa viagem colocaram em sério perigo a integridade moral do amigo Dick, que tinha recebido do pai quatro garrafas do seu melhor grogue de sempre para levar a pessoas de família residentes na Metrópole. Só que, as sucessivas rodadas da “bomba” que o Comandante não se cansava de elogiar a ponto de dizer que, como se costuma afirmar a respeito de Nápoles, ele já podia morrer pois tivera o privilégio de ter bebido a melhor aguardente, o melhor “brandy”, o melhor “cognac” que jamais alguém produzira sobre a terra, tudo, consubstanciado naquele divino grogue de Santo Antão, a melhor colheita de sempre da marca Ferro, iam consumindo o “stock” a olhos vistos: primeiro, foi a garrafa do tio, depois a do primo, depois a do cunhado e só a última, que era para o irmão ainda estava intacta… Estava pois, na véspera da nossa chegada a Lisboa, o que aconteceria às primeiras horas da manhã seguinte, o nosso Capitão resolveu proporcionar-nos e aos restantes passageiros da primeira classe, uma ceia de despedida, que foi servida com alguns requintes por volta das 10,30 da noite. Teve direito a vinho espumante, carnes frias, tábua de queijos, saladas e, imagine-se, pastéis de nata. Estava tudo na maior, quando o Comandante, de forma audível a todo o salão, inquiriu: “Então, senhor Aspirante Henrique Ferro, não há lá uma pinguinha do melhor “brandy” do mundo para a despedida?” Como quem caminhasse para a forca, o Dick lá foi ao camarote buscar a ultima garrafa da relíquia de seu pai. Então, tive uma ideia luminosa e, à socapa, segredei ao Dick que deixasse lá no camarote, um bom bocado do grogue, no copo da casa de banho, que depois lhe explicaria a finalidade.

Era já madrugada quando nos recolhemos para refazer as malas e pouco mais. E, então, expliquei ao Dick para o que era o grogue que tinha sido guardado: como o pai dele, decerto, teria avisado as pessoas a quem mandava os presentes, o portador teria que ter uma boa explicação para a não entrega das mesmas. Era fácil: o Dick diria que devido a mau manuseamento da bagagem, aquando do embarque em S. Vicente, a sua mala tinha caído e as garrafas haviam-se partido todas, encharcando a roupa de grogue… Nada mais eficiente.

Dois dias mais tarde, encontrámo-nos todos, conforme o combinado, no Pic-Nic, em pleno Rossio. Perguntado sobre o assunto das garrafas de grogue, o Dick, satisfeito, informou que tudo tinha corrido bem. Aliás, o pai, que era homem precavido e, obviamente, muito vivido, na presunção de que pudesse haver algum "acidente" com as garrafas que o Dick trazia na mala de mão, tinha mandado colocar umas tantas na mala de porão. “Just in case!”...

Zito Azevedo

Queluz, 21 de Dezembro de 2011

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2016

[8942] - A BANHEIRA...


Hoje, dei comigo a vasculhar as páginas do Google em busca de um automóvel semelhante ao que, em 1951, tirei a minha carta de condução, em S.Vicente... E, sorte a minha, encontrei um, igualzinho, à excepção do volante, que era à esquerda e a cor, que era verde garrafa...
Era um carro do tipo "banheira" com capota de lona e comando do travão de mão exterior, da marca Opel e que meu pai havia comprado um ano antes, não me recordo a quem...
O meu instrutor, foi o amigo Ferreira, sargento-mecânico do exército que, sendo um pouco duro de ouvido, era conhecido por "surdão"...Mas não era por mal...
Ainda me recordo que era um veículo difícil de conduzir, de direcção pesada (aínda não havia direcção assistida), suspensão dura (ainda não havia amortecedores a óleo) e, sobretudo, com um motor nada fácil de arrancar, de manivela, pois o motor de arranque ainda estaria em estudo...Creio que não andava a mais de 70 km/hora mas o meu pai afirmava que a mecânica era excelente, no que tinha a concordância de mestre Cunque, que também era adepto da Opel...
Enfim, já lá vão 65 anos mas, como dos velhos amigos, nunca me esqueci da velha "banheira" da Opel!

segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

[8731] - CONIMBRIGA, PATRIMÓNIO MUNDIAL...


A Câmara de Condeixa-a-Nova está a "criar um movimento" para preparar a candidatura das ruínas romanas de Conímbriga a Património Mundial da UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura), revelou esta semana o presidente do município, Nuno Moita.

Em declarações à Lusa, o autarca explicou que a Câmara está a trabalhar "para criar um movimento, agregando as mais diversas entidades, para preparar a candidatura do complexo arqueológico de Conímbriga" a património da Humanidade. 

Portugal não poderá apresentar qualquer candidatura até 2017 dado integrar, até essa data, o Comité do Património Mundial da UNESCO, mas a preparação do processo deve começar o quanto antes por ser "complexo e moroso", defendeu o edil. 

A candidatura de Conímbriga, uma das maiores povoações romanas de que há vestígios em Portugal, à classificação pela UNESCO foi aprovada por unanimidade pela Assembleia Municipal de Condeixa-a-Nova (constituída por eleitos do PS, PSD, BE e CDU) a 23 de Dezembro de 2013, na sequência de uma moção apresentada pela CDU. 

Segundo Nuno Moita, a proposta mereceu, "desde logo, todo o acolhimento da Câmara", tendo sido proposta na moção "a constituição de um movimento", em coordenação com a autarquia "e em parceria  com o Museu de Conímbriga, a Direcção-Geral do Património Cultural, a Universidade de Coimbra, a União de Juntas de Freguesias de Condeixa-a-Nova e Condeixa-a-Velha, a assembleia municipal, a Associação Ecomuseu de Condeixa e outros", para candidatar Conímbriga a Património Mundial."

Este movimento deverá desenvolver "um programa, a médio prazo, para a realização do levantamento do inventário do património móvel e imóvel do município" e "um programa a longo prazo" para que, durante o "mandato de 2013-2017 sejam dados os passos essenciais" para efetuar a candidatura. 

De acordo com o autarca, "apenas um sexto das ruínas de Conímbriga está a descoberto", pelo que é necessário investir neste património, para o qual estiveram, aliás, destinados cerca de 3,5 milhões de euros de fundos europeus que não foram aplicados por "falta da comparticipação nacional" num montante de cerca de 600 mil euros.

Nuno Moita salientou que estes fundos comunitários podem ainda ser recuperados e avançou já ter comunicado ao secretário de Estado da Cultura, Barreto Xavier, durante uma reunião no passado mês de Janeiro, a disponibilidade do município de Condeixa-a-Nova em suportar uma percentagem da comparticipação portuguesa para obter aquele investimento para Conímbriga.

domingo, 27 de setembro de 2015

[8487] - POEIRA DO PASSADO...


Hoje resolvi ir ao fundo do baú das memórias físicas e encontrei esta foto de estúdio, batida há 80 anos, na cidade do Lis...O posador celebrava nesse dia o seu primeiro aniversário e esboçava um sorriso um tanto inigmático, como quem não percebe patavina do que se passa!

sábado, 21 de junho de 2014

{7059] - ADIVINHEM QUEM VEM ALMOÇAR,,,

 
 
Hoje, depois de um almoço de petingas fritas, arroz e salada mista, bateu-me à porta um daqueles ataques de saudade que nos oprime o peito e nos faz chegar a lágrima ao canto do olho...É que veio à baila o nome do Jorge Pedro Barbosa, poeta como seu pai Jorge Barbosa e ainda primo de minha mulher, um tipo impecável, de verve fluente, em catadupas de histórias picarescas, intermináveis, irresistíveis, que a gente ouve e torna a ouvir com redobrado e renovado interesse como se fosse, sempre, a primeira vez...
Amigos desde a primeira hora cedo, porém, nos perdemos de vista, com a abalada do Jorge Pedro para os States, onde residia na Lexington Avenue (Nova Iorque), nome que nunca esqueci porque, na mesma artéria funcionava uma empresa de nome E.J.Abecassis, Inc.,  que fornecia antibióticos que a Farmácia do Leão importava e que eu conhecia por obrigação profissional...
Num ano que não consigo precisar (anos 60), o Jorge Pedro fez uma das suas raríssimas visitas a S.Vicente e consegui, na sua apertada agenda, uma réstia de duas horas para um almoço em minha casa, morava eu já no edifício do Rádio Clube Mindelo, frente ao Palácio...
Na altura, a generalidade do comércio fechava das 12H00 às 15H00 para o almoço, pelo que combinámos que o almoço seria às 12H30...
Às 12H45, já eu tinha tudo preparado para os Gin&Tonic da praxe, incluindo aqueles deliciosos limõezinhos verdes da Guiné, quando a Nininha veio anunciar que o almoço estava pronto...
Já passava da uma da  tarde quando comecei a ficar inquieto mas, infelizmente, na altura ainda não havia telemóvel... Aliás, um telefonema feito para casa da Indiana momento antes, havia confirmado que o Jorge saíra de casa "diásá"...
Às 13H45 bebi um G&T e comi uns grãos de macarra torrada, enquanto o repasto arrefecia e os miúdos se agitavam com fome...
Minha mulher, que não deve nada ao optimismo, já admitia a hipótese de ter acontecido algo de grave e quase me convenceu a telefonar para o Hospital e para a Polícia...Mas, felizmente, eu conhecia o Jorge Pedro e sabia, lá bem no mais íntimo de mim, que o primo americano era capaz de estar algures entre a Praça Nova e a Rua de Lisboa, em amena cavaqueira com meia dúzia de amigos...
Quando, às 14H50 cheguei à Drogaria do Leão para o período de trabalho da tarde, lá estava ele, o Jorge Pedro, encostado à montra da esquina, rodeado de uma dúzia de atentos ouvintes que, ora atentos ora às gargalhadas, escutavam as palavras que jorravam da boca do maior contador de histórias que eu conheci!

Com aquele olhar desvairado que é a sua imagem de marca, olhou para mim, encolheu os ombros e disse: "Sorry, brother..."!

segunda-feira, 28 de abril de 2014

[6841] - MEMÓRIAS DA RUA DE LISBOA...



Com comentários de Outubro de 2007, encontrei no Fotolog de 66ESANTOS, uma foto semelhante a esta, de publicidade a uma Residencial, na Rua de Lisboa, ou Roberto Duarte Silva ou Heróis da Independência...Há, ali, interessantes comentários do Joaquim Saial, da Tina, do Valdemar Pereira, da Bela Marques e do próprio E. Santos, não apenas à volta dos diferentes nomes da Rua mas, também, da antiga Casa Madeira, que ocupava o rés-do-chão do prédio, enquanto o andar de cima era a residência do Jorginho Fonseca (Dr.)...Casa Madeira, agentes de navegação,  onde o Djack, pesaroso, viu serem levantados os bilhetes do vapor que o haveria de devolver ao Continente...Aí trabalhavam pessoas que me habituei a admirar, entre as quais, Nhô Mariano, pai de Marianos que fizeram história, principalmente o Gabriel e o Dante, sem desprimor para os irmãos Daniel e Gabriela... Mas, coisa interessante que existiu nesse rés-do-chão, mas de que ninguém se lembrou de referir, em substutição da Casa Madeira, que não conseguiu resistir ao advento da era do transporte aéreo, foi a Casa Azevedo, a ourivesaria e relojoaria do meu pai, que ali se manteve até  23 de Dezembro de 1974...Hoje, pelos vistos, é um Banco...

domingo, 23 de março de 2014

[6707] - MEMÓRIAS DO ARROZ DE CABIDELA...



Durante vários anos, entre 1980 e 1990, desloquei-me semanalmente, à Malveira, para fechar o caixa de uma sucursal da empresa em que ainda trabalho...Lá, almoçava no Restaurante Tia Chiquita, boa comida caseira, bem temperada e a preços nada especulativos...Mesmo depois de a tal sucursal ter encerrado portas, continuei a frequentar o Restaurante -cujo cozido à portuguesa é notável - umas a duas vezes por trimestre, até porque mantenho relações de cordialidade o filho da tia Chiquita e actual proprietário, que até é do meu Clube...
Estive lá ontem, com minha mulher e, ao consultar a lista, dei de caras com um prato pouco usual: arroz de cabidela de galo!
Subitamente, deixei de ver a lista e senti-me transportado à casa onde morei no Mindelo, na Rua de Lisboa, frente ao Palácio...Estávamos todos sentados à mesa, a minha mulher, os nossos dois filhos, ainda pequeninos e eu quando a Nininha trouxe um tacho de barro onde fumegava um apetitoso arroz de cabidela de galinha...À primeira colherada para servir a
Ana Paula, ela esbogalhou os olhos e apontando o dedo  minúsculo para o prato, exclamou: "Olha: arroz sujo!"...
Com uma lágrima no canto do olho, mandei vir umas pescadinhas de rabo na boca com arroz...de grelos!

sexta-feira, 7 de março de 2014

[5733] - UMA VIAGEM E PERAS...

PAQUETE LOANDA
Mala Real Portuguesa
1891 - 1903

Ao que parece, esta terá sido a última viagem do LAONDA, aliás, LOANDA, em 1903, com carga para todas as Ilhas de Cabo Verde, com baldeação em S.Tiago, claro... com escalas em S. Tomé e Príncipe, oito portos de Angola e mais quatro na costa africana com baldeação em S.António do Zaire...Esta foi, sem dúvida, uma enorme viagem para o elegante paquete!
(Recorte de jornal facultado por A.Mendes)

quarta-feira, 28 de agosto de 2013

(5785) - CARRINHA PEUGEOT 404...


Quem se recorda do "nominha" destas carrinhas, em S.Vicente de Cabo Verde, aí por volta dos anos 60 do século passado?!

sábado, 22 de dezembro de 2012

APARECE O "JINGLE BELL"...


Foi em Dezembro de 1957 que surgiu no Top da musica pop, logo na estreia...Haveria de reaparecer no Hit Parade em 1958, 1060, 1961 e 1962...Todos os anos, desde então, renasce por esta altura, em todo o mundo...Um autêntico fenómeno de sobrevivência!

MEMÓRIA...



Foi por estes dias do ano de 1970 que uma das Torres Gémeas do World Trade Centre de Nova Iorque, em construção desde 1969, atingiu a sua altura máxima de 417 metros...

sexta-feira, 30 de novembro de 2012

FOTOMANIA...

Eu tinha para aí os meus 15 anos - era por volta de 1950 - e meu pai tinha comprado uma Kodak, tipo caixote, daquelas que se olhava de cima, através de uma lente, carregava-se num botão do lado direito e...click, tirava uma fotografia no tamanho de 6x6! O rolo da película era introduzido por debaixo da maquineta e, cada vez que tirava uma foto, havia que rodar a película para "bater" a  seguinte...O rolo era numerado de 1 a 12 e a máquina tinha um orifício na parte de trás, coberto a vidro, por onde tais números iam desfilando. Evitava-se, assim, sobrepor as exposições... com algumas excepções, claro!
Quando o rolo acabava, retirava-se com cuidado para a película não apanhar luz e, dentro da sua embalagem negra por dentro, levava-se a Nhô Djunga para revelar e fazer aquelas pequeninas "obras-de-arte" que cabíam na palma da mão...
Sessenta e tal anos passados, sobraram-me algumas, que hoje resolvi partilhar convosco...Espero que gostem!
Nota - A máquina fotográfica reproduzida acima é absolutamente igual à por mim usada...Bendita Wikipédia!







segunda-feira, 15 de outubro de 2012

ERA UMA VEZ, ANGOLA - XIV ...


Era um fim de tarde daqueles em que se tinha a sensação de a Humanidade se resumir àquele pequeno grupo que, na larga varanda da entrada da pensão, se dava a amena cavaqueira tendo o senhor aspirante (eu...) como figura principal...Era tudo pessoal descomplexado que adorou as minhas histórias Cabo Verde, as frases em crioulo a que correspondiam com sonoras gargalhadas, incluindo o aspirante Diz (assim mesmo...) a quem eu ia substituir e marcharia daí a uma semana, depois de me pôr a par das coisas...Para além de nós, o aspirante e o aspirante a aspirante, estava o sempre presente Heitor, chofer e caçador da Administração, o Mário Matos, dono da Pensão e da loja anexa, ambos angolanos mestiços, a mulher do Mário, a D.Iolanda, professora, natural da Figueira da Foz, esguia e pouco simpática, a irmão dela, o Crispim, jovem desocupado e a irmã Filomena, uma desajeitada moça de 14 anos, que andava sempre com o nariz a pingar...Relegado da sua habitual posição de destaque, o terrorista da povoação, o Duca, 5 anos, filho do Mário e da mulher, interrompia constantemente a tertúlia protestando fome, agora, sede, depois, dor-de-barriga mais tarde, até que um sopapo do pai o sentou, definitivamente, num dos degraus, enquanto soluçava de olhos secos...
No melhor da conversa, no meio da minha receita de cachupa, um jeep que já tinha visto melhores dias parou e de lá saltou um tipo encorpado, impecavelmente fardado de branco e outro, mais elegante de calções e balalaica, enquanto toda a malta se levantava...Era o senhor Administrador, José Eduardo Marques Estaca e o médico, Dr. Poupinha das Neves e vinham, precisamente, cumprimentar o "novo" aspirante (eu...).
Trocámos efusivos apertos de mão e fiquei logo ali a saber que o Administrador fumava desalmadamente e fungava com muita frequência, dando a impressão de estar sempre constipado...Veio a revelar-se um óptimo amigo e do médico, dizia-se à boca pequena que costumava tomar banho de imersão com a esposa recente (e uma bela criatura...) mas sem qualquer maldade: era para poupar na água...De resto, como o Administrador, andava sempre impecavelmente vestido e penteado e era o único que cheirava a Tabac, um perfume muito em vigor na altura...O Sr. Estaca, esse, era mais Acqua Velva...
Seguindo um hábito que, pelos vistos era rotineiro como o Diz afirmou, o Adminsitrador convidou-me a jantar com ele, a esposa e o casal Poupinha das Neves, no dia seguinte, segunda-feira e meu primeiro dia no activo, como funcionário do Quadro Administrativo Privativo de Angola.
Continua...

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

A FROTA COLONIAL...




"INFANTE D. HENRIQUE" - O MAIS ELEGANTE PAQUETE DA ESQUADRA
COMERCIAL PORTUGUESA DO SEC. XX..,

Vejam mais exemplares da "Frota Colonial" em
www.zitovisao.blogspot.com